A Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhou na segunda-feira (3) ao procurador-geral da República, Augusto Aras, notícia-crime contra o deputado federal goiano Gustavo Gayer (PL) por racismo em declarações feitas em podcast divulgado no final de junho. O documento pede abertura de procedimento para apuração do crime e que a PGR ofereça denúncia ou requeira instauração de inquérito ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O apresentador do podcast Rodrigo Barbosa Arantes também é alvo da representação. Ambos apontaram africanos como pessoas com quociente de inteligência (QI) baixo e fizeram comparação com macacos. O deputado disse que a população de países da África não teria "capacidade cognitiva" para viver em um regime democrático.
Em reação ao programa “3 Irmãos Podcast”, que foi ao ar em 23 de junho e segue sendo divulgado nas redes sociais, as ministras da Igualdade Racial, Anielle Franco, e da Cultura, Margareth Menezes, solicitaram providências à AGU. O ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, anunciou ter acionado a Polícia Federal, a PGR e a Câmara dos Deputados contra o parlamentar.
AGU afirma no documento, assinado pelo procurador-geral da União, Marcelo Eugênio Feitosa Almeida, que as declarações se enquadram na Lei do Crime Racial que aponta como criminoso o ato de "praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
"A manifestação é claramente discriminatória, pois diferencia a capacidade cognitiva de seres humanos considerando a origem africana, continente em que sabidamente a maioria da população é negra, concluindo que não teriam aptidão para compreender regime democrático", diz o documento.
A notícia-crime foi elaborada pela Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD), que ressalta que o deputado goiano não está protegido pela imunidade parlamentar no caso, porque não há nexo causal entre as declarações e a atividade parlamentar.
"As declarações feitas não guardam qualquer correlação com a atividade parlamentar, tendo sido proferidas em entrevista concedida a podcast, cujo tema discutido, além de preconceituoso e discriminatório, não possuía pertinência com a atividade legislativa, nem com qualquer outra atribuição da Câmara dos Deputados e do Congresso Nacional, nos termos do art. 48, 49 e 51 da Constituição", argumenta.
No último dia 30, o advogado-geral da União, Jorge Messias, condenou as declarações e determinou estudo imediato de medidas jurídicas cabíveis contra o deputado, após reunião com Anielle Franco.
Na ocasião, o Grupo dos Chefes de Missão Africanos em Brasília emitiu nota oficial também de críticas às afirmações do deputado goiano. "Não nos permitimos omitir ou pactuar com mensagens criminosas quando originárias de indivíduos supostamente representantes do povo brasileiro. Para além da tristeza que nos invade ao saber que ainda existe esse tipo de seres, lamentamos ter de informar às autoridades brasileiras, sobretudo o Itamaraty e a Câmara dos Deputados, que o nosso Grupo, interpretando os sentimentos do Continente Africano, está CHOCADO com tamanho desacerto e delírio do parlamentarista supracitado."
Parlamentares também acionaram o Conselho de Ética da Câmara pedindo providências sobre as declarações do deputado goiano.
Procurada para comentar a notícia-crime da AGU, a defesa de Gayer disse apenas que "vai se manifestar nos autos no momento oportuno".