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Maternidades de Goiânia seguem sem atendimento ambulatorial

Wesley Costa
Com hemorragia, Sandra aguardava atendimento na Maternidade Dona Íris na tarde desta quarta (18): “Horrível”

GABRIELLA BRAGA

Passados mais de 20 dias, os atendimentos ambulatoriais nas maternidades Célia Câmara, Dona Íris e Nascer Cidadão, em Goiânia, continuam suspensos. Ao mesmo tempo, pacientes reclamam de lentidão nos atendimentos de urgência e emergência. Gestora das unidades municipais, a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) admite que pode haver demora devido ao aumento da procura pelo serviço. Já a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) prevê a normalização na próxima semana.

Os serviços ambulatoriais das três maternidades foram paralisados no dia 29 de agosto. Na ocasião, a Fundahc alegou em nota encaminhada à imprensa que a suspensão ocorreria “até que seja alcançada a regularidade financeira dos convênios com a Prefeitura de Goiânia”. A fundação ligada à Universidade Federal de Goiás (UFG) apontou ainda, que os atendimentos de urgência e emergência continuariam sendo realizados, mas com limitação de internações e “possibilidade de transferência de pacientes para outras unidades por meio da Central de Regulação do município.”

À época da suspensão dos atendimentos, a SMS informou que havia a previsão de novos repasses “na próxima semana”, ou seja, na primeira semana de setembro. O jornal apurou pagamentos feitos em setembro de R$ 6,3 milhões ao Hospital Municipal da Mulher e Maternidade Célia Câmara (HMMCC), R$ 4,7 milhões ao Hospital e Maternidade Dona Íris (HMDI) e R$ 1,8 milhão à Maternidade Nascer Cidadão (MNC). Os valores em atraso não foram informados pela SMS e Fundahc.

Em nota, a Fundahc alega que “os dois repasses recebidos da SMS em setembro foram direcionados ao pagamento dos colaboradores, parte dos valores em atraso de médicos PJ e algumas notas fiscais a receber de fornecedores”. “Os valores foram insuficientes, portanto, para adquirir suprimentos, pagar fornecedores e demais notas de prestadores PJ. Assim, a Fundahc está em negociação com os fornecedores que oferecem insumos e medicamentos para retomar os serviços eletivos e ambulatório o mais breve possível”, continua.

Já a SMS diz que “recentemente, foi apresentada à fundação uma programação de repasses para a cobertura dos valores acumulados, no passado, até novembro próximo”. “Valores (estes) que estão interferindo no cumprimento das metas de pagamento dentro do mês. Um novo repasse está programado para a próxima semana, com isso, a secretaria acredita que todo o atendimento será normalizado”, conclui.

Atendimento mais lento

Ainda conforme a Fundahc, há uma média de 610 atendimentos eletivos por dia nas três maternidades, que são realizados de segunda a sexta-feira. E enquanto a situação não é normalizada, pacientes relatam que os atendimentos de urgência e emergência estão mais demorados. É o caso da auxiliar de serviços gerais Sandra dos Santos, de 30 anos. Ela buscou por volta das 7h desta quarta-feira (18) a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Chácara do Governador, na região leste da capital, para atendimento ginecológico diante de uma hemorragia. Entretanto, foi encaminhada à Maternidade Dona Íris, na Vila Redenção, na região sul.

Na unidade de saúde voltada ao atendimento ginecológico e obstétrico, a chegada dela foi por volta de 11h. A reportagem a encontrou do lado da fora do prédio de urgência e emergência, que estava com todos os assentos preenchidos, por volta de 15h. Até às 16h, a mulher ainda aguardava ser chamada para a consulta, tendo realizado apenas um exame de sangue até aquele momento. Sandra reclamava da demora para ser atendida. “Atendimento está lento. Horrível”, lamenta.

