Uma das personagens mais antológicas da cidade de Goiás, Antolinda Baía Borges, a Tia Tó, morreu nesta quinta-feira (24) aos 89 anos por complicações de um acidente vascular cerebral (AVC). O velório será realizado na Igreja do Rosário, na antiga capital, ao lado de sua residência.
Ela passou mal na cidade de Goiás no dia 15 e chegou a ser levada para o Hospital de Caridade São Pedro de Alcântara, mas foi transferida para Hospital do Coração em Goiânia a pedido do seu médico, o cardiologista Paulo César da Veiga Jardim.
Na terça-feira (22), foi diagnosticado um AVC de grande extensão. Levada para a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), ela foi entubada e seu caso foi considerado irreversível.
Perfil da Tia Tó
Defensora ferrenha da cultura vilaboense, Tia Tó chegou à antiga capital goiana com pouco mais de dois anos, depois de emigrar com a família da ex-Curralinho, hoje Itaberaí. Ela foi uma das pessoas que mais lutou pelo título de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, concedido à cidade de Goiás pela Unesco, em 2001.
Conciliando a vida de empresária, como proprietária de uma pousada, ela sempre marcava presença em qualquer atividade política, cultural e social da cidade. Por não se furtar em emitir opinião sobre qualquer tema, ganhou muitos amigos e também desafetos.
Durante 40 anos ela trabalhou na Casa Veiga, o estabelecimento comercial mais importante da ex-capital goiana em décadas. A partir daí foi ampliando sua rede de relacionamentos, quando foi convidada a ser a guardiã das igrejas da cidade de Goiás pela Fundação Nacional Pró-Memória, precursora do Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), tornando-se funcionária pública federal.
Mesmo aposentada compulsoriamente continuou dedicada aos bens patrimoniais de Goiás. Nos anos de 1960 teve um papel fundamental na criação do Museu de Arte Sacra da Boa Morte, instituição que reúne obras do escultor Veiga Valle e da qual foi a única diretora até 2019, quando foi exonerada. Incansável, percorria gabinetes de políticos pedindo ações e doações para a manutenção da história da antiga capital goiana, como a restauração de muitas das igrejas centenárias locais. “A cidade de Goiás é a filha que eu não tive”, costumava dizer.
Entre 1951 e 1956, Antolinda Borges atuou nas missões dominicanas às margens do Rio Araguaia e se vinculou às obras sociais da Diocese de Goiás para nunca mais sair. Ela foi uma das principais articuladoras do Movimento Pró-Cidade de Goiás que culminou na conquista do título de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, concedido em 2001 pela Unesco. Logo após, na virada do ano, quando Vila Boa foi duramente agredida por uma enchente, esteve à frente do projeto para a recuperação da cidade, ao lado de outras personalidades locais.
Ao longo dos anos, o nome de Tia Tó esteve presente em atas oficiais de diversas instituições da cidade de Goiás, como o Museu Casa de Coralina, a Fundação Frei Simão Dorvi, o Hospital de Caridade Dom Pedro de Alcântara, a Organização Vilaboense de Artes e Tradições (Ovat), o Gabinete Literário e muitas outras. Entre as inúmeras homenagens que recebeu estão a Medalha Veiga Valle e a Ordem do Mérito Anhanguera, honraria concedida pelo governo de Goiás.
Há mais de 50 anos amiga de Tia Tó, Marlene Velasco conta que ela citava a dupla como “a tampa e o balaio”. Juntas, levantaram bandeiras, provocaram debates e brigaram pelos pormenores vilaboenses. “Ela dedicou a sua vida à cidade de Goiás”, afirma Marlene, que é diretora do Museu Casa de Cora. Foi ela quem acompanhou Tia Tó ao hospital em Goiânia e esteve ao seu lado até que o estado de saúde se agravou. O cantor Marcelo Barra disse ao POPULAR que tem profunda gratidão por Antolinda Borges. “Ela é a cara de Goiás. Tudo tinha que passar por ela. E sempre brigou por mim.”
Marcelo Barra dá um exemplo de como atuava Tia Tó. “Logo que Goiás ganhou o título da Unesco ela deu a ideia de fazer um show especial com velas, no Palácio Conde dos Arcos, para comemorar a conquista. Ela comprou mais de 300 velas e, na hora da apresentação, com todas elas acesas, muito emocionada, chorou”. O cantor lembra que Tia Tó era uma das vilaboenses de alma que sempre odiou a menção à cidade de Goiás como “Goiás Velho”. “Já vi ela destratando uma turista por causa disso”, conta, rindo.
Ao lado do amigo e parceiro de ideais, o historiador Helder Camargo, manteve por 40 anos o Acampamento do Sol, em Aruanã. Eles também foram sócios da Pousada do Sol, no centro histórico. Tia Tó, mesmo com o avançar da idade, continuava atuante, tanto na pousada onde se tornou sócia de Manuel Garcia, da Construtora Biapó, quanto no Instituto Biapó, em frente ao Museu Casa de Cora Coralina, onde respondia pela presidência.
Curta-metragem
O Instituto Biapó a elegeu como a personagem do curta-metragem Museu Boa Morte através do olhar de Antolinda Borges. Na produção de sete minutos, ela conta a história do museu, que fica localizado no centro histórico da antiga capital. Este ano o curta-metragem foi selecionado para a mostra competitiva do Festival de Cinema e Memórias Cerratenses (FCMC).