Enquanto o País comemorava a classificação nas oitavas de finais, na tarde desta segunda-feira (28), a educação pública nacional perdia novamente, devido aos cortes orçamentários assinados pelo governo federal durante a partida. A Universidade Federal de Goiás (UFG) será impactada em R$ 2,4 milhões nesta nova redução e, se somados aos R$ 7,8 milhões que foram cortados do orçamento da instituição em junho deste ano, o prejuízo chega a R$ 10,2 milhões, equivalente a dois meses de funcionamento dos serviços básicos.
A reitora Angelita Pereira de Lima ironiza a tomada de decisão enquanto a população estava distraída com o futebol e explica que a universidade já está atuando constantemente para, segundo ela, não fechar as portas, com os acúmulos de dívidas provindas dos cortes do governo federal. Os principais serviços afetados se referem à infraestrutura do espaço estudantil.
“Nós vamos fazer nossa parte, precisamos reverter o quanto antes para que tenhamos como pagar nossas contas, nosso problema é com nossos fornecedores e prestadores de serviços”, avalia.
Além dos cortes que impactam o funcionamento da instituição, a reitora diz que a redução de recursos impede a melhoria nas instalações. “Já começou a época da chuva, os telhados apresentam problemas e não temos recursos para melhorias”, diz Angelita.
A informação chegou às entidades públicas de todo País através do comunicado do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), do Tesouro Nacional. As universidades federais foram, no total, impactadas em R$ 244 milhões, 12 dias antes do prazo final para empenhar suas despesas - decreto de fevereiro deste ano prevê que o último dia para empenho de despesas seja 9 de dezembro.
A UFG está na metade do semestre letivo, e teme pela funcionalidade até a conclusão, já em 2023. “Nós precisamos reverter o quanto antes”, sinaliza Angelita. Junto à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), a reitora ressalta que é fundamental recorrer e manifestar contra o que a instituição chama de golpe.
O pedido da associação é que as bancadas de reitorias ao redor do Brasil se reúnam às bancadas congressistas para articular o contato com os parlamentares que compõem a bancada no Congresso Nacional de cada estado, neste caso, enfoque aos goianos.
Incoerência
Todo início de ano, as instituições públicas são obrigadas a enviar o plano de recursos das necessidades de manutenção das atividades. “Prevemos os custos, fazemos o esforço de lançar na planilha todas as informações, e não temos como executar o planejamento que o governo federal mesmo impõe”, diz Angelita.
No que diz respeito a continuidade dos cursos oferecidos pelas universidades, todos vão manter a carga horária, sem alterações. Sobre os Colégios Tecnológicos de Goiás (Cotecs), regidos em parceria com a UFG, a reitora afirma que as unidades possuem recursos próprios para apoio.
“Esse ano de 2022 foi muito difícil, é de se lamentar as atitudes do governo federal”, enfatiza Angelita. Em nota, a UFG se diz consternada e que espera que a medida de retirada de recursos, neste momento do ano, seja o mais brevemente revista, caso contrário, há possibilidade de se instalar o caos nas contas das universidades. “É um enorme prejuízo à nação que as universidades, institutos federais e a educação, essenciais para o futuro do nosso país, mais uma vez, sejam tratados como a última prioridade”, ressalta. (Manoella Bittencourt é estagiária do GJC em convênio com a PUC-Goiás, sob supervisão da editora Elaine Soares).
Entidades ligadas à educação estão preocupadas
Em uma série de notas divulgadas entre segunda-feira (28) e esta terça-feira (29), entidades ligadas à área da educação utilizaram as redes sociais para enfatizar o descontentamento e preocupação com a preservação do ensino superior nas diretrizes atuais. O Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) alertou que o bloqueio pode ser definitivo e gerar insegurança nas gestões acadêmicas.
A União Nacional dos Estudantes (UNE) classificou ser urgente a recomposição do orçamento. No mesmo sentido, a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) escreveu, nas plataformas digitais, que o governo atual, a 34 dias de acabar o mandato, continua atuando como inimigo da educação. “Bolsonaro cometeu mais um crime de lesa-pátria: cortou o pouco que restava do orçamento das universidades federais e IFES”, escreveu o grupo. No documento divulgado pela Siafi, em que a Junta de Execução Orçamentária (JEO) aprovou um bloqueio, estão listadas todas as unidades afetadas.
Governo zera caixa de universidades e institutos federais
A pouco mais de um mês para o fim do ano, o governo Jair Bolsonaro (PL) fez um novo congelamento no orçamento das instituições federais de ensino superior. A área econômica havia promovido um bloqueio em outubro, mas por causa da repercussão negativa no período eleitoral, recuou dias depois.
As instituições receberam nesta segunda-feira (28), no entanto, ofício em que oficializa o bloqueio dos recursos disponíveis nas contas bancárias - na prática, os caixas foram zerados. A decisão foi tomada para atender as regras do teto de gastos, que limitam o aumento de despesas do governo.
O bloqueio tirou R$ 244 milhões das universidades federais e R$ 122 milhões dos institutos, segundo informações das instituições - totalizando R$ 366 milhões de congelamento.
Em mensagem enviada a reitores por lideranças do Ministério da Educação (MEC), a pasta afirma que “em momento nenhum participou dessa decisão”, tomada pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia). Em nota, o MEC confirmou que foi notificado pela Economia a respeito dos bloqueios. “É importante destacar que o MEC mantém a comunicação aberta com todos e mantém as tratativas junto ao Ministério da Economia e à Casa Civil para avaliar alternativas e buscar soluções para enfrentar a situação”, diz o texto.
Questionada, a Economia não respondeu até a publicação deste texto.
Gestão inviável
Reitores afirmam que a gestão das instituições fica inviável com os bloqueios.
No início de outubro, quando o governo bloqueou os chamados limites de empenho (que definem quanto as instituições podem de fato gastar), havia o argumento de que tudo seria liberado em dezembro. O ministro da Educação, Victor Godoy Veiga, chegou a negar que houvesse corte e acusou reitores de fazer politicagem às vésperas das eleições. <CW-30>O tema ganhou repercussão durante o pleito. Dias depois, o próprio ministro anunciou o desbloqueio daquilo que, segundo ele dissera, nem havia sido bloqueado.
As instituições já vivem sob uma realidade de enxugamento de recursos neste ano. Em junho, universidades perderam R$ 438 milhões e os institutos, R$ 186 milhões. (Folhapress)