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Estudantes denunciam na polícia assédio de professor da UEG

Wesley Costa)
Uma das mulheres que afirmam ser vítima de professor da UEG

Um grupo de ex-alunas dos cursos de graduação em Química e Farmácia da Universidade Estadual de Goiás (UEG) denuncia um professor efetivo por assédio sexual e moral. Os casos relatados teriam ocorrido no Câmpus Henrique Santillo, em Anápolis, e vieram à tona após uma estudante de 24 anos ter formalizado, em junho deste ano, uma denúncia na Ouvidoria da instituição e na Polícia Civil. Em seguida, ao menos outras quatro mulheres registraram ocorrência.

A partir da nova exposição, divulgada pelo site de notícias local Portal6, as ex-graduandas e uma docente da UEG se mobilizaram em um grupo para comunicar sobre as ações a serem tomadas. Até o momento, foram reunidas ao menos 18 vítimas. Os relatos são semelhantes, com casos de assédio sexual e moral ocorrendo dentro de sala de aula, laboratórios de pesquisa, em corredores, e em outras áreas da universidade.

O relato mais antigo foi feito por uma egressa, que foi aluna do docente efetivo Antônio Carlos Severo Menezes nos primeiros anos dele na instituição, em 2000. Ele ingressou em fevereiro de 1999. Conforme ela, logo no início do curso de Química licenciatura, o professor a teria humilhado em frente à turma por conta de nota. “Desde a época que eu entrei todo mundo passou por assédio moral. Ele me fez chorar”, diz.

A mulher aponta também que já foram feitas várias denúncias na ouvidoria, mas que “nunca deu em nada” e relata que muitos outros casos nem sequer chegaram a ser formalizados diante do receio de retaliação. “Sempre insisti para que elas (alunas) fizessem denúncia, mas em vão. São todos (os casos) do mesmo jeito”, pontua.

A semelhança dos supostos casos é constatada nos seis depoimentos de ex-alunas feitos ao Daqui. Elas relataram ter sofrido assédio sexual e moral entre 2002 e 2015, algumas durante as aulas de Química Orgânica, lecionadas por Antônio Carlos. Outras dizem que, mesmo sem ter pego a disciplina, foram assediadas nos laboratórios de pesquisa, onde ele era o coordenador, em corredores, ou na lanchonete.

Ex-graduanda do curso de Farmácia, hoje uma professora universitária, de 28 anos, conta que ingressou na instituição em 2013, aos 18, mas apenas em 2015 teve contato direto com o docente durante as aulas. Ela relata que, em uma prova da disciplina, obteve uma nota menor do que a turma. “Comparando a correção (com a de outros colegas) percebi que não estava sendo justa a nota. Procurei a tutora da disciplina, e ela disse que não estava entendo o método de correção e sugeriu que eu falasse com ele”, afirma.

Ao procurar o docente, ele teria começado uma conversa de cunho sexual. “Disse que eu parecia com uma jovem que morava na rua da casa dele, e que foi com ela que ele começou a ter relações sexuais”, e acrescenta que o docente teria dito que “seria fácil corrigir a nota”. “Ali entendi que ele estava propondo favores sexuais para corrigir minha nota.”

Uma mulher relata que ingressou na instituição em 2009 na área de Química, e logo teve contato com o professor durante uma pesquisa em que ele era o orientador. “Para entrar na pesquisa o professor tinha de convidar, e o argumento que ele usa é esse: que as meninas que denunciam é porque não tiveram vaga. Ele se blinda”, pontua.

Durante os encontros com o docente para a realização da pesquisa, relata que ele se aproximava para passar a mão no rosto. “Sempre muito próximo, conversava pegando na gente. Eu não ficava sozinha perto dele”, pontua. Ela acrescenta que ele dizia frequentemente: “Orgânica é muito difícil, principalmente para as meninas”. “Ficava subjetivo que as meninas tinham de ficar com ele (para passar). É escrachado.”

Outra mulher relata que em 2008 teve contato pela primeira vez com o professor durante a primeira aula do curso de Química Industrial. Naquele dia, segundo o relato, o docente teria entrado na sala e dito, em tom de piada, que um grupo aleatório de alunos reprovaria na matéria dele.

“O professor sempre andou pelo câmpus se vangloriando de que sua disciplina era dificílima, que ninguém passava e que a Química Orgânica travava o curso de todos, o que era verdade. Os alunos reprovados não podiam cursar muitas outras disciplinas nos períodos seguintes e ele era o único professor que ministrava a matéria”, diz a mulher, hoje com 33 anos e que atua profissionalmente como social mídia.

Conforme a ex-aluna, o docente logo começou com investidas. “Me dava beijos babados no rosto, ‘coçava’ a minha mão insinuando que queria transar comigo”. Em outra ocasião, enquanto estava em um dos laboratórios, ela relata que o professor a “encurralou no canto da parede e passou a mão pelo meu corpo.”

