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Goiânia cria ambulatório para pessoas trans e travestis

Wildes Barbosa
Ambulatório Municipal de Processo Transexualizador, chamado de TransViver, já funciona no Cais Novo Mundo: discussão iniciada há um ano

GABRIELLA BRAGA

Neste mês do Orgulho LGBTQIAPN+, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Goiânia deu início aos atendimentos para pessoas trans e travestis no Ambulatório Municipal de Processo Transexualizador, chamado de TransViver. A novidade na capital se soma a mais três unidades no Estado que atendem o público com serviços que variam de consultas médicas e acompanhamento psicossocial, à hormonioterapia e cirurgias de adequação sexual. Hoje, unidades de saúde de Itumbiara e Senador Canedo, além do Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG), prestam o serviço especializado, sendo que apenas este último realiza procedimentos cirúrgicos.

O Processo Transexualizador foi instituído no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2008, sendo ampliado a partir de 2013. A habilitação junto ao Ministério da Saúde (MS) pode ocorrer na modalidade ambulatorial e hospitalar, que garante a realização das cirurgias de adequação sexual (veja no quadro ao lado). No caso da capital, serão ofertados serviços de âmbito ambulatorial. A pasta adianta que ainda não há data prevista para o lançamento oficial, mas 34 moradores de Goiânia que estavam na regulação estadual aguardando o ingresso no programa já estão sendo atendidos.

É o caso de uma jornalista de 24 anos, que preferiu não se identificar. Ela conta que foi chamada no início deste mês pela pasta. “Eu já conhecia o programa há muito tempo, mas o passo de buscar efetivamente foi no final do ano passado. Quando recebi a ligação fiquei primeiro em choque e depois muito feliz, e anotei a consulta em vários lugares, colocar despertador, calendário para não perder a data, porque há um tempo venho sentindo necessidade de acompanhamento, não só para hormonização e cirurgia, mas psicológico, porque é muita violência. O processo de transição que começa mas nunca termina é um processo que dói”, relata.

Superintendente de Gestão de Redes de Atenção à Saúde da SMS, Cynara Mathias Costa explica que a discussão para criação do Ambulatório TX na capital foi iniciada há pouco mais de um ano, junto com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas (SMDHPA). “Identificamos que o tempo médio de espera para munícipes adentrarem ao único ambulatório transexualizador que a gente tinha contratualizado, que é o do HGG, era de um ano. Então fomos construindo para atender essa população extremamente vulnerável, com uma taxa de mortalidade grande e que já passou e ainda passa por muita discriminação”, diz.

Ela explica ainda que o ambulatório ainda está em fase de implantação, como a contratação de médicos — ginecologista, urologista, e psiquiatra. Outros profissionais, como psicólogo, assistente social e endocrinologista, também integram o quadro da equipe multidisciplinar do serviço na capital. A superintendente pondera ainda que é preciso realizar uma mudança na Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (Remune) para incluir todos os hormônios possíveis para a terapia hormonal.

“A secretaria municipal entende que essa população foi por muitos anos negligenciada, então é difícil o acesso não somente ao serviço de saúde. Todas as equipes de saúde da família já foram orientadas sobre como preencher para que o paciente caia na regulação para o ambulatório transexualizador. É um local de portas abertas para o acolhimento desta população”, pontua. Mas, complementa, para ter acesso ao serviço é preciso procurar uma unidade da atenção primária ou básica para obter encaminhamento.

“A hormonização, também conhecida por terapia hormonal ou hormonioterapia, é uma intervenção de saúde utilizada por muitas pessoas transexuais e travestis como uma estratégia para se expressarem e serem reconhecidas pela sociedade dentro dos limites do gênero com o qual se identificam ou com o qual preferem ser identificadas”, explica Cynara.

Referência

O Serviço Transexualizador – Ambulatório TX do Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG) foi criado em 2017. Com abrangência estadual, o programa já fez até este ano 13.083 atendimentos ambulatoriais, além de 47 cirurgias de redesignação sexual e outros 130 procedimentos cirúrgicos diversos, como mastectomia e mastoplastia, e hesterectomia. Hoje, 717 estão em acompanhamento no programa e outras 387 aguardam na fila da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO) para o primeiro atendimento.

Durante a semana do Dia do Orgulho LGBTQIAPN+, celebrado no dia 28 de junho, o hospital realizou uma força-tarefa para concluir 12 cirurgias plásticas que contemplam pacientes do programa que aguardam pelos procedimentos. Foram oito mastectomias, que é a retirada das mamas, e quatro mamoplastias, que consiste na colocação de prótese mamária. A fila ainda conta, atualmente, com 35 aguardando por mastectomia, e 37 por mamoplastia.

Uma das pessoas contempladas foi a diarista Cintia de Jesus Silva, de 37 anos. Ela conta que buscou o Serviço Transexualizador do HGG em 2020 e, no ano seguinte, foi chamada para adentrar ao programa. Cintia relata que sempre quis fazer a cirurgia de mastectomia mas, como norma do MS, precisou aguardar ao menos dois anos para entrar na fila de espera para o procedimento. Três anos depois, chegou o momento. “Foi maravilhoso, estou feliz demais. Não gostava do volume, e toda essa ansiedade. Agora posso usar as camisas como eu gosto Só quem tem esse sonho sabe como é importante”, comenta.

Diretor técnico do HGG, Guilherme Carvalho de Sousa explica que nem todas as pessoas que fazem parte do programa chegam a fazer um procedimento invasivo. “Existe um entendimento comum de que todas pessoas que entram no programa é para fazer a mudança de sexo. Mas nem todas querem, e nem todas que entram com essa vontade acabam fazendo, pois acabam mudando de ideia. O tempo maior é para ter certeza, porque é irreversível.”

Mais duas cidades também contam com serviço

Itumbiara, na região Sul de Goiás, foi o primeiro município a criar o Ambulatório Transexualizador (TX), ainda em 2018. O serviço é prestado no Núcleo de Atenção Básica de Saúde (NABS) local, com atendimento para pessoas trans e travestis de toda a região do Estado. Na unidade, há oferta de atendimento médico especializado com endocrinologista e psiquiatra, além de psicólogo e assistente social. Hoje, o espaço faz o acompanhamento de 63 pessoas que integram o programa.

Já em 2022, Senador Canedo, localizado na Região Metropolitana de Goiânia, lançou o ambulatório no município. A unidade faz atendimento de 25 municípios da região Centro-Sul em Saúde de Goiás, com uma equipe formada por endocrinologista, psiquiatra, psicólogo e enfermeiro. Ao todo, 98 usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) são contemplados na unidade. 

“Pelo menos hoje já temos 12 aptos para serem encaminhados para outros procedimentos no Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG)”, pontua a coordenadora e responsável técnica pelo Ambulatório Regionalizado do Processo de Afirmação de Gênero de Senador Canedo (ARPAGESC), Rafaela Damasceno.

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