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Médico que “voou” em viaduto em acidente que matou 2 não vai para tribunal do júri

Reprodução/TV Anhanguera
Acidente no viaduto da T-63 vitimou os dois jovens que estavam na moto

A Justiça acatou pedido do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) e modificou os crimes pelos quais estava respondendo o médico Rubens Mendonça Júnior, de 30 anos, suavizando, assim, as possíveis penas, caso ele seja condenado pela morte de duas pessoas e por lesões corporais causadas em outras duas durante um acidente na noite de 20 de abril no viaduto da Avenida T-63, no Setor Bueno. O fato se deu após o médico atingir 148 km/h com o carro que dirigia e descolar os pneus do asfalto no ponto mais alto da estrutura viária.

O juiz Lourival Machado da Costa, da 2ª Vara de Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribunal de Júri, substituiu as condutas imputadas na denúncia original contra o médico de homicídio doloso qualificado e lesão corporal dolosa qualificada, conforme constam no Código Penal, para homicídio culposo (quando não há intenção) e lesão corporal também culposa, crimes estes conforme previsto no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), nos artigos 302 e 303.

O crime de homicídio doloso qualificado tem pena que pode chegar a 30 anos. Já o culposo quando cometido na direção de um veículo automotor, sem os agravantes, vai até quatro anos. Além disso, com a decisão, o processo deixa a 2ª Vara e é encaminhado para outra, específica para crimes de trânsito e ainda a ser definida.

Ao apresentar as alegações finais, o promotor Sérgio Luís Delfim, da 92ª Promotoria de Justiça de Goiânia, argumentou que a mudança na postura em relação à denúncia se deu após a realização da audiência de instrução e julgamento, com a apresentação de novas provas e interrogatório das testemunhas. Seu pedido foi corroborado pela defesa do médico em petição encaminhada posteriormente.

O magistrado concordou com o posicionamento do promotor, para quem não ficou demonstrado no processo que o motorista “tenha assumido o risco de produzir o resultado morte das vítimas”, mas, sim, que ele “conduzia seu veículo de forma imprudente e sem perícia necessária, o que contribuiu sobremaneira para a prática do acidente, e demonstrou não conhecer as peculiaridades de funcionamento de seu veículo Volvo XC40”.

Lourival dá como exemplos de casos em que poderia se configurar homicídio doloso qualificado as vezes em que os motoristas participam de rachas ou associam velocidade excessiva com embriaguez ao volante. “Embora demonstrada a excessiva velocidade empregada pelo acusado no momento do acidente, não há indícios suficientes para apontar que o acusado teria assumido o risco de matar e lesionar a vítimas”, escreveu na sentença.

Na decisão, o juiz também destaca, mas apenas como comentário, que a esposa do médico, presente no veículo no momento do acidente, não foi ouvida em juízo, apenas na delegacia, apesar de ser uma peça importante do caso. Testemunhas contaram que ouviram ela falando que o marido e ela estavam testando o veículo para saber se iria de 0 a 100 km/h em quatro segundos, como dizia o manual. Sobre isso, Lourival disse apenas que “o suposto teste de velocidade feito pelo acusado não restou demonstrado no curso da instrução”.

Entenda o caso

O médico voltava com a esposa de um restaurante em uma quinta-feira quando, por volta de 23h40, ao abrir o sinal da T-63 no cruzamento com a Avenida T-4, ele teria, segundo a denúncia, resolvido testar o carro novo, se alcançaria a velocidade de 100 km/h em quatro segundos, mas perdeu o controle da direção após uma ultrapassagem já no viaduto. A defesa nega esta versão e diz que houve problema de domínio do carro ao tentar passar pelo veículo à frente.

O carro do médico chegou a planar antes de atingir o motoboy Leandro Ferreira Pires, de 23, e o garçom David Antunes Galvão, de 21, que estava na garupa da moto. Os dois morreram no local. Já a promotora de eventos Wanderlyne Gomes dos Reis, de 46 anos, que estava em uma moto, se feriu no acidente ao também ser atingida pelo carro de Rubens e ficou oito dias internada até se recuperar. Uma quarta pessoa, Gilson Campos Antonio, sofreu ferimentos leves, sem precisar de internação. Ele estava em um carro com a esposa e dois filhos.

Na denúncia apresentada ainda em junho, o MP-GO concluiu do dolo eventual, quando o autor assume o risco de matar ou ferir alguém, por ter agido com imprudência pelo excesso de velocidade na pista cujo limite sinalizado era de 50 km/h somado à ultrapassagem em local proibido, já que entrou na contramão e, ao voltar para a pista correta, perdeu o controle. Este posicionamento do órgão não perdurou até as alegações finais.

Um dos fatos que levaram a pedir a desclassificação é um laudo com a extração de dados do controle de airbag repassados pela montadora mostrando que o pedal do acelerador ficou totalmente pressionado até 3,5 segundos antes do impacto, o que representa um trajeto de 144 metros. Para o promotor, “tudo indica” que Rubens teria tirado o pé do acelerador antes de entrar no viaduto, apesar de a distância a partir do impacto apontar que ele já estaria na subida.

Essa conclusão do promotor é importante porque ele usa este argumento ao desclassificar a qualificadora por motivo torpe. “É verdade que o acusado resolveu satisfazer seu desejo pessoal de testar, em local completamente inadequado, a velocidade que seu automóvel podia desenvolver. Mas, como já dito, não se pode dizer que ele agiu em total desprezo para com a vida e integridade corporal de seres humanos, porque o teste ocorreu antes de chegar no viaduto, num espaço onde não havia outros veículos.”

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