Em outros casos, além da demora para o atendimento, usuárias reclamam que foram mandadas para casa mesmo diante de um quadro de dor intensa. Essa foi a realidade da dona de casa Rosana da Luz, de 23 anos, também na maternidade Dona Íris. Grávida de 40 semanas, a jovem esteve na unidade de saúde nesta terça-feira (17) com fortes dores na região da barriga e perda de líquido. Ao chegar no local, por volta de 10h30, foi constatada dilatação de três centímetros. Após ser medicada e realizar os exames, ela conta que a médica a orientou ir para casa e, caso continuasse a sentir dores, para procurar a Maternidade Célia Câmara, na região oeste.

O relato é semelhante ao da dona de casa Thais Cristina Faria, de 33 anos, grávida de 38 semanas. Ela conta que havia ido na maternidade na semana passada e, por ter diabetes gestacional e gravidez de risco, foi orientada a voltar nesta terça à unidade para a indução do parto. No entanto, ao passar pelo profissional médico que fazia o atendimento, foi informada de que não seria feito o procedimento. Até o momento que o jornal conversou com a mesma, ela ainda aguardava ser chamada para o retorno. Naquele momento, ela reclamava que além da demora para o atendimento, teve de percorrer cerca de 230 quilômetros (km), saindo de Corumbaíba até a unidade.

Além delas, a cuidadora Eva Silva, de 40 anos, reclamava do atendimento para a filha Erica Cristina, de 20. A jovem, com 37 semanas, estava com contração e dilatação, além de falta de líquido amniótico. Mesmo com muitas dores, ela aguardava desde às 10h na recepção da unidade, após já ter passado por exames. A reportagem a encontrou por volta das 16h30. “Está horrível. Geralmente é bem ágil, mas hoje, depois da greve (paralisação), está crítico”, comenta.

MP-GO diz que repasse ainda não é integral

Em junho deste ano, a Justiça determinou a Prefeitura de Goiânia a fazer o repasse integral e mensal no valor de R$ 20,2 milhões à Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) para a gestão das maternidades Célia Câmara, Dona Íris e Nascer Cidadão. A decisão em caráter liminar foi motivada pela ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) ainda em setembro de 2023.

Na ação, o órgão ministerial apontou que a gestão das três maternidades municipais foram repassadas para a Fundahc mas, a partir de 2021, não efetua os repasses de forma devida, sendo feitos em “atraso e em valores inferiores aos devidos”. Ainda no documento, é relatado que os atrasos apresentam risco à continuidade do atendimento para a população. Os valores mensais citados, conforme os convênios, é de R$ 10,3 milhões ao Hospital Municipal da Mulher e Maternidade Célia Câmara (HMMCC), R$ 7 milhões ao Hospital e Maternidade Dona Íris (HMDI) e R$ 2,9 milhões à Maternidade Nascer Cidadão (MNC). O total representa o montante ao qual a Prefeitura foi determinada a pagar, no valor de R$ 20,2 milhões.

Ainda em setembro do ano passado a Fundahc apontava uma dívida de R$ 73,7 milhões. Já na sentença datada do dia 26 de julho, que reforçou a liminar do mês anterior, a juíza Raquel Rocha Lemos, da 3ª Vara da Fazenda Pública Municipal e Registros Públicos, determinou que o município faça o repasse integral e mensal à Fundahc no quinto dia útil de cada mês.

Entretanto, conforme o órgão ministerial, mesmo após a sentença, “não houve o repasse integral dos valores revistos nos convênios”. Diante disso, foi feito o requerimento do bloqueio de verba pública no valor de R$ 9,5 milhões, montante que não teria sido pago no mês de referência de agosto.

Na decisão da juíza no último dia 9, a Prefeitura foi intimada para comprovar que houve o repasse integral do mês de agosto, “sob pena de bloqueio do numerário suficiente para seu adimplemento”. Entretanto, o Paço ainda está em prazo para resposta, conforme o MPGO.

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