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Falta de recursos ameaça projeto de música para crianças e jovens carentes

Wildes Barbosa
Violinista Igor Monteiro, idealizador e coordenador do projeto musical desde 2017: sala de ensaios na UFG está vazia por falta de recursos financeiros

Uma das mais emblemáticas iniciativas socioculturais de Goiás corre o risco de desaparecer por falta de recursos. Organização da sociedade civil (OSC) sem fins lucrativos, o Instituto Cajuzinhos do Cerrado, que se dedica ao ensino de instrumentos de corda a comunidades carentes e periféricas de Goiânia, Terezópolis de Goiás e Nerópolis, está com suas atividades paralisadas desde julho, após perder seu maior patrocinador. Sem verbas, aulas e apresentações estão suspensas.

Quem já teve oportunidade de conferir as apresentações da orquestra de cordas e coral Cajuzinhos do Cerrado não imagina o que há escondido sob partituras e acordes musicais no palco. O violinista paraibano Igor Viana Monteiro, 35 anos, adotou Goiás em 2011 quando foi aprovado em concurso da Orquestra Sinfônica de Goiás. Em 2015, decidido a se dedicar ao ensino musical, abandonou o projeto inicial e se tornou professor das redes públicas da capital e de Senador Canedo. Ao se deparar com o abismo social, decidiu criar em 2017 na unidade rural onde atuava, Escola Municipal Santa Terezinha, entre Goiânia e Nerópolis, um projeto para democratizar o acesso à música.

No ano seguinte, ainda sem um nome, o grupo foi convidado a participar do Festival Internacional de Música de Trancoso (BA), que ocorreria em 2019. Assim surgiu a orquestra Cajuzinhos do Cerrado, naquele momento com apenas 14 integrantes, que ganhou uma enorme visibilidade e novos convites. “A gente entendeu que era uma necessidade não somente dos alunos da escola, mas de toda a comunidade, por isso decidimos desvincular o projeto da instituição pública. Criamos uma nova turma e passamos a atender no quintal da casa da professora Tânia Monteiro, integrante do projeto”, revela o violinista.

Em 2020, a Escola de Música e Artes Cênicas (Emac) da Universidade Federal de Goiás passou a abrigar o projeto e um ano depois veio o convite de uma associação que fomenta a cultura em Terezópolis de Goiás para a criação de um novo polo no município. “Os recursos começaram a entrar, empresas e pessoas físicas passaram a apadrinhar o projeto.” Além das aulas de violino, vieram o ensino de viola clássica, violoncelo e canto coral. Atualmente, o projeto mantém 130 estudantes, a partir dos 8 anos e até idosos, mais 15 profissionais dedicados às aulas.

Os entraves financeiros pioraram a partir da pandemia da Covid-19. Em 2022, veio o fim da ajuda da associação de Terezópolis. O polo do município se manteve com o suporte da prefeitura local, que cede sala e transporte para os alunos. Mas em julho deste ano, o maior patrocinador desistiu. “Perdemos 90% da verba que recebíamos, R$ 9,9 mil. A empresa reconhece nosso trabalho, mas não teve mais condições de ajudar. Era um aporte financeiro direto, o que ficou não dá para manter o projeto em funcionamento”, explica Igor Monteiro.

Nos primeiros tempos de trabalho do instituto, os instrumentos foram doados pelo próprio violinista e pessoas próximas a ele. Após a apresentação em Trancoso, algumas portas se abriram e outros instrumentos chegaram. Mais recentemente, o nível de excelência oferecido pelo projeto ficou evidente quando o instituto participou de um processo seletivo de uma grande empresa que atua no Centro-Oeste e no Sudeste e venceu dezenas de outros candidatos. O prêmio de quase R$ 90 mil foi pago em 5 violoncelos, 16 violinos e 8 violas, além de papéis para impressão de partituras, cadeiras e estantes de partituras. Os alunos que já atingiram nível ideal para apresentações somam entre 80 e 90.

Campanha busca atrair padrinhos 

Até julho, o Instituto Cajuzinhos do Cerrado sobrevivia com R$ 11,3 mil, recursos destinados ao pagamento de professores, técnicos e manutenção de instrumentos. “Muita gente é voluntária. Precisamos, no mínimo, recuperar o que perdemos, mas o ideal seria ao menos R$ 30 mil. Por isso, estamos atrás de empresas interessadas em patrocinar via Lei Rouanet, de incentivo à cultura. Também lançamos uma campanha de apadrinhamento”, diz Igor Monteiro. Nos alunos, angústia e expectativa têm andado juntas desde que a suspensão das aulas. Pela fome de música e pela fome literal.

Em uma das apresentações de fim de tarde, veio a decisão de estender as ações para as famílias dos alunos em situação de grave vulnerabilidade social. “Um aluno começou a passar mal. Perguntamos se ele tinha se alimentado naquele dia e a resposta foi ‘não’, porque não havia o que comer em casa”, conta o músico. Assim surgiu dentro do instituto o programa Cajuzinho Social, que distribui cestas básicas para os alunos que vivem em insegurança alimentar. “Dos 130 estudantes, temos 48 pedidos, mas só conseguimos atender 10, porque não temos recursos.”

O coordenador do Cajuzinhos do Cerrado revela que os R$ 30 mil considerados ideais para manter o projeto ajudariam na compra das cestas básicas. “Temos alunos que vão para o projeto para receber os alimentos.” Para manter as aulas que transformam vidas, o instituto lançou uma campanha com a expectativa de conseguir pelo menos 200 padrinhos, que seriam doadores fixos com, no mínimo, 50 reais.

Júlia Borges
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