O cabo de guerra sobre o piso da Enfermagem pode se manter pelos próximos meses. Apesar de haver solução desenhada sobre o pagamento para os profissionais do serviço público, o setor privado mantém reclamações e diz que o reajuste significaria quebra e demissões, cobrando iniciativa do governo para solucionar a questão. Em Goiás, 75% dos 70 mil trabalhadores da área seriam beneficiados com os salários previstos pela lei aprovada no ano passado.
Os pisos estabelecidos pela lei são de R$ 4.750 para os enfermeiros, de 70% do piso para os auxiliares (R$ 3.325) e de metade do piso para auxiliares e parteiras (R$ 2.375). No entanto, os valores estão suspensos por decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em setembro. Diante de ação proposta pelos hospitais privados, os ministros estabeleceram, em setembro, que sejam esclarecidos os impactos financeiros para estados, municípios e rede privada. Cinco meses depois, falta solução para os hospitais particulares.
O enfermeiro Erivanio da Silva, diretor do Sindicato dos Trabalhadores do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde/GO), lembra que o Congresso aprovou, ainda no ano passado, uma Emenda à Constituição que destina o superávit financeiro dos fundos públicos do Poder Executivo como fonte de recursos para o cumprimento dos pisos. Assim, agora depende do governo federal a edição e publicação de dispositivo para implementar essa saída.
“Essa será uma saída para o serviço público como um todo, incluindo estados e municípios, além das entidades filantrópicas e prestadores que, mesmo privados, atendem no mínimo 60% de seus pacientes pelo sistema único de saúde”, explica Silva. Nesta semana, o Ministério da Saúde acelerou as reuniões do grupo de trabalho criado pela pasta para apresentar os termos da minuta da medida provisória que ordena os pagamentos dos novos valores do piso da enfermagem.
Com base na Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho, 75% dos profissionais da Enfermagem em Goiás ganhavam, em 2020, menos que o piso previsto pela lei aprovada no ano passado. Dessa forma, um estudo encomendado pela Federação Brasileira de Hospitais (FBH) detalha que, em Goiás, o reajuste proposto irá significar, na média, 40% a mais nas folhas de pagamento. O maior impacto será justamente no setor privado, com incremento de 91%.
Na avaliação do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), o STF tem todos os elementos que precisa para afastar a medida liminar que suspendeu o piso. De acordo com levantamento feito junto ao Tesouro Nacional, o Cofen constatou que os fundos públicos federais acumulam superávit de aproximadamente R$ 28 bilhões, que podem, segundo eles, ser destinados para o pagamento do piso imediatamente.
Antes mesmo da evolução formal do debate, municípios estão se antecipando para o pagamento, já que aqueles que apresentarem condições podem fazê-lo. Entre os estados, a Paraíba será o primeiro a pagar o novo piso. Os valores foram creditados nesta quinta-feira (2), referentes à folha de pagamento do mês de janeiro. O governador da Paraíba, João Azevêdo, destacou que o piso será garantido a toda a categoria.
Rede privada
Ainda que o Ministério da Saúde solucione o mecanismo para o pagamento do piso no serviço público, o receio é de que os trabalhadores da rede privada possam ser impactados, seja com o não pagamento, seja com demissões. O estudo encomendado pela FBH diz que o reajuste pode tornar insustentável a operação de “centenas de estabelecimentos de pequeno e médio porte privados”.
A enfermeira Roberta Rios, presidente do Sindicato dos Enfermeiros de Goiás (Sieg), sustenta que não há necessidade legal de que os problemas relatados pela rede privada sejam solucionados para que o piso comece a valer. “Estamos articulando para a divulgação da Medida Provisória. Sendo publicada, terá validade imediata”, diz Roberta. Nacionalmente a promessa é de greve a partir de março caso o piso não seja cumprido.
Assim que o piso entrar em vigor o pagamento se torna inquestionável, lembra a representante do Sieg. “Não acreditamos no impacto na forma que os hospitais privados dizem. Estão fazendo uma defesa de seus lucros. Sabemos que têm condições”, afirma Roberta Rios.
Proposta pode solucionar demandas do setor privado
Propostas para atenção à iniciativa privada estão tramitando no Congresso. Está pronto para ser votado na Câmara dos Deputados um projeto de lei com objetivo de garantir a desoneração da folha de pagamento da rede privada, para viabilizar o piso salarial da enfermagem.
O presidente da FBH, Adelvânio Francisco Morato, diz que, caso nada seja feito, a redução do quadro de funcionários é a alternativa para que os hospitais não fechem as portas. “É preciso que o novo governo apresente soluções para minimizar o impacto do piso, com sério risco de colocar em risco o acesso da população brasileira aos serviços de saúde, bem como a qualidade do atendimento”, afirma Morato.
Bruno Sobral, secretário executivo da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços, entidade que representa o setor privado e filantrópico, diz que outras propostas estão sendo preparadas para serem apresentadas aos deputados. “Temos feito propostas para pegar, além da desoneração da folha, alguma coisa de desonerar também o imposto de renda, e também alguma desoneração do Simples.”