Goiânia enfrenta o risco de passar por uma seca mais severa e prolongada em 2023. A interferência do fenômeno El Niño poderá causar um inverno mais quente e fazer com que as chuvas só retornem com consistência no final de outubro. Com a apresentação de uma seca fraca ainda no início da estiagem e com um histórico de precipitações aquém do esperado, especialistas alertam sobre a importância de monitorar o cenário.
O El Niño causa o aquecimento das águas do Oceano Pacífico. Com isso, o regime de chuvas na região Norte do País fica afetado. Normalmente, esse cenário costuma atrasar a chegada do período chuvoso em Goiás, que costuma começar em outubro e ser concluído em abril. “Atualmente, estamos em um cenário de neutralidade. A previsão é que ele comece a nos afetar em junho ou julho”, explica André Amorim, gerente do Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo).
Na capital, de acordo com dados da estação meteorológica do Centro, o período chuvoso de 2022/2023 contou com um volume de precipitações menor do que o de 2021/2022. Foram 1.937,9 milímetros (mm) entre outubro de 2021 e abril de 2022, contra 1.568,8 mm entre outubro de 2022 e abril de 2023. Ainda sim, o volume foi o terceiro melhor dos últimos oito anos.
Mesmo assim, Amorim esclarece que existe um problema recorrente de chuvas abaixo da média histórica (1981-2010), que é de 1.522 mm para a capital. Para se ter ideia, desde o período chuvoso de 2015/2016, apenas a partir de 2019/2020 que Goiânia tem registrado um volume de chuvas acima da média. “Estamos arrastando esse déficit há algum tempo”, enfatiza Amorim.
Além disso, o gerente do Cimehgo conta que muitas vezes as chuvas são mal distribuídas, ou seja, chove muito em um determinado momento e esse volume acaba não sendo bem absorvido pelo solo e incorporado aos cursos d’água. Nos dias 29 e 30 de janeiro deste ano, choveu 249,2 mm na Vila Brasília, na região metropolitana. Para se ter ideia da dimensão, o volume representa 71% das precipitações para todo o mês de janeiro na capital.
O regime de chuvas aquém do esperado se reflete no agravamento da estiagem. De acordo com o Monitor de Secas, em abril deste ano, mês em que o período chuvoso se encerra, a região da Bacia do Meia Ponte já estava sob seca fraca, o que impacta, em curto prazo, a agricultura e as pastagens.
Temperatura
É esperado que o El Niño também interfira no aumento das temperaturas. Em 2022, Goiás estava sob influência do La Niña, que favorece a entrada de massas de ar polar, o que causou um inverno mais rigoroso. Em 11 de agosto do ano passado, Goiânia registrou a menor temperatura dos últimos 28 anos para esse mês. Na região leste da capital, os termômetros marcaram 9,3°C.
A previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) é que Goiânia, que possui a média climatológica mínima de 15,2° C e máxima de 30°C, em junho, enfrente dias de inverno com mais calor. “Também teremos dias mais quentes em agosto e setembro”, destaca Elizabete Ferreira, meteorologista do Inmet em Goiás.
As temperaturas mais altas podem gerar tempestades quando combinadas com algumas chuvas que estão previstas para setembro. “A expectativa é de alguns milímetros (de chuva) nesse mês. Porém, o modelo que pode mudar. É importante destacar que caso realmente chova, isso não quer dizer que o período de estiagem acabou. Isso só acontece quando as chuvas vêm com regularidade”, frisa o gerente do Cimehgo.
Umidade
Com menos massas de ar úmidas chegando a Goiás, a umidade relativa do ar também deve ser manter mais baixa, o que agrava ainda mais a situação do estado, que já sofre com a questão durante o período de estiagem. Há duas semanas, o Inmet emitiu o primeiro alerta para queda da umidade relativa do ar, quando o índice ficou abaixo de 30%. O ideal é entre 50% e 80%.
Abastecimento depende do uso racional da água
Com a chance de uma estiagem mais prolongada, manter um consumo consciente durante o período de seca é essencial para garantir o abastecimento de água em Goiânia. O gerente do Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo), André Amorim, afirma que o cenário exige atenção. “É preciso ficar em alerta”, destaca.
No momento, a vazão média do Meia Ponte é de 13.941 litros por segundo (l/s), sendo que não chove no Alto do Meia Ponte há 29 dias. O rio entra no primeiro nível de segurança, o de atenção, quando a vazão de escoamento é menor ou igual a 12.000 l/s.
Em 2022, quando as temperaturas foram mais amenas e o período chuvoso registrou o maior volume dos últimos oito anos, não foi necessário abrir comportas de barragens, em setembro de 2022, após quatro meses sem chuva, o Meia Ponte entrou em nível crítico 2, quando a vazão de escoamento é menor ou igual a 4.000 l/s e o governo estadual reduziu em 25% as vazões de captação dos usuários de águas subterrânea.
Ainda assim, o cenário foi menos problemático que o de outros anos. Em setembro de 2021, o Meia Ponte chegou ao nível crítico 3, quando a vazão de escoamento é menor ou igual a 3.000 l/s. A quantidade de água acessada pelas indústrias e produtores rurais foi diminuída em 50% e as comportas da barragem na Fazenda Amaralina, na zona rural de Goiânia, foram abertas. Naquele ano, a capital registrou 1.610,5 milímetros (mm) durante o período chuvoso, número superior ao registrado neste ano (1.568,8 mm).
“Temos visto uma melhora em relação a outros anos críticos, como 2017. Parte disso é fruto de um trabalho de conscientização feito com todos os usuários da bacia: desde os produtores rurais até a população urbana”, diz Amorim.