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Ministério Público diz que defesa de réus acusados de matar advogados cria ‘fábrica de fumaça’

Fábio Lima/O Popular
Nei Castelli, fazendeiro apontado como o mandante do crime

No segundo dia de julgamento dos acusados de matar os advogados Marcus Aprígio Chaves e Frank Alessandro Carvalhaes, nesta quarta-feira (31), o Ministério Público de Goiás (MPGO) acusou a defesa dos réus de tentar confundir o júri com detalhes insignificantes sobre o caso.  

Tudo é feito para se criar uma fábrica de fumaça. Confundir detalhes com coisas que são úteis e outras que não tem importância nenhuma”, disse o promotor Spiridon Anyfantis.   

Os advogados foram mortos enquanto trabalhavam em seu escritório, em Goiânia, no dia 28 de outubro de 2020.

O agricultor Nei Castelli é o acusado de ser o mandante do crime por não querer pagar aos advogados uma dívida sucumbencial no valor de R$ 4,6 milhões referente ao processo perdido de uma fazenda milionária na divisa de Goiás e Bahia; Cosme Lompa, por ter intermediado o contato entre Castelli e o matador, Pedro Henrique Henrique Martins (condenado em 2022 a mais de 45 anos de prisão); e a então namorada de Pedro Henrique, Hélica Ribeiro, por ter ajudado o rapaz a se esconder após o crime.

Ainda no início do julgamento, o promotor falou sobre a crueldade em que os advogados foram mortos. "É importante eu ressaltar uma coisa: estamos falando em crime de pistolagem aqui, que um tiro foi dado na cabeça [do advogado]. E me dói falar isso na presença do irmão do Marcus Aprígio", pontuou o promotor. A reportagem chegou a conversar com Rodrigo Aprígio e ele disse esperar que a justiça fosse feita. "Há quase 3 anos meu irmão e meu amigo, Frank foram mortos. Nós vemos muita impunidade no Brasil, e isso é ruim para a nossa sociedade. Esperamos um julgamento correto e justo". 

Ainda, de acordo com Anyfantis, a defesa dos réus tentou fazer com que o crime encomendado parecesse como latrocínio, pois desta forma, Castelli poderia ser inocentado, mas que essa história ‘não colou’ para o MPGO.

Em crimes que envolvam pistolagem, nós procuramos identificar cada mínimo detalhe. Juntamos todo o conjunto de indício, que sozinho até poderia ser frágil, em uma consistente e sólida prova”, argumentou.  

O promotor explicou que a defesa dos réus reforça a tese de que a morte dos advogados aconteceu após um roubo de R$ 2 mil no escritório. Contudo, no primeiro dia de julgamento, este ponto já havia sido elencado e refutado pelo MPGO, pois de acordo com o órgão, nenhum assaltante viajaria mais de mil quilômetros (eles saíram do Tocantins rumo a Goiânia) para roubar apenas R$ 2 mil. 

Plano A e B 

Outro promotor, Geibson Cândido, reforçou a tese de que o próprio advogado de Pedro Henrique, responsável pelo caso em 2022, havia sido patrocinado por Nei Castelli e que tentaram imputar o crime de latrocínio no caso dos advogados, mas que o MPGO percebeu a manobra rapidamente. 

Como o plano A não deu certo, o promotor disse que a defesa dos réus tentou outra linha, a de que Castelli não teria encomendado o crime e de que um agiota era o verdadeiro responsável pelas mortes. 

Essa outra hipótese surgiu dentro do processo. Mas como explicar que Marcus Aprígio, que tinha uma boa situação financeira e com um patrimônio avaliado em mais de R$ 3 milhões, seria morto por um agiota, que é o maior interessado em receber o dinheiro? Quem mataria sua mina de ouro?”, rebateu o promotor. 

O assistente de acusação Tadeu Bastos disse que, durante o processo, houve uma tentativa de "desconstrução" da imagem de Marcus Aprígio, por ele ser filho do de Leobino Chaves, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), com a falsa associação da família do advogado a esquemas de venda de sentença e tráfico de influência.

Discordância entre depoimentos de Nei Castelli 

Durante o julgamento, os promotores colocaram um vídeo do primeiro depoimento de Nei Castelli. Na época, o agricultor falou que sua renda mensal era de R$ 250 mil e, nesta terça-feira, seria de mais de R$ 1 milhão. Isso, porque segundo o promotor, o objetivo do réu seria levar o júri a acreditar que sua renda era alta e que ele não teria motivos para mandar matar os advogados por dinheiro.

Ao fim do vídeo, o promotor Geibson Cândido pediu aos jurados atenção a um fato mencionado por Castelli. Na primeira vez em juízo, Castelli disse que teria ido a Porto Nacional, no Tocantins, para se encontrar com o réu Cosme Lompa. A acusação afirma que foi neste encontro que a morte dos advogados foi combinada, momento em que Pedro Henrique teria sido contratado como pistoleiro.

No entanto, no júri desta terça-feira, Castelli disse que no dia apontado pela acusação, esteve somente próximo a Porto Nacional, e que estava acompanhado do filho para ir a um calcário e ver um caminhão. "Por que não foi trazido isso até agora? Qual o objetivo de mudar a versão e esconder a íntima amizade que tinha com Cosme?", questionou Cândido. 

O MPGO reforçou a hipótese de que Cosme teria intermediado a contratação de Pedro Henrique para matar os advogados depois que Nei Castelli perguntou se o amigo conhecia alguém que ‘cobrasse dívida’. Este termo se referia ao crime encomendado. Os promotores também pontuaram o fato de que, em depoimento, Cosme havia dito que somente teria dado carona a Pedro Henrique e o comparsa, Jaberson Gomes (morto em um confronto com a polícia militar do Tocantins dias depois do crime) porque já viria para Goiânia fazer “negócios”.

Porém, horas após o crime, no dia 28 outubro, Cosme teria mandