Patrocinar o Big Brother Brasil é um investimento de peso que não se paga no curto prazo. Apesar do salto de vendas nos produtos anunciados, as marcas ficam longe de recuperar os milhões desembolsados na atração durante sua exibição, mas apostam no reconhecimento de marca a longo prazo.
Há um mês antes da final, que vai ao ar nesta terça-feira (4), a grade para anunciantes já estava quase toda fechada.
Atualmente, o reality show é o programa de maior audiência da Globo, superando a reexibição da novela Império, na faixa das 21h, segundo dados do instituto Kantar Ibope.
Foram três tipos de cotas de patrocínio oferecidas pela Globo para anunciantes que quiseram participar do chamado "Big dos bigs": a big (R$ 78 milhões), a anjo (R$ 59 milhões) e as especiais (R$ 18 milhões). No ano passado, a cota máxima era menor, de R$ 46 milhões. Em 2019, R$ 37 milhões e em 2018, R$ 34 milhões.
"Se eu tivesse R$ 78 milhões, eu não patrocinava, é muito dinheiro, mas a decisão não é muito racional. É vaidade. O Big Brother é o nosso Superbowl [evento esportivo de maior audiência na TV americana] com marcas de ambições gigantes em uma mídia gigante. Quem tem budget, aposta pesado", afirma Rodrigo Azevedo, presidente do Grupo Comunique-se e idealizador da plataforma Influency.me.
As cotas são apenas o custo para entrar na brincadeira. A cada ação e propaganda, aumentam os desembolsos. Um comercial de 30 segundos durante o BBB custa R$ 508 mil, segundo a tabela de preços da Globo de abril.
O sucesso do BBB 20 é o responsável pelo salto no valor. A edição passada foi a primeira que contou com famosos como participantes, recuperando audiência.
"O BBB em 2002, quando estreou, tinha 50 pontos de audiência. Ele foi caindo drasticamente nos últimos anos até chegar a 20 pontos em 2019. Então, em 2020, a Globo chamou influenciadores para atrair o público que não estava mais ligado na TV e conseguiu a melhor audiência desde 2011", diz Azevedo.
Segundo o estudo Inside Video, do Kantar Ibope, os dois programas de TV mais comentados do mundo no Twitter em 2020 foram reality shows brasileiros, o Big Brother Brasil, e A Fazenda, da Record, que também conta com participantes previamente famosos.
De 25 de janeiro a 27 de abril, o BBB 21 registrou média de 27 pontos de audiência, com picos de 30 pontos —o melhor resultado desde 2010—, batendo o recorde de audiência das sete edições anteriores e superando a média registrada no BBB 20 em três pontos.
Segundo o Painel Nacional de TV do Kantar Ibope, que projeta uma audiência nacional com base nas 15 regiões metropolitanas de maior consumo do Brasil, com 93 dias de exibição, o BBB 21 teve alcance médio diário de 39,8 milhões de pessoas.
Além de cobrar mais caro por uma audiência maior, o programa também aproveitou para abrir espaço para mais marcas e mais ações de marketing, com recorde de patrocinadores. Os principais foram de seis em 2020 para oito em 2021. São eles: Avon, PicPay e Lojas Americanas na cota big e C&A, Amstel, Seara, McDonald's e P&G na cota anjo.
Também patrocinaram o BBB a Unilever, que ofereceu o top de cinco segundos da edição para promover o sabão Omo, o desodorante Above e a marca de rações Organact. No total, o programa contou com 22 anunciantes.
Sem novelas inéditas e com calendários de campeonatos de futebol afetados pela pandemia, a emissora perdeu importantes produtos em sua grade de entretenimento. Em 2020, a receita líquida consolidada com vendas, publicidade e serviços —principal fonte de renda do grupo Globo— caiu para R$ 12,5 bilhões, de R$ 14 bilhões de 2019, levando o lucro líquido do ano passado a cair 78%, para R$ 167,8 milhões.
Mais que dar nome a provas e festas, as participações dos anunciantes foram ampliadas no jogo e desenhadas para promover determinados produtos.
MC DONALD'S
Patrocinando pela primeira vez um reality, o Mc Donald's teve 80% mais vendas em plataformas de entrega no domingo que se seguiu à festa do pijama que a marca promoveu no BBB com relação ao mesmo dia da semana anterior.
"Estávamos com a segunda onda de coronavírus no Brasil, com as pessoas ficando mais em casa e queríamos que os participantes tivessem a mesma experiência. Naquela noite, o nosso aplicativo saiu do ar várias vezes, e o do nosso parceiro de entrega [iFood] também", diz João Branco, diretor de marketing do McDonald's Brasil.
Segundo ele, a participação de famosos e um conteúdo com debates relevantes no contexto atual, como machismo e racismo, foi fundamental para a marca decidir patrocinar o reality que começou em janeiro.
"É mais um marketing show do que reality show. O BBB tem um poder de ativação bem interessante", afirma Branco.
"Imaginávamos que havia o risco de segunda onda no Brasil e nosso mercado é muito afetado, com o fechamento dos salões [dos restaurantes]. Abrimos mão de muita venda, e no marketing existe a oportunidade de seguirmos construindo a marca mesmo em um momento desses", diz.
Ela também conta não se paga com o aumento de vendas com o programa.
"Se eu coloco no balanço tudo que eu gastei com o BBB e tudo o que eu vendi em 100 dias, a conta não fecha. É um relacionamento estratégico de longo prazo. É um investimento que os clientes vão lembrar por muito tempo, não se mede pela venda nesse período e sim mede pela lembrança de marca, preferência.
SAMSUNG
Mesmo sem estar entre as principais cotas de patrocinadores do programa, a Samsung também viu um efeito imediato de sua participação na última prova do líder do programa, na terça (27).
A dinâmica envolvia os novos modelos dobráveis Galaxy Z Fold2 5G, a partir de R$ 12.599,10 no site da sul-coreana, e o Galaxy Z Flip, a partir de R$ R$ 8.999,00.
A vencedora da prova foi Juliette Freire, a favorita para ganhar a edição com 22,9 milhões de seguidores no Instagram (até sexta, 30). Ela escolheu receber a mensagem que determinava a sua sorte no jogo por meio do aparelho Galaxy Z Flip.
No dia seguinte à prova, o aparelho constava como esgotado no site da Samsung. Até esta sexta (30), permanece a mensagem de produto indisponível por falta de estoque.
Procurada, a empresa disse que não comenta números e resultados de vendas, "mas estamos bastante satisfeitos com o resultado", afirma Roman Cepeda, Vice-Presidente de marketing da divisão de dispositivos móveis da Samsung Brasil.
"Alcançamos nossos objetivos, que eram gerar, ainda mais conhecimento e entendimento sobre nosso ecossistema de produtos. Com esta ação, observamos um imediato aumento de curiosidade do público sobre essa categoria de produtos", completa Cepeda.
P&G
Outro produto promovido pelo programa que esgotou foi a escova elétrica da Oral-B vendida por meio digital em parceria com a Amazon, após uma prova do anjo da P&G.
"As 24h que fizemos a ativação representaram o mesmo que 35 dias de vendas. Foi impactante, não tínhamos essa expectativa. Também há um efeito residual até o momento, pessoas pesquisaram mais o produto. Em março, as vendas de escovas elétricas chegaram a um novo patamar", afirma Marjorie Teixeira, diretora de comunicação da P&G Brasil.
A companhia, que tradicionalmente patrocina os desfiles de Carnaval na Globo —que não aconteceram em 2021— buscava uma plataforma forte para divulgar lançamentos, em especial a mudança na fórmula da linha de shampoos Pantene.
"O reality se assemelha a atrações que são em tempo real, como Carnaval e futebol. Com conversas que fluem muito do online para o offline e vice-versa", afirma Camila Sousa, diretora de análise de mídia e inteligência de mercado da P&G.
No momento das ações no BBB, o aumento de busca pelos produtos da empresa no Google ficou entre 10.000% a 20.000%.
"Só se falou de BBB este ano. Está todo mundo assistindo, querendo ou não. Nas redes sociais só se fala disso. É um efeito manada", diz Camila.
Outro efeito foi uma maior exposição da marca pelos varejistas, como supermercados, por conta da participação no programa. "As vendas de Pantene em lojas físicas em março tiveram crescimento expressivo, ganhamos share de mercado".
Ela também conta que o retorno ainda não se compara ao que foi desembolsado. "Para qualquer investimento em marketing, não consideramos apenas a venda no período. Há uma recompra, há recorrência, há recomendação. Não considero apenas a compra nesses 100 dias. Os telespectadores compraram, consideraram, ou ficaram com o produto no inconsciente", diz Marjorie.
"O residual do efeito BBB faz com que o investimento nele se pague. O programa só tem esse monte de patrocinador porque dá algum retorno sobre o investimento", afirma Camila.
PICPAY
Durante a primeira prova do líder da fintech de pagamentos PicPay, em fevereiro, a plataforma registrou um recorde de quase 3 mil cadastros por minuto, com quase 110 mil pessoas acessando o app. Na segunda prova, foram 85 mil. Na festa com participação da cantora Iza, os cadastros subiram 51% em relação à semana anterior.
A empresa chegou a ter 290 mil solicitações do seu cartão lançado durante o programa durante as ativações de marketing exibidas. Até o momento, soma mais de 6 milhões emitidos.
Desde janeiro, quando o programa começou, a base de clientes do PicPay saiu da casa dos 38 milhões para mais de 50 milhões no fim do primeiro trimestre.
"Mas o mais importante é que o número de usuários ativos cresceu na mesma proporção, para 36,6 milhões em março. Isso não se deve só ao BBB, porque também lançamos novidades, investimos em tornar a experiência ainda melhor e em entregar o produto mais completo ao cliente, mas o BBB nos ajudou a explicar todas essas inovações", afirma Guilherme Telles, diretor de marketing e de estratégia do PicPay.
SEARA
Pela segunda vez no reality, a Seara usou a experiência de 2020 para se preparar para 2021. "As pessoas estão assistindo em duas telas [TV e redes sociais], então este ano preparamos a nossa loja online para interagir com os consumidores", afirma Tannia Fukuda, diretora de marketing da Seara.
A primeira participação no BBB foi para promover a salsicha da marca. "A conversão foi gigante. Naquela noite dobrou o número médio de acessos mensal na loja online da Seara", afirma Tannia.
Ela conta que quanto melhor a experiência de compra e facilidade de acesso ao produto pelo QR Code na tela da Globo, melhor a taxa de conversão. Na prova do líder da marca, feita para promover a linha de hambúrgueres Seara Gourmet, adicionaram pão e maionese no site e ampliaram as vendas. A taxa de conversão na ocasião foi de 35%. Antes do BBB, a média era de 7%.
"É mais ou menos como a compra por impulso da gôndola de guloseimas no mercado. O entretenimento gera esse impulso de compra no consumidor", diz Tannia.
Ao todo, a Seara participou de seis ações, sendo duas provas, quatro delas com lançamento de produtos. Alguns deles, inclusive, foram antecipados dado o sucesso do programa. "Ao patrocinar um reality você consegue ver quase em tempo real a receptividade do público", afirma Tannia.
AVON
O mesmo vale para a Avon, presente no reality pela primeira vez. "São pessoas utilizando nossos produtos 24h por dia, com o público acompanhando tudo nas redes sociais, sem edição, é a melhor prova de qualidade, afirma Viviane Pepe, diretora de comunicação da Avon.
Segundo ela, o faturamento do o ecommerce da marca e das lojas onlines das representantes triplicou durante o programa.
"Quando os participantes usam nossos produtos no programa, as buscas disparam no ecommerce e com as representantes Avon."
"Serem brasileiros se relacionando com a marca dá uma maior autoridade ao produto. O telespectador se vê neles e gera um efeito melhor que uma propaganda tradicional. Fora que ver uma pessoa lutando pelo carro da Fiat é mais interessante que 15 segundos do carro sendo dirigido em um comercial", afirma Azevedo, do Grupo Comunique-se.
Está é a primeira participação da Avon no reality. O patrocínio veio como parte da campanha de reposicionamento da marca.
"Já íamos para a TV para fazer esse reposicionamento. Era parte de uma estratégia que estava montada há seis meses, não foi um investimento à parte. E qual o maior assunto no Brasil além de vacina e política? é o BBB", diz Viviane.
Apesar da alta nas vendas, o gasto com o BBB ainda não foi compensado. "Não é feito para se pagar nos 100 dias [de duração do programa]. O reposicionamento de marca não acontece de um dia para o outro, mas o BBB foi um acelerador."
LOJAS AMERICANAS
Leonardo Rocha, diretor de marketing da plataforma digital das Lojas Americanas aponta que durante a exibição das ações no BBB, o tráfego no app da varejista aumentou quatro vezes. "O BBB é uma super oportunidade da marca se conectar com os milhões de brasileiros por meio do entretenimento, além de dar visibilidade a todos os novos serviços oferecidos pela Americanas".
Em uma das ações da marca no programa, houve um aumento de 175% nos acessos ao aplicativo em comparação com a média do horário. Já o Instagram da Americanas teve um crescimento de base de 800 mil seguidores no período do programa.
"O objetivo é conectar a Americanas ao grande público, criando uma experiência ainda mais divertida e imersiva no consumo de conteúdo e, claro, de compra", diz Rocha.
Em busca de efeito semelhante, a M.Dias Branco entrou com duas marcas no programa: a Vitarella e a Piraquê como parte da estratégia de expansão nacional dos produtos.
"Pensamos no BBB, um programa em que as principais marcas do país estão presentes, para acelerar o plano de nacionalização", afirma Rodrigo Mainieri, gerente de marketing da M. Dias Branco.
Ele aponta que com o sucesso do reality show, o BBB se tornou a maior vitrine para a exposição de marcas. "Pessoas lembram de cabeça os patrocinadores do BBB" afirma Azevedo, do Grupo Comunique-se.