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Justiça solta 7 PMs acusados de chacina em Cavalcante

Reprodução/Redes Sociais
Saviano Souza, de 63 anos, Ozanir Batista, o Jacaré, de 46, Alan Pereira Soares, de 28, e Antônio Fernandes da Cunha, o Chico Calunga, de 35.

A Justiça mandou soltar os sete policiais militares presos desde 25 de fevereiro de 2022 pela morte de quatro pessoas em uma chácara de Cavalcante. Desde que eles foram mandados para júri popular, em novembro, o processo tem andado devagar, com uma série de recursos peticionados pela defesa sem que até o momento a data e o local do julgamento pelo crime tenham sido marcados. As vítimas foram executadas em 20 de janeiro de 2022.

Na decisão, o juiz Leonardo de Souza Santos, da Vara de Crime e Fazenda Pública de Cavalcante, sinalizou que o julgamento não deve ocorrer “em prazo próximo”, visto que ainda há muitos recursos ainda a serem analisados e que ainda não foi analisado o pedido de transferência de fato para a realização do júri. O processo principal, no qual os policiais estão sendo julgados por homicídio doloso qualificado, não está com Leonardo, mas com outro magistrado.

Os sargentos Aguimar Prado de Morais e Mivaldo José Toledo, o cabo Jean Roberto Carneiro dos Santos e os soldados Luís César Mascarenhas Rodrigues, Ítallo Vinícius Rodrigues de Almeida, Welborney Kristiano Lopes dos Santos e Eustáquio Henrique do Nascimento são acusados de armar uma emboscada para matar Saviano Souza Conceição, de 63 anos, Ozanir Batista da Silva, o Jacaré, de 46, Alan Pereira Soares, de 28, e Antônio Fernandes da Cunha, o Chico Calunga, de 35. Os policiais respondem por fraude processual.

Leonardo atendeu a um pedido feito pela defesa de Ítallo e estendeu a decisão a todos os réus. O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) se posicionou contra a soltura, alegando que os requisitos que levaram às prisões preventivas ainda estão presentes e lembra que testemunhas foram intimidadas quando eles estavam soltos, uma delas precisando entrar em um programa de proteção.

De acordo com a sentença, os policiais estão proibidos de exercer qualquer atividade policial operacional ou ostensiva, de saírem de casa à noite, nos feriados e fins de semana e de entrar no perímetro urbano de Cavalcante, Alto Paraíso de Goiás e Colinas do Sul. “A suspensão do exercício da função pública de policial militar é parcial. Poderão ocupar-se em atividades internas e administrativas da Polícia Militar; no entanto resta vedada a sua atuação em atividades de campo, em operações, em policiamento ostensivo etc”, escreveu.

Em sua decisão, o magistrado deu ênfase à proibição de qualquer contato dos réus com testemunhas e parentes das vítimas. “Destaco, especialmente, que os acusados devem observar rigorosamente as medidas cautelares de proibição de manter contato com familiares das vítimas e testemunhas e seus familiares, por qualquer meio, inclusive por meio de terceiros.”

Leonardo argumenta que já se passou muito tempo desde a prisão dos policiais envolvidos e que a população de Cavalcante não estaria tão nervosa e preocupada como estava na época para que se justificação a detenção por manutenção da ordem pública. Ele também diz não ver no momento “risco concreto e efetivo de reiteração delitiva”.

“Ainda quando fosse a gravidade concreta fundamento idôneo para impor a segregação cautelar, parece-me que o elevado decurso de tempo desde a data do fato e da aplicação da medida constritiva fez, se não afastar, ao menos atenuar o sentimento de intranquilidade e temor social que se manifestou na população deste município de Cavalcante.”

Para o magistrado, as medidas cautelares impostas vão controlar o risco de que os policiais possam vir a cometer novos crimes. “O risco de reiteração delitiva – que, note-se, sempre existe em todos os casos –, pode ser controlado por outras medidas cautelares diversas da prisão.”

Demora

Ao abordar o risco de as testemunhas se sentirem intimidadas com a soltura dos policiais, o magistrado argumenta sobre a possibilidade de demora para que o julgamento aconteça. Ele diz que a instrução criminal da primeira etapa já se encerrou, que os acusados já foram pronunciados e que os recursos em sentido estritos interpostos foram todos negados. Porém, ainda há os recursos especiais e extraordinários para serem analisados, caso sejam admitidos.

