O julgamento que condenou quatro réus pela tragédia da boate Kiss, ocorrida em Santa Maria em 2013, foi anulado pelos desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A decisão se deu por 2 votos a 1, na análise dos recursos da defesa dos réus nesta quarta-feira (3). Com isso, os quatro acusados pelo incêndio deixaram a prisão ainda na noite de quarta-feira (3).
Foram liberados: Elissandro Callegaro Spohr, dono da boate Kiss, que havia sido condenado a 22 anos e seis meses de reclusão; seu sócio, Mauro Londero Hoffmann, que havia sido condenado a 19 anos e seis meses; o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, que havia sido condenado a 18 anos; e o assistente da banda, Luciano Bonilha Leão, também condenado a 18 anos.
Luciano e Marcelo estavam no Presídio Estadual de São Vicente do Sul e foram os primeiros a deixar a prisão. Mauro e Elissandro estavam na Penitenciária Estadual de Canoas e foram liberados em seguida.
Dez anos do crime
Com a anulação do julgamento, o incêndio que terminou com 242 mortes e mais de 600 feridos pode completar dez anos em janeiro de 2023 sem nenhum responsabilizado na prisão. O Ministério Público lamentou a anulação e disse que vai recorrer da decisão junto ao STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Pedido de anulação
Os advogados dos réus haviam pedido a anulação do julgamento alegando que não houve cumprimento das regras judiciais ao longo do processo. Advogado de Spohr, Jader Marques, citava entre os motivos a definição de um dos jurados a seis dias do júri, causando prejuízo à preparação das defesas.
O voto do relator Manuel José Martinez Lucas, que era temido pelos familiares das vítimas em razão de pareces anteriores dele no caso, foi o único contrário à nulidade. Embora tenha reconhecido irregularidades nos ritos do processo, o desembargador não enxergou nada que pudesse influenciar na decisão dos jurados pela condenação.
Já os desembargadores José Conrado Kurtz de Souza e Jayme Weingartner Neto discordaram o relator. No voto de minerva pela anulação, Weingartner Neto citou primeiramente irregularidades no sorteio dos jurados. Conforme o desembargador, o sorteio de parte dos jurados a quatro dias do júri, seis a menos do que mínimo admitido, comprometeu as estratégias da defesa.
"Nós temos que levar mais a sério a plenitude da defesa", disse o desembargador.
Weingartner Neto questionou ainda o acesso do Ministério Público ao sistema Consultas Integradas para a composição dos candidatos a júri. O sistema dá acesso a dados como a ficha policial dos gaúchos, e a defesa dos réus questionou que a exclusão de pessoas com algum vínculo com o sistema prisional pode influenciar a posição dos jurados sobre o encarceramento dos réus.
Finalizado em dezembro de 2021, o julgamento ocorreu após quase nove anos da tragédia e foi o mais longo da história do Judiciário gaúcho.