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Lojistas temem vazio com 'calçadão' da Avenida Anhanguera

Wildes Barbosa
Pedestres terão mais espaço para circular na Avenida Anhanguera em trecho a ser fechado para veículos

GABRIELLA BRAGA

Comerciantes da Avenida Anhanguera temem que a via seja esvaziada com a pedestrianização do trecho de 700 metros localizado entre a Araguaia e Tocantins, no Centro de Goiânia. Prevista no projeto Centraliza, a proposta de restringir o trânsito de veículos particulares busca priorizar a circulação de pedestres, mas lojistas apontam que a região já não conta com grande fluxo de transeuntes, e que não há atrativos para eles. Por outro lado, especialistas apontam que a medida garante benefícios ao espaço, como a redução da poluição visual e sonora.

O projeto para requalificação do Centro prevê, entre outros pontos, a proibição do fluxo de carros, motocicletas, e outros veículos automotores particulares na Avenida Anhanguera. Para isso, a calçada seria ampliada, formando um ‘calçadão’, e o trânsito ficaria livre apenas para transporte coletivo, pedestres e ciclistas. Ao ser divulgado em outubro passado, o plano de pedestrianização englobava, ainda, partes das Ruas 6, 7, 8 e 9, e da 23, no entorno do Teatro Goiânia, e a Praça José Ximenes, no miolo da quadra entre a Rua 3, Avenida Araguaia e Avenida Anhanguera.

O jornal mostrou em abril que as iniciativas mais complexas do Centraliza — como a pedestrianização – teriam todo o trâmite burocrático e financeiro resolvido para que sejam iniciados em 2025, ou seja, na próxima gestão. Na ocasião, a reportagem informou que o projeto para priorizar o fluxo de pedestres na Avenida Anhanguera já estava pronto. Agora, a Secretaria Municipal de Finanças (Sefin), responsável pelo projeto de requalificação, diz que está fazendo modificações no projeto e não há previsão de quando será finalizado. Também não adianta quais serão as alterações.

Enquanto isso, comerciantes locais ouvidos pelo jornal relatam receio em perder mais clientes com a restrição do fluxo de veículos. A lojista Joana Darc da Costa, de 55 anos, que ocupa um ponto localizado entre outras lojas já fechadas, opina que a medida não funcionaria pela falta de transeuntes. “Pessoal não anda mais no Centro. Com a obra da Avenida Goiás (do BRT Norte-Sul) o movimento caiu demais. Agora que melhorou e o povo começou a circular. Mas se colocar esse projeto (pedestrianização), o Centro vai acabar.”

Para ela, a redução no fluxo de transeuntes na via tem relação com a insegurança pública, principalmente ao anoitecer. Joana cita, a exemplo, o uso e venda de entorpecentes nas proximidades. Além disso, a falta de estacionamento próximo também afastaria os clientes. A opinião é compartilhada pelo ambulante Pedro Henrique Pereira, de 38. “Não faz sentido. Vão estacionar onde? Para subir a pé?”, questiona. Ele concorda que medidas sejam tomadas para “atrair o povo ao Centro”.

A lojista Maria Aparecida Alves, de 65 anos, trabalha há 24 na Avenida Anhanguera, e tem percebido nos últimos anos uma diminuição considerável no fluxo de pedestres. A queda na circulação de possíveis clientes, relata, está relacionada ao fechamento de outros comércios. O jornal contou ao menos 18 lojas fechadas no trecho previsto para ser pedestrianizado. “Vai perdendo o fluxo de clientes e de funcionários dessas lojas (que compravam nas outras). O Centro precisa, sim, de revitalização, mas não tirar o fluxo de carros. Tem motorista que passa, vê a loja e volta depois.”

“O pessoal que está tentando se manter teria de fechar. Não tem nenhuma melhoria no Centro. O estacionamento é difícil, vem de carro e não tem como estacionar”, acrescenta o lojista Altieres Fernandes, de 38 anos. Há oito, ele mantém uma sorveteria nas proximidades do cruzamento com a Avenida Tocantins e garante que o fluxo de transeuntes na região tem apresentado queda antes mesmo da pandemia, em 2020, mas que foi acentuada naquele ano. Por isso, opina, não há razão para priorizar o fluxo de pedestres.

Ao elaborar o projeto, o Paço identificou que há dificuldade para circulação de pessoas, ao mesmo tempo em que faltam estacionamentos. Por isso, além de propor que a Avenida Anhanguera seja pedestrianizada, com a priorização da circulação de pedestres, também quer criar incentivos fiscais aos estacionamentos privados, como isenção do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), além de implementar novo conceito da Área Azul.

O jornal mostrou na última terça-feira (30) que o relatório sobre o projeto de lei que institui o Programa Centraliza foi finalizado com a inclusão de 14 emendas modificativas ao projeto. Dentre elas, sobre a pedestrianização, está a proibição de ambulantes com mesas e cadeiras sem a autorização do Comitê Gestor. Além disso, a atividade econômica nesse trecho seria feita em quiosques. O relatório foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal, mas ainda deve ser levado para votação no plenário e na Comissão de Finanças.

Favorável

Para o Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO) e o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO), a proposta de priorizar o fluxo de pedestres na Avenida Anhanguera é benéfica à mobilidade no Centro da capital, mas aponta que é preciso que seja implementada em conjunto com as demais que integram o Centraliza para atrair o público para a região. “A prática existe em várias cidades do mundo e é sempre bem aceita”, pontua o presidente do Crea-GO, Lamartine Moreira, citando São Paulo e Curitiba, além de Nova York, Paris e Madri.

Para Moreira, deve-se pensar em formas de privilegiar do transporte ativo, como pedestres e ciclistas, em detrimento dos veículos particulares, o que justificaria o projeto. “Não é possível priorizar sempre os veículos oferecendo a eles a rota mais curta. O Centraliza deve ter bons resultados, principalmente considerando que o projeto de lei prevê a criação de estruturas adequadas para os ambulantes, com sua instalação em quiosques projetados e construídos pelo poder público”, expõe.

O conselheiro do CAU-GO David Finotti também reforça que a pedestrianização da avenida tem de estar atrelada à ampliação e incentivo ao uso de bicicletas e transporte coletivo, mas adianta a impressão positiva sobre a proposta. “O pedestre vai ter um caminhar mais fácil, já que não vai ter de ficar competindo com o veículo, que geralmente passa em uma velocidade considerável. E fica mais fácil ir de um comércio a outro, de uma ponta da rua a outra.”

Finotti aponta ainda que a priorização de pedestres e ciclistas reduz a poluição sonora e visual. “E, com a arborização própria, o espaço se torna mais agradável de se estar.” Ele acrescenta que o trânsito para veículos particulares não teria tanto impacto. “Hoje não existe mais isso de ‘vou no Centro e quero parar na porta do comércio’. A pessoa de qualquer jeito vai parar algumas quadras de distância. Mas, agora, poderia caminhar de maneira mais fácil para ir ao comércio.”

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