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Inscrições para o Encceja reduzem 43% em Goiás

Diomício Gomes
Sala de aula: especialista faz ressalvas quanto à modalidade para alcançar certificado

Goiás tem 32.593 inscritos para o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), que será realizado neste domingo (27), com aplicação em Goiânia e outros 26 municípios do estado. No comparativo de 2017, quando o exame passou por remodelações e retoma como forma de obter certificação do ensino médio, a 2023, as inscrições apresentaram redução de 43,8%.

Realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) desde 2002, o exame permite que jovens e adultos, que não concluíram os estudos na idade correta, obtenham certificação nas etapas de ensino fundamental e médio. A aplicação é destinada a maiores de 15 anos, para certificado da etapa do ensino fundamental, e maiores de 18 anos, no ensino médio.

Na retomada do exame como meio de obter o certificado de ensino médio, feito de 2009 a 2017 por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o número de inscritos nas duas etapas de ensino chegava a 57.190. Já em 2018, houve aumento de 13,2%, passando para 64.749, o maior quantitativo registrado na série histórica do período. Por outro lado, no ano seguinte, o Encceja em Goiás obteve o menor número de participantes, num total de 22.007. (Veja quadro no final)

O total de inscritos, no entanto, não representa o número de certificações. Para se ter ideia, na soma das certificações concedidas por duas das três duas instituições certificadores em Goiás, foram 30.477 certificados completos emitidos de 2017 a 2022. Destes, 16.882 foram emitidos pela Secretaria de Estado da Educação (Seduc) e 13.595 pelo Instituto Federal de Goiás (IFG). Isso, pois, a prova é aplicada pelo Inep, mas a certificação fica sob responsabilidade das secretarias estaduais de educação e pelos institutos federais.

Conforme a professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), Maria Margarida Machado, o Encceja substituiu os chamados exames supletivos, realizados em âmbito estadual. A partir da adesão dos estados à prova nacional, os supletivos passaram a ser descontinuados, progressivamente, pelas secretariais estaduais de educação. Um dos fatores, aponta a docente, foi a gratuidade da realização aos estados, visto que a prova é conduzida e financiada pelo Inep.

Em Goiás, com base na tese Exames de Certificação no Estado de Goiás: Caracterização e Estrutura Educacional, conduzido por mestrandos e doutorandos da UFG, o supletivo durou de 1973 a 2012. Já o Encceja é realizado no estado desde 2008. Vale lembrar que o exame nacional teve como ponto inicial uma demanda de brasileiros residentes no exterior, em especial no Japão, e que necessitavam da certificação de escolaridade para o exercício laboral.

Para Maria Margarida, o exame é uma excepcionalidade necessária. No entanto, aponta que os gestores públicos municipais e estaduais têm aderido ao Encceja em detrimento à Educação de Jovens e Adultos (EJA). A

modalidade é voltada também àquelas pessoas que não concluíram o ensino fundamental ou médio na idade correta e desejam retomar os estudos. A diferença é que, no caso da EJA, há aulas. O currículo, no entanto, é abreviado a um ano e meio, no caso do ensino médio. Já o fundamental pode ser concluído em dois anos.

“Existem estímulos por parte de gestores de fechar turmas da EJA e chamar a população para preparar para fazer a prova. É o barateamento do direito à educação. Com isso, não tem custo de manter escola aberta, não tem professor, merenda, transporte, ou seja, reduzo os custos. É uma política perversa e muito preocupante”, pontua. Ainda conforme ela, as medidas podem acabar estimulando os jovens a saírem da escola.

“Temos uma defasagem idade-série (pessoas com idade dois anos acima do esperado para a série) muito alta. Então, não deixa de ser um estímulo. Ele sai da sala e vai fazer a prova para pegar o certificado. É mais rápido treinar para fazer uma prova.”

A docente pontua ainda que, com o esvaziamento da possibilidade dos jovens e adultos de frequentarem turmas de EJA, e, consequentemente, um maior incentivo pelo Encceja, “perde a essência da educação básica, a formação crítica, os conhecimentos produzidos na relação aluno professor”. “Não adianta ter um certificado sem ter conhecimento consolidado, formação de qualidade. O exame não é uma preocupação com a aprendizagem”, aponta.

O incentivo, conforme Maria Margarida, tem relação com os cursos preparatórios à prova. Conforme ela, antes mesmo do exame, os supletivos já mantinham um formato de vendas de preparação às provas. “Estratégia privada de preparação da prova. Baixa os materiais no site do Inep, junta as pessoas numa sala, e começa o processo de treinamento para que aprendam o mínimo necessário (para obter a certificação).”

A docente aponta ainda que a redução no número de inscrições pode estar relacionada às intercorrências na realização do exame que, entre 2002 e 2017, passou por reformulações, quando deixou de ser aplicado em algumas edições. “Não teve política de continuidade, não foi todo ano que foi aberto edital. Resultados já foram questionados, e já tiveram denúncias de fraudes. Então causa uma certa insegurança em relação ao rigor”, acrescenta.

Mas, aponta, não há como definir as motivações visto que a falta de pesquisa para “acompanhar a aplicação descontínua do Encceja de lá para cá” prejudica o acompanhamento da política pública. “Houve perda de banco de dados do Encceja”, finaliza Maria Margarida.

Redação
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