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Mais de 58 cidades goianas anunciam ações emergenciais nas escolas

Reprodução/Redes Sociais
No Colégio Estadual Doutor Marco Aurélio, aluno de 13 anos feriu a facadas outros três colegas nesta terça-feira (11)

por Gabriella Braga

Os recentes ataques a escolas têm causado medo em pais, alunos e profissionais da educação e obrigado prefeituras goianas a adotarem medidas emergenciais para evitar novas tragédias. Ao menos 58 administrações municipais já anunciaram providências após o caso ocorrido na manhã desta terça-feira (11) em Santa Tereza de Goiás, no Norte goiano. Especialistas apontam que estratégias urgentes são necessárias, mas destacam a adoção de medidas mais eficientes a médio e longo prazo para coibir a onda de violência.

O assunto voltou ao centro de debate com o ataque no Colégio Estadual Doutor Marco Aurélio, quando um estudante de 13 anos feriu a facadas outros três colegas e tentou atingir uma professora, que conseguiu se esconder em uma sala de aula. O menor foi contido por um auxiliar de limpeza da unidade e apreendido pela Polícia Civil do Estado de Goiás (PC-GO). O incidente no interior goiano ocorre quase uma semana depois do ataque em uma creche de Blumenau, em Santa Catarina, na última quarta-feira (5).

Suspensão de aulas, reforço do patrulhamento escolar, implantação de detector de metais e portas giratórias, controle mais rígido de entrada e saída, palestras educativas e treinamento de servidores foram algumas das estratégias adotadas pelas prefeituras nas escolas da rede municipal de educação. Novas reuniões estão sendo marcadas pelas administrações para que sejam planejados protocolos de segurança nas unidades.

A Prefeitura de Goiânia anuncia o lançamento, nesta quarta-feira (12), da Operação Escolas sem Violência, que vai acompanhar a entrada e saída de alunos e, ainda, promover palestras voltadas ao combate do bullying. A prática consiste em violência física e psicológica e tem sido relatada por especialistas como um dos motivos para a prática de novos ataques.

Em Aparecida de Goiânia, a administração diz que “será implantado sistema de acesso com identificação digital às unidades de ensino” e “botão de segurança conectado ao Centro de Inteligência Tecnológica (CIT) para acionar a Guarda Civil Municipal e a Polícia Militar”, além do reforço da Patrulha Escolar.

Santa Tereza de Goiás, onde ocorreu o ataque mais recente, São Miguel do Araguaia, Santa Terezinha de Goiás, Bonfinópolis, Mundo Novo e Trombas suspenderam as aulas. Outros municípios estão se mobilizando junto à Polícia Militar do Estado de Goiás (PM-GO) para intensificar o patrulhamento nas redondezas das escolas municipais. A corporação tem orientado familiares a fiscalizar aparelhos celulares e as mochilas dos estudantes como “dica de segurança escolar”.

Prevenção

A Polícia Civil apreendeu, entre esta segunda (10) e terça-feira (11), dois adolescentes de 16 anos por ameaça de ataques a escolas em Terezópolis e Rio Verde. Nos dois dias, também foram cumpridos seis mandados de busca e apreensão em Goiânia, Edeia, Rio Quente e Bela Vista de Goiás.

Em Rio Verde, no Sudoeste goiano, o menor de idade fazia ameaças de massacres em duas escolas públicas. Nas redes sociais, publicava fotos segurando armas, a fim de gerar pânico na comunidade escolar. Ele foi apreendido na manhã desta terça. A estratégia é semelhante a adotada em Terezópolis. No município da região metropolitana de Goiânia, uma adolescente criou perfil falso em uma rede social onde ameaçava fazer atentado em um colégio, e foi apreendida na tarde do mesmo dia.

Outras ameaças foram feitas utilizando as redes sociais nos municípios de Edeia, onde circulavam prints (fotos) de conversas do WhatsApp dizendo que ocorreria um massacre em uma unidade escolar. O Conselho Tutelar tomou conhecimento e acionou a PC-GO, que cumpriu mandado de busca e apreensão também nesta terça, quando foram localizadas munições e armas de fogo.

Em conversa em grupo de uma rede social, três menores, entre 13 e 14 anos, incitavam e faziam apologia a crimes de massacres em escolas. Eles, inclusive, planejavam atacar uma unidade escolar de Rio Quente, onde dois dos menores estudavam no ano passado. A corporação cumpriu mandado de busca e apreensão no município e em Goiânia, ainda nesta terça. Na oportunidade, foram apreendidos simulacros de arma de fogo e, na casa de um deles, material de apologia ao nazismo, uma ideologia extremista que promove discurso de ódio contra grupos minoritários.

