O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai colocar mais R$ 300 milhões no programa que concede descontos à compra de carros "populares" para continuar estimulando as vendas do setor automotivo.
O governo já havia disponibilizado R$ 500 milhões para a compra de veículos leves com abatimentos, valor que agora deve subir para R$ 800 milhões.
Segundo integrantes do governo, um montante de R$ 80 milhões será liberado dentro do próprio limite inicial de R$ 500 milhões e será direcionado à venda exclusiva para pessoas físicas.
Essa parcela estava travada por causa de uma regra na MP (medida provisória), que mandava acomodar dentro do limite o impacto da perda de arrecadação com IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e PIS/Cofins devido aos descontos concedidos pelas montadoras (patrocinados ou não pelo governo).
Segundo interlocutores, do limite inicial de R$ 500 milhões, apenas R$ 420 milhões chegaram efetivamente a ser acessados pelas montadoras por causa dessa regra.
Outros R$ 220 milhões serão liberados para venda ao público em geral (incluindo pessoas físicas e empresas), mas ficarão sujeitos ao abatimento das perdas da Receita na arrecadação.
A informação sobre a ampliação foi antecipada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) à colunista Míriam Leitão, do jornal O Globo, e confirmada pela Folha com integrantes da Fazenda e do Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).
Até a última atualização, na sexta-feira (23), o volume de crédito tributário autorizado pelo Mdic para uso no programa era de R$ 420 milhões. Desde então, havia um impasse sobre elevar ou não o volume de recursos. Haddad chegou a afirmar que não havia "margem" para ampliar os incentivos.
Quando o programa foi lançado, em 5 de junho, a estimativa era de que teria duração de cerca de quatro meses. Com o sucesso do plano, os recursos para os automóveis atingiram R$ 400 milhões em apenas duas semanas.
Os descontos patrocinados pelos cofres públicos para carros vão de R$ 2.000 a R$ 8.000, podendo alcançar valores maiores a critério das fábricas e concessionárias, e são válidos para veículos novos com preços de mercado até R$ 120 mil.
Veja aqui a lista completa de carros contemplados no programa. Na última atualização divulgada pelo Mdic, o plano contava com 266 versões de automóveis e 32 modelos de nove montadoras.
Menor preço, maior eficiência energética e maior densidade industrial (capacidade de gerar emprego e crescimento no entorno) foram os três critérios levados em conta para a definição das faixas de desconto. Quanto maior a pontuação nesses requisitos, maior o desconto aplicável.
A formulação do programa para fomentar a compra de automóveis foi anunciada pela primeira vez em 25 de maio por Alckmin. Inicialmente, o foco da política eram os carros de até R$ 120 mil, mas o governo decidiu contemplar também caminhões e ônibus –com descontos que vão de R$ 33,6 mil a R$ 99,4 mil.
A exclusividade das vendas de carros para pessoa física havia sido prorrogada até 5 de julho. Ao término desse prazo, o programa ficaria liberado também para empresas. Já a compra de ônibus e caminhões com desconto está disponível às pessoas jurídicas desde o dia 21.
O governo vem defendendo que o incentivo a carros é parte de uma iniciativa para movimentar o mercado interno, incentivar a indústria e, consequentemente, gerar empregos.
Segundo o economista Marcos Lisboa, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula) e colunista da Folha, é equivocado o diagnóstico de que haverá fortalecimento do setor com a concessão de subsídios para estimular a demanda.
Ele afirma que experiências similares no passado, como os programas Inovar-Auto e Rota 2030, não se mostraram eficazes para atingir tais objetivos. "A regra tem sido que o setor acaba se enfraquecendo e não consegue desenvolver ganhos para que possa sobreviver sem subsídios."
Na visão de Lisboa, o país deixa de enfrentar o problema central do setor industrial, que é o baixo crescimento da produtividade, e o governo adota um discurso contraditório ao anunciar novas políticas de concessão de benefícios enquanto defende a redução de gastos tributários.
"Isso não tem gerado ganho de produtividade, são políticas que acabam fracassado a médio e longo prazo, criando empresas dependentes das benesses do Estado", afirma.
Para o economista, a agenda deveria incluir melhorias nas técnicas de produção. Além disso, levar em conta a identificação de áreas onde o Brasil tem potencial de combinar ciência com tecnologia para aumentar a produtividade do setor privado, assim como um diagnóstico de áreas da estrutura produtiva em que o Brasil pode se tornar mais competitivo e outras nas quais é melhor o país importar componentes.