A falta de uma ferramenta de informática que faz os cálculos para saber o valor da aposentadoria dos servidores municipais no Instituto de Previdência dos Servidores do Município de Goiânia (GoiâniaPrev) está atrasando a aposentadoria de pelo menos 376 funcionários da Prefeitura de Goiânia. Isso ocorre especialmente para os casos em que os servidores vão se aposentar pela média salarial, ou seja, os que entraram a partir de 2004 e os que desejam o benefício proporcional. Aqueles que optam pelo benefício integral ou são anteriores a 2004 podem receber a integralidade do último salário, o que é uma conta mais simples de ser feita e, por isso, o processo tem sido finalizado pelo instituto.
O advogado Eurípedes Souza, especialista em Direito do Servidor Público, explica que os cálculos para o benefício a partir da média salarial são feitos a partir de todos os salários recebidos pelo servidor, mais a averbação (soma de tempo de trabalho do serviço privado, por exemplo), atualização pela inflação, redução de 20% dos menores salários e, então, se faz uma média aritmética para obter o valor da aposentadoria. No entanto, o GoiâniaPrev só realiza essa conta a partir de um sistema específico e, sem ele, os processos ficam parados, como é o caso da psicóloga Ana Maria Martins de Souza, de 56 anos, lotada pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS) Beija-Flor, no Jardim Presidente.
Ana Maria conta que desde julho de 2023 soube que poderia se aposentar. Ela procurou o GoiâniaPrev e foi informada de que o prazo para o processo seria de cerca de 180 dias e entrou com a documentação no dia 10 de julho. “Minha documentação está toda completa, está tudo pronto. Em abril deste ano fechou o processo, com todos os pareceres para eu me aposentar, só precisava de esperar o GoiâniaPrev me chamar para assinar, que eles iam fazer o cálculo da aposentadoria”, conta. A espera pelo chamamento dura desde então e o processo continua na Gerência de Cálculos e Folha de Pagamento de Benefícios Previdenciários do instituto dos servidores.
Expectativa
A psicóloga conta que se preparou para aposentar e programou a ida para a Austrália, país onde mora a filha que está grávida e a intenção era participar e ajudar neste momento da família. “Foi um momento de muita angústia, de ansiedade por essa espera. Não somos informados de nada e quando entramos no sistema só aparece ‘aguardando a parametrização do sistema’, mas nenhuma vez falam quanto tempo isso vai demorar, quando vai resolver, quando vai fazer o cálculo”, relata. A servidora teve de tirar uma licença médica pelos problemas psicológicos que passou em razão da demora em sair a sua aposentadoria e agora conseguiu uma licença prêmio que lhe era devida pela Prefeitura pelos 16 anos trabalhados para o município (há outro período de trabalho para o serviço privado).
Ela entrou na Justiça para que a situação possa ser resolvida. “É como se nós tivéssemos pedindo um favor, é uma tristeza. Não temos o que fazer, ficamos à mercê de alguém, que não resolve e não explica nada para a gente”, afirma Ana Maria. O advogado Eurípedes Souza explica que o GoiâniaPrev não tem justificativa para não realizar o cálculo dos processos que estão parados. “É possível fazer manualmente, claro que demoraria mais, mas mesmo que não tenha um sistema para isso, com uma planilha do Excel (programa da Microsoft, que possui similares gratuitos) se faz ate uns quatro por dia”, conta ao dizer que o mais complicado é conseguir os salários de toda a vida do servidor.
Souza reforça ainda que não ter um sistema para fazer um cálculo deste tipo há um ano é um absurdo. “Já é absurdo um processo de aposentadoria durar 180 dias, às vezes um ano, mas é o mais comum. Agora demorar isso tudo para fazer um cálculo eu nunca vi. Dependendo do caso pode gerar um dano moral para o servidor. É algo a ser analisado caso a caso, uma situação de dano moral, de licença médica”, reforça. Pela quantidade de processos parados no instituto, o advogado entende que até mesmo seja possível uma ação coletiva, de autoria de um sindicato dos servidores municipais, assim como cada um pode impetrar uma ação individual. Ana Maria afirma ter procurado o sindicato de sua categoria, mas lhe foi respondido que era preciso esperar.
O advogado explica que a ação judicial pode gerar a obrigação do instituto em realizar os cálculos em determinado prazo, como 30 dias, ou até mesmo a concessão do afastamento do trabalho com a manutenção do salário atual até que o processo seja finalizado. “Mas os servidores não precisam esperar que as indenizações por danos morais ou outras sejam iguais às concedidas pelo Judiciário quando se trata de empresas privadas. Há uma questão já de que os juízes normalmente dão indenizações muito menores, quando dão, ao se tratar de servidores públicos”, conta. Ele explica que as ações, mesmo que envolvem as questões trabalhistas, dos servidores públicos são tramitadas na Justiça Comum e não no Juizado Especial (Trabalhista).
Processos represados
O GoiâniaPrev informa que, em setembro de 2023, “o antigo sistema da Prefeitura de Goiânia foi substituído pelo novo Sistema de Recursos Humanos – SIGEP”. O instituto explica que se trata de um sistema mais moderno e que integra todas as secretarias municipais. “Algumas funcionalidades desse sistema estão sendo desenvolvidas e outras aprimoradas, como o módulo que permite a realização de tais cálculos previdenciários necessários para aposentadorias por média contributiva”, ressalta. Deste modo, o órgão confirma que “há processos pendentes de cálculos aguardando a disponibilização do novo módulo de sistema necessário desde setembro de 2023, no total de 376 processos até o presente momento”, informou na tarde desta terça-feira (17).
De acordo com o instituto, o novo módulo (ferramenta) para realização de cálculos foi disponibilizado pelo SIGEP ao GoiâniaPrev nesta segunda-feira (16) e, nesta terça-feira (17), a equipe técnica do instituto está realizando os devidos testes de validação do sistema, com a previsão de que a ferramenta entre em operação a partir de quinta-feira (19). Segundo o GoiâniaPrev, com o início das operações na data informada, o instituto estima que num prazo de cinco meses o órgão “consiga vencer toda a demanda represada, na medida em que, após a realização dos cálculos, cada processo de aposentadoria só terá seguimento mediante a ciência expressa e o ‘de acordo’ do interessado, momento em que ele decidirá ou não pelo prosseguimento da sua aposentação”.