Em Bela Vista, na região metropolitana da capital, investigadores chegaram, nesta segunda-feira, a um adolescente de 14 anos que incitava e fazia apologia a massacres em unidades de ensino. O menor chegou a fazer uma postagem dizendo que haveria uma rebelião nesta terça na mesma escola em que estuda, localizada no município.

Orientação é cuidado de longo prazo

Especialistas ouvidos pelo Daqui apontam para a necessidade de estratégias efetivas de médio e longo prazo para prevenir novos ataques em escolas. Isso porque, conforme eles, as medidas emergenciais tomadas nesse primeiro momento são “limitadas” e não dão conta de resolver o problema de violência em instituições de ensino.

Coordenador do Núcleo de Estudos sobre Criminalidade e Violência da Universidade Federal de Goiás (Necrivi/UFG), Dijaci David de Oliveira explica que nos Estados Unidos, onde a onda de violência a escolas é uma grande problemática, foi feito grande investimento em segurança armada nas escolas, detectores de metais, e treinamento de professores e gestores das unidades. “E mesmo com tudo isso houve crescimento.”

Segundo ele, a criação de mecanismos de segurança contribui para a redução dos ataques, mas a educação deve se voltar para o enfrentamento da “cultura do ódio” que “deve ser confrontada e precisa contar com todos os atores sociais: gestores públicos, direções de escolas e professores, líderes religiosos, famílias”.

“Nesse primeiro momento todas as administrações estão sob pressão. Precisamos dos dispositivos (físicos), mas não podemos parar neles. A resposta é realmente romper com a cultura da violência. Precisa de mecanismos mais eficientes, que trabalhem com inteligência e capte a antecipação desses momentos”, aponta.

Oliveira defende que a retomada do ensino voltado aos direitos humanos e a educação sobre as diferenças sociais e respeito aos grupos minoritários deve ser uma prioridade por parte do poder público, visto que, na maioria dos casos, há discurso de ódio envolvido contra “grupos não hegemônicos. E as crianças estão dentro desse grupo”, destaca. “São práticas de intolerância e preconceito”, resume.

O coordenador do Necrivi acrescenta que medidas mais eficientes devem ser tomadas a fim de evitar que o medo tome conta dos alunos e familiares. “As escolas não podem estimular a cultura do medo. O aluno vai ter receio de ver a escola como local de aprendizagem e ampliar as redes de sociabilidade. Se estimular a cultura do medo vamos perdendo esses lugares como local importante”.

A estratégia de inteligência, como o monitoramento de grupos em redes sociais, é uma das principais medidas a serem tomadas. A posição é defendida por Luís Flávio Sapori, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Segundo ele, é fundamental que a polícia atue diretamente na identificação de comunidades virtuais “que estimulam ódio e cultuam casos antigos (de massacres), para identificar potenciais agressores”.

Para Sapori, também se faz necessária a intensificação de patrulhamento preventivo nas escolas e redondezas. “Tem de investir em equipamentos de vigilância, como câmeras de segurança, vigilância privada não necessariamente armada. A médio e longo prazo é fundamental que as escolas e as universidades invistam em programas internos de acompanhamento de saúde mental”, defende.

Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Urbano pela Universidade de São Paulo (USP), Paola Carloni diz que o debate sobre a violência nas escolas não pode ser feito apenas “em tempo de crise” e “precisa ser pensado cotidianamente” pela sociedade. A psicóloga escolar defende que a violência nas unidades de ensino são “um problema coletivo” e “um fenômeno mais amplo”, mas aponta que estratégias voltadas a criação do vínculo de pertencimento do estudante com a escola é uma medida de longo prazo que diminui a incidência de novos casos.

“Se a escola é lugar de vínculo e não de exclusão, ele (aluno) não vai se voltar contra”. Como exemplo, cita projetos para além da sala de aula, como música, arte, esporte. “Quanto mais conseguir criar vínculo com o conhecimento, de ter uma profissão e um futuro, são fatores protetivos contra qualquer forma de violência”, afirma.

Paola diz ainda que o processo de escolarização deve ser pautado na diferenciação e no fortalecimento da expressão individual de cada sujeito, além de apontar para oportunidades de vida aos alunos. “Para o sujeito se conhecer e expressar isso.”

 

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