“Como o acusado foi pronunciado e possivelmente será submetido a julgamento no Tribunal do Júri, haverá a necessidade de produção de prova oral em plenário, onde prestarão depoimento perante o Conselho de Sentença as testemunhas que forem arroladas pelas partes. No entanto, diante da pendência de apreciação de recursos excepcionais e da representação de desaforamento feita na decisão de pronúncia, deve-se considerar que não há perspectiva de realização do julgamento em prazo próximo, de modo que a segregação cautelar teria de estender-se indefinidamente até a realização do julgamento”, explicou.

Ainda falta também o Tribunal de Justiça analisar o pedido do juiz Rodrigo Victor Foureaux Soares, da Comarca de Cavalcante, para que o júri ocorra em outra comarca, de preferência em Goiânia. “Não há condições de se garantir um julgamento imparcial pelo Tribunal do Júri, em razão da grande revolta da população local com diversas manifestações atrelado ao fato do município contar com cerca de 10 mil habitantes, o que somente reforça o poder de influência nos jurados decorrente dos protestos”, escreveu o juiz quando determinou o encaminhamento do caso para o júri, em novembro.

Repercussão

O crime teve grande repercussão na região da Chapada dos Veadeiros, causando forte comoção popular, o que motivou uma investigação pela Polícia Civil, sob supervisão do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO). Os policiais são acusados de simular um flagrante de apreensão de pés de maconha após uma suposta denúncia anônima para invadir as chácaras de Salviano e Ozanir.

Os policiais renderam as quatro vítimas e as matarem com quase 60 tiros disparados. Eles alegam que foram os civis que começaram a atirar durante a abordagem, mas não foi encontrada nenhuma prova de que os quatro estavam armados ou mesmo que tenha havido outros disparos senão os das armas da PM.

A denúncia feita pelo MP-GO aponta que os policiais ficaram por cerca de uma hora e meia na chácara e após renderem as vítimas foram ouvidas duas levas de tiros, com um intervalo de 10 minutos entre elas. Uma mulher grávida que estava na chácara foi deixada com vida. Outra testemunha que estava trabalhando na chácara ouviu os gritos dos policiais e das vítimas e conseguiu se esconder.

Na versão dos policiais, eles colocaram as quatro vítimas em uma única viatura ainda com vida após os disparos, mas antes de levá-las a um hospital a 36 quilômetros dali, fizeram uma revista na propriedade, atearam fogo nos supostos pés de maconha e ainda pararam no caminho para pedir para que a grávida voltasse para a chácara.

Riscos

O MP-GO se posicionou novamente contra a soltura dos policiais e argumentou que no final de junho o mesmo magistrado havia decidido por manter a prisão preventiva ao analisar o pedido de outro réu, o sargento Mivaldo José Toledo.

Para os promotores do caso, a defesa dos policiais não conseguiu comprovar que não estão mais presentes os requisitos que sustentaram a prisão até então: a necessidade de ordem pública e risco para a instrução criminal.

Eles também argumentam que as medidas cautelares para substituir a prisão não vão impedir o risco de ameaças a testemunhas e familiares e de interferência no trâmite do processo e que as provas arroladas até agora sustentam essa afirmação.

O MP-GO destaca que o julgamento ainda não ocorreu por causa da série de recursos interpostos pelos advogados dos réus, parte deles ainda pendentes de avaliação tanto de admissibilidade como de mérito pelo Judiciário.

Para os promotores, as testemunhas do caso ainda serão ouvidas no momento do júri e com a soltura dos policiais estão correndo risco imprudente de intimidação e coação.

“Menciona-se, ainda, que uma das testemunhas arroladas na denúncia, após várias tentativas de intimidação por parte dos réus, fora incluída em programa de proteção à vítima e testemunhas ameaçadas face à periculosidade dos agentes de segurança pública denunciados nos autos principais”, afirma o órgão na petição que antecedeu a sentença de soltura.

Os sete policiais militares estavam detidos no presídio militar em Goiânia desde o momento da prisão, em 2022, e parte deles já enviou comprovantes de endereço na capital, conforme solicitação da Justiça.

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