Depois de protagonizar o show comparado a uma "amostra do apocalipse" em Mossoró (RN), João Gomes se consolidou como fenômeno do piseiro em sua estreia em São Paulo. Foram quatro shows com ingressos esgotados, quinta (2) e sexta-feira (3), no Centro de Tradições Nordestinas e os festivais Garota Vip, e Noite do Piseiro, no sábado (4).
Natural de Serrita, no sertão de Pernambuco, o cantor de 19 anos lotou as duas noites na edição paulista do festival "PIZRO". Também estiveram no evento Tarcísio do Acordeon , que levou o público às lágrimas ao homenagear Marília Mendonça, Biu do Piseiro e Vitor Fernandes. Já no Garota Vip, de Wesley Safadão, João acabou ficando em maus lençóis com os fãs após posar para foto com o DJ Ivis, réu por violência doméstica.
Apesar das plateias cheias, no entanto, não foram vistas cenas como as de outras apresentações do músico que viralizaram na semana passada, e iam desde um fã rasgando a camiseta, empolgado, ao cantar "Sofrência", até um casal fazendo sexo na plateia, sem se preocupar com o público ao redor. João Gomes não quis comentar as imagens.
O cantor, que já soma mais de 8 milhões de seguidores no Instagram e 6 milhões de ouvintes mensais no Spotify, fez tremer o chão com a casa lotada dançando a pisadinha. Com ingressos que passavam de R$ 300 no último lote, distribuição de chocolates Danke na porta e venda de comidas típicas, o evento simbolizou o relaxamento das normas restritivas, ainda que com cautela.
'EU TENHO A SENHA'
Rapaz tímido, mas dono de uma voz potente e grave, João tenta explicar o que é a tal "senha" que cita em várias de suas músicas e dá nome ao seu primeiro álbum. O bordão surgiu a partir de um episódio vivido com o irmão ainda em Serrita, conta.
"Quando eu ainda estava lá no sertão com meu irmão, um menino pegou a zabumba para tocar e perguntou: 'como faz para tocar?'. O meu 'mano' disse: 'tem que ter a senha'. Fiquei com isso na cabeça e na hora da inspiração escrevi o resto", relatou, em entrevista ao F5.
Autor da maioria de seus sucessos, ele diz que os principais ingredientes para seu processo criativo são sinceridade e paciência.
"Eu espero a inspiração vir, é muito natural. Tem que ser muito sincero cantando, porque você vai cantar para a galera que gosta de você. Não adianta cantar uma coisa e não ser verdade. Tem que ter paciência, esperar as palavras virem, que dá tudo certo", diz.
PEGADA DE VAQUEIRO
Antes da fama repentina, João acreditava que seria "um véi que nem vovô" e viveria "por amor à vaquejada", como canta em um de seus principais sucessos, "Que Nem Vovô".
"Achava mais que viraria vaqueiro do que artista, mas aconteceu. Nunca derrubei um boi. Meu avô era vaqueiro e eu admirava, queria ser como ele, por isso fiz essa letra. Hoje acho que eu prefiro cantar para os vaqueiros, cantar para toda a galera nas vaquejadas", diz.
Com letras românticas à moda antiga, que destoam do teor de "pegação" dos hits atuais do mesmo gênero, João diz acreditar que a música tem o poder de levar autoestima e bem-estar para quem escuta.
"Quando fui escrever 'Meu Pedaço de Pecado' pensei muito na autoestima da mulher. A mulher, hoje, para levantar a autoestima, coloca um filtro no TikTok, posta um monte de foto. E eu falo: 'você é a mais bonita, um pedaço da vida de felicidade'. A música tem esse poder de trazer a autoestima. A gente tem que fazer das nossas palavras a força para a galera", diz.
ORGULHO DA AVÓ
Nas palavras da avó Josilene, companheira de estrada e figurinha já conhecida de quem acompanha as redes sociais do cantor, João é um menino bem-criado e de bom coração, mas que "adora uma resenha". Antes de todo show, ele e sua banda "transformam o camarim em igreja", diz.
"A nossa família é isso mesmo. Temos muita fé. Criamos ele dessa forma, então é gratificante vê-lo nesse lugar hoje", se orgulha Josilene, que acompanhava o neto no camarim.
Depois de lotar dois shows em São Paulo, ensinar Fátima Bernardes a dançar a pisadinha no Encontro (Globo) e participar do Programa Raul Gil (SBT), João seguiu com a avó e equipe para Jaguariúna, no interior paulista, onde se apresentou no Rodeo Festival.
No ano em que estourou no Brasil, o rapaz de Serrita que sonhava em ser vaqueiro aprendeu também a encarar de frente as mazelas do mundo. "A gente vai percorrendo a estrada e descobre o mundo, e vê que o mundo não é tão maravilhoso assim, como cantava Belchior", filosofa.
"Eu rezo no camarim todo dia. Antes, rezava para que o sonho desse certo, para que nossa família conseguisse se manter. Hoje, rezo por toda a maldade que existe. A maldade nunca vai se acabar, mas rezo para que ela não chegue até nós e as pessoas que a gente ama. Que ela não chegue no coração das pessoas boas", diz.