A situação foi praticamente a mesma relatada por uma ex-aluna de Química Industrial, que iniciou o curso em 2009. Ela, hoje com 31 anos, afirma que desistiu de ter aula com o professor diante do assédio sexual, que ocorria em outras áreas da instituição, como nos corredores. “Chegava me abraçando, dando beijo no pescoço, perguntando se eu namorava”, diz. Por conta da prática frequente, em 2011, também desistiu do curso.

“A importunação dele não precisava ser da sala dele. Não tinha pudor nenhum, tinha de fazer vista grossa. (Passei a) me desvencilhar, falava que tinha de ir para outro lugar. A Reitoria sabia, a Ouvidoria sabia, todo mundo sabia, e a UEG nada fez”, relata. “Não era só comigo, a gente sabia que era errado, mas quando acontece a gente não enxerga.”

Em contato com o docente por conta de um projeto de pesquisa, uma menor de idade relata que sofreu assédio moral e sexual durante ao menos um ano. Ela, que ingressou na universidade em 2007, aos 17 anos, diz foi convidada para sair com o professor. “Ele falava que queria usar loló comigo, me chamava para tomar vinho, falava que queria me ver ‘doidinha’”, diz a mulher que hoje, aos 32 anos, é servidora pública municipal.

Durante a pesquisa realizada no laboratório da UEG, a ex-aluna diz que precisou passar muito tempo no espaço. “E no laboratório ele tinha mania de ficar me encoxando”. Por isso, conta, passou a evitar o local, onde precisava desenvolver seu projeto, caso ele também estivesse.

"Perguntava se tinha namorado, se era virgem ou não, se gostava de sair. Até que as investidas foram ficando mais intensas, querendo tocar, passar a mão no cabelo".

Ex-aluna

Para uma egressa de Química, de 39 anos, há semelhanças na forma como o docente age junto às alunas, visto que, em geral, ele se aproxima das recém-chegadas ao curso. “Às vezes pela imaturidade, inocência e por ele ainda não ter sido professor.” Ela conta que ao ver os comentários na notícia divulgada pelo portal de Anápolis, percebeu que eram várias vítimas. “De gente da minha época, de antes e depois.”

A jovem, que ingressou em 2002, aos 18 anos, relata teve contato com o professor antes de ter aula. “Começou tudo normal, não via maldade. Até que começaram as ‘piadas’, perguntava se tinha namorado, se era virgem ou não, se gostava de sair. Até que as investidas foram ficando mais intensas, querendo tocar, passar a mão no cabelo.”

Diante dos casos de assédio, passou a se esquivar do contato com o docente, e acabou desistindo da matéria dele após uma prova em que teria sido prejudicada pela correção. “Ele me atrasou em um semestre”, resume.

Defesa quer responsabilizar acusadores

A defesa do professor Antônio Carlos Severo Menezes, representada pelo advogado Wilson Araújo Júnior, afirma, por meio de nota, que “nega veementemente as mentirosas acusações” que visam a “exclusivamente macular a honra do acusado perante a opinião pública, tendo em vista que não estão lastreadas em provas”.

Ainda conforme a defesa, as alegações são feitas por “pessoas que possuem algum rancor contra o acusado, especialmente por não terem sido aprovadas ou terem se sentido prejudicadas nas matérias que cursaram com o professor enquanto eram alunas dele, o que se deu, evidentemente, por pura falta de capacidade delas”.

A nota da defesa finaliza afirmando que “todos os falsos acusadores já estão sendo identificados e que tomará todas as medidas judiciais cabíveis, tanto na área cível, quanto na área criminal, contra cada um deles”.

O caso da discente que ingressou com denúncia em junho deste ano é um dos que foram parar na Justiça, após o docente ingressar com ação por calúnia e difamação.

A situação denunciada pela aluna é investigada pela Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Anápolis. A delegada Isabella Joy diz que as investigações seguem em sigilo e estão em fase inicial de apuração. Mas acrescenta que a Universidade Estadual de Goiás (UEG) ainda não foi acionada.

A universidade diz, em nota, que “não tolera qualquer tipo de assédio” e que está apurando a denúncia sobre “possível assédio sexual sofrido por uma discente de graduação por parte de um professor”, feita em junho.

Diz ainda que “a discente não tem mais nenhum contato com o professor” e que “foram dados os encaminhamentos legais para a apuração dos fatos, com a abertura de uma sindicância. Conforme a nota, o processo está na fase de oitivas individuais.

“Caso a sindicância apure o assédio, o rito formal é a abertura de processo administrativo disciplinar que prevê penalidades administrativas adequadas à gravidade do fato. As penalidades previstas vão desde suspensão até demissão”, finaliza.

A universidade não menciona a respeito das outras denúncias feitas pelas ex-alunas. O Daqui questionou quantas denúncias já foram formalizadas contra o docente, mas não obteve retorno.

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