Em artigo na revista americana "The Hollywood Reporter", Ronan Farrow, 28, filho do cineasta Woody Allen e da atriz Mia Farrow, lançou duras críticas ao trabalho da imprensa no caso de suposto abuso sexual de sua irmã, Dylan, 30.
Na época com sete anos, a menina acusou o pai de molestá-la. A história veio à tona em 1982, em meio a batalha judicial entre Allen e Mia, que disputavam a guarda dos filhos. Parte da opinião pública tomou o lado do diretor, argumentando que a atriz teria plantado a acusação na mente da filha.
O cineasta não foi denunciado. Segundo Ronan Farrow, a queixa foi retirada devido ao trauma da irmã, forçada a contar a história repetidas vezes e a enfrentar o "grotesco circo midiático". Apesar de "ter encontrado causa provável", o promotor, em acordo com Mia, decidiu poupar Dylan do tormento.
"Quando minha irmã decidiu falar sobre o assunto pela primeira vez, foi a vários jornais, mas a maioria se recusou a publicar a história dela", disse Ronan.
Ele cita o "Los Angeles Times" como uma das publicações que se recusaram a veicular uma carta aberta de Dylan descrevendo o caso, que acabou na versão on-line do "New York Times". O "NYT" também foi criticado por Ronan, por ter oferecido à irmã um espaço de 936 palavras na edição para a internet, e o dobro de espaço na edição impressa para Allen.
Na ocasião, o diretor negou o suposto abuso. "É claro que não molestei Dylan. Eu a amo e espero que um dia ela entenda como foi enganada e explorada por uma mãe mais interessada em sua própria raiva purulenta do que no bem-estar de sua filha".
Allen escreveu também que, quando foi acusado pela primeira vez por Mia de abusar de Dylan, achou as acusações tão "ridículas" que, por isso, nem quis contratar um advogado para se defender. "O senso comum prevaleceria. Afinal, eu era um homem de 56 anos que nunca tinha sido antes (ou depois) acusado de molestar uma criança."
Em 2014, outro filho de Woody Allen e Mia Farrow, Moses Farrow, também negou que Dylan tenha sido abusada pelo pai. "Minha mãe martelou na minha cabeça o ódio pelo meu pai, por ter dividido a família e por ter abusado sexualmente de minha irmã", afirmou Moses à revista "People". "Eu o odiei por anos. Vejo agora que essa foi uma maneira vingativa de fazê-lo pagar por se apaixonar por Soon-Yi [filha adotiva de Mia Farrow que casou com o "ex" da mãe].
Críticas
Jornalista, Ronan refletiu sobre as vezes em que a imprensa deixou de pressionar pessoas famosas a respeito de acusações de abuso sexual. Citando o caso Bill Cosby, relatou a pressão de assessores de imprensa para que perguntas incisivas não fossem feitas - segundo ele, o porta-voz de Cosby teria dito "são acusações, não estão na manchete dos jornais e não há obrigação de mencioná-las".
"Estar na mídia quando a história da minha irmã ocupou as manchetes - e a equipe de relações públicas do Woody Allen entrou em ação - me permitiu testemunhar como é forte a pressão para tomar saídas fáceis", escreveu Ronan. "Todos os dias, colegas em grupos noticiosos me encaminhavam e-mails do assessor de imprensa de Allen."
Ronan afirmou que a correspondência trazia tópicos que se transformariam em notícias, com uma lista de nomes para validá-las que envolvia terapeutas, advogados, amigos e "qualquer um disposto a rotular uma jovem mulher que confronta um homem poderoso como louca, manipulada, vingativa".
Ele argumenta que jornalistas aceitam os termos dos assessores de imprensa de seu pai com medo de, em caso de discórdia, perder o acesso a outros clientes famosos desses profissionais, como Meryl Streep e Will Smith.
Segundo o jornalista, a lenta evolução da velha mídia criou uma cultura de impunidade e silêncio, com a Amazon pagando milhões para trabalhar com Allen, bancando um seriado e um novo filme, e atores fazendo fila para trabalhar com ele.
"Esta noite, o Festival de Cannes começa com o novo filme de Woody Allen.
Haverá entrevista coletiva e um tapete vermelho com meu pai e sua mulher (minha irmã). Ele terá suas estrelas ao seu lado - Kristen Stewart, Blake Lively, Steve Carell, Jesse Eisenberg. Eles têm certeza de que a imprensa não fará perguntas difíceis", criticou o filho do cineasta.
"Não é a data ou o local certos. Não é feito. Esse tipo de silêncio não é só errado, é perigoso, pois passa às vítimas a mensagem que vir a público não vale a pena."