LUIZ FELIPE MENDES
Raiza Goulão Henrique será a única atleta de Goiás entre a delegação brasileira nos Jogos Olímpicos de Paris, que começam no dia 26 de julho. Forjada nas pedras de Pirenópolis e no Cerrado goiano, a ciclista de 33 anos está a poucos dias da estreia no maior palco esportivo do mundo para viver a emoção olímpica pela segunda vez na carreira que transformou a bicicleta, que era modo de locomoção da goiana, em meio de vida.
Raiza sempre foi apaixonada por esporte. Inicialmente, queria ser jogadora de basquete, mas viu seus planos se complicarem por causa da falta de mulheres atuando na modalidade no interior goiano. Conheceu o ciclismo tardiamente, aos 16 anos, utilizando a bicicleta como meio de transporte e uma forma de lazer.
Formada em Administração na cidade de Anápolis, Raiza começou a praticar o ciclismo e a conhecer pessoas com a mesma paixão, o que a levou a descobrir que poderia se desenvolver profissionalmente no esporte. Como o aspecto radical sempre chamou mais a atenção dela, o cross-country surgiu como a opção mais clara para a pirenopolina.
O cross-country é uma categoria dentro da modalidade de mountain bike do ciclismo e consiste em percorrer um circuito com obstáculos, subidas e descidas. As provas normalmente duram entre 1h15 e 1h30. Essas características de desafio, aliadas ao contato com a natureza (Raiza sempre foi ativista pelo meio ambiente) e à sensação de liberdade e leveza, decretaram o amor da atleta pela categoria.
Os desafios de Raiza, que defende a equipe Squadra Oggi, não são somente aqueles dentro dos circuitos, mesmo após se garantir pela segunda vez nas Olimpíadas. Por ser mulher, ela afirma que sempre teve de se provar muito e que, embora o esporte esteja em ascensão, o Brasil ainda tem muito a evoluir.
“É uma honra muito grande (ir a Paris), me fortalece muito e eu acho que (preciso) trazer o valor real da minha família. É uma crítica, que seja construtiva, mas suporte de cidade e estado… Eu levo no peito por ter orgulho de ser goiana. Só a gente que é atleta sabe o que passa. Suporte quase zero no último ano. Quando falamos em atletas olímpicos, deveria ter um incentivo maior. Já fui para as Olimpíadas, já mostrei para meu estado, minha cidade e meu país”, destacou a ciclista.
Bicampeã pan-americana, campeã brasileira e campeã goiana no sub-23, Raiza passou a evoluir aos poucos e sacramentar uma ascensão no mountain bike. O momento emblemático foi a oportunidade de participar dos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016.
Naquela época, Raiza contou que ainda não era um grande destaque em sua categoria e, por isso, não tinha tanto suporte externo. Ainda assim, a primeira participação em uma edição de Olimpíadas foi uma “experiência única”, abriu portas e começou a consolidar seu reconhecimento nacional e internacional. A goiana ficou em 20º na sua primeira disputa olímpica - 28 atletas concluíram a prova.
Raiza não quis parar por ali. Os anos se sucederam e a goiana precisou aprender também como trabalhar a própria imagem de atleta, em vez de focar somente na parte esportiva, para que fosse cada vez mais reconhecida.
Segundo ela, não é um equilíbrio fácil, pois, no esporte de alto nível, cada desvio de foco pode significar o detalhe entre uma classificação e uma eliminação. “Às vezes, exige muito mais mídia do que performance, tem que saber equilibrar tudo”, detalhou.
O caminho rumo a Paris
Três anos antes de cada edição das Olimpíadas, tem início um ranking internacional olímpico, além do ranking mundial da União Ciclista Internacional (UCI). Esse ranking é dividido por nações, e, dentro de cada nação, três ciclistas de cada categoria pontuam em busca de vagas nos Jogos.
Neste ano, o Brasil ficou em 10º lugar no ranking olímpico de cross-country feminino, com 5.137 pontos. A Suíça liderou, com 10.985 pontos. Os oito melhores países têm direito a duas vagas na categoria das Olimpíadas, enquanto as nações que terminaram entre 9º e 19º poderiam enviar um atleta, cada. A 20ª colocada, Eslovênia, herdou uma vaga da França (2º), que já havia excedido a cota máxima por ser país-sede.
Como o Brasil finalizou em 10º, terá apenas uma representante no cross-country em Paris - Raiza é a atleta que mais pontuou entre as brasileiras. Ela travou uma disputa intensa com Isabella Lacerda, Hercília Najara e, principalmente, Karen Olímpio, mas conseguiu permanecer à frente.
O início de 2024 foi relativamente tranquilo para Raiza, que virou o ano com mais de 300 pontos de vantagem em relação às competidoras. “Tinha que dar tudo muito errado para eu não conseguir a vaga”, brincou a goiana. É verdade que ela se lesionou e passou por uma série de gripes e resfriados, não conseguindo disputar algumas competições em alto nível, mas ainda assim se garantiu em Paris.
Depois de sacramentar a vaga, no mês de maio, Raiza passou duas semanas fazendo treinos leves, conectando-se com a família e fazendo uma bateria de exames antes de retomar a rotina intensa de treinamentos de longa duração, de três a quatro horas, de terça-feira a domingo, com alongamentos, trabalhos respiratórios, sessões de ativação e, em meio a tudo isso, uma alimentação balanceada e controlada.
Entre o período de treinos leves e a prova olímpica, Raiza passou pela reta final de preparação, que envolveu treinos na França, para treinamento em altitude em Avoriaz, e em Andorra.
Raiza chega à Vila Olímpica de Paris na próxima segunda-feira (22) e sua prova no cross-country feminino está marcada para 28 de julho, um domingo, a partir das 9h10 (horário de Brasília).