A CPI da Covid recebeu nesta segunda-feira (18) familiares de vítimas da pandemia. Os depoimentos foram carregados de dor, luto e repúdio às ações do governo Jair Bolsonaro na crise sanitária. Ainda reforçaram a pleito do grupo majoritário da comissão de que é preciso criar uma pensão para órfãos da pandemia. Os convidados representaram diferentes regiões do Brasil.
O Centro-Oeste foi representado pelo funcionário público aposentado Arquivaldo Bites Leão Leite, 67 anos, natural de Trindade, que enfrenta graves sequelas da Covid-19 e perdeu familiares, entre eles, o irmão caçula, Arquicelso Bites, aos 53 anos de idade.
“Eu estou com sequelas, mas eu havia tomado as duas doses da vacina e consegui sobreviver, enquanto o meu irmão caçula não teve a oportunidade de ser vacinado e por isto não teve a mesma sorte.”
Sobre o relato à CPI, Arquivaldo disse ter sido uma oportunidade de a voz das vítimas da Covid ser ouvida pelo Congresso Nacional. E de levar reivindicações, citando a entrega formal de documento pedindo benefícios de seguridade social para órfãos e vítimas da Covid. No relatório final, a CPI deve sugerir a aprovação de pensão especial para crianças e adolescentes órfãos de vítimas da pandemia.
“Foi uma responsabilidade muito grande. Não falei com orgulho nem com satisfação, mas com tristeza pelo sentimento de falar em nome das vítimas, de quem morreu e de quem foi contaminado e está sofrendo as consequências”, descreveu Arquivaldo. Ele enfrenta problemas de paralisia facial, auditiva e ocular, perda de equilíbrio e dificuldades para andar.
“Lamento as 603 mil mortes no Brasil, centenas de milhares poderiam ter sido evitadas se o governo brasileiro tivesse tomado medidas efetivas para prevenir, combater, mas trabalhou no caminho contrário da ciência e da medicina, com muita falta de responsabilidade”, critica.
“O Presidente da República não tem condições de falar sobre saúde e sobre a pandemia. Ele afronta a medicina, promove aglomerações, critica o uso da máscara e é contra a vacinação. Temos que valorizar os médicos e cientistas que atuam na saúde”, acrescenta ainda.
Arquivaldo relatou ao POPULAR um pouco do que ele e familiares têm atravessado. “Sou de uma família numerosa, 20 irmãos, 12 filhos, 12 tios e centenas de primos. Desde o início da pandemia, nós nos reunimos pela internet todos os domingos, sempre procurando conscientizar uns aos outros sobre a importância do isolamento social e do uso de máscaras.” Ainda assim, foram afetados pela doença e sofreram perdas.
Ele lamenta sete mortes na família Um tio, três primos, dois sobrinhos e o irmão. “Eram saudáveis, trabalhadores, foi tudo muito rápido.”
Irmão detido
Além disso, ele lembra episódio em Trindade envolvendo o irmão, Arquidones Bites Leão, que foi preso no dia 31 de maio deste ano após se recusar a retirar uma faixa do capô de seu carro com a mensagem “Fora Bolsonaro Genocida”. Vídeos gravados no momento da prisão mostram o policial dizendo que iria enquadrar o professor de história na Lei de Segurança Nacional por uma suposta calúnia contra o presidente. Secretário do PT, Arquidones foi levado para a sede da Polícia Federal (PF), em Goiânia, onde prestou depoimento e foi liberado.
Atualmente, Arquidones é um dos diretores da Associação Nacional Vida e Justiça em Apoio e Defesa das Vítimas da Covid-19. “Nós estamos sempre envolvidos nas lutas e movimentos populares”, observa Arquivaldo.
“A partir do momento que estamos na associação, reivindicando, passamos a ostentar a frase Fora Bolsonaro Genocida. A gente imagina que a repressão veio daí, porque sempre tivemos respeito pela polícia, mas alguns membros têm visão equivocada do papel do policial, extrapolam e acabam prejudicando a imagem da própria polícia. Acabam trazendo transtorno, humilhação, para quem está dentro da lei”, analisa. “Diziam que meu irmão era radical. Hoje mais pessoas concordam que se trata de genocídio.”
Arquivaldo, que se aposentou depois de 46 anos de trabalho para logo enfrentar a pandemia, diz que gostava de jogar futebol e quer se recuperar para voltar ao esporte. Tem se dedicado à fisioterapia, “com muita força de vontade”.
“Como sequelado e parente de vítimas fatais, eu espero que não venha a ter outra pandemia, mas se houver, com base na experiência desta, que possamos formular leis e protocolos para que as novas gerações possam superar de forma não tão dolorosa quanto nesta.”
Além de Arquivaldo, foram ouvidas outras seis pessoas: Mayra Pires Lima, enfermeira em Manaus; Geovana Dulce e Katia Shirlene Castilho dos Santos, órfãs por causa da Covid-19; Rosane Brandão, viúva por causa da Covid-19; Marcio Antônio, acometido pela Covid-19; e Antonio Carlos Costa, da ONG Rio de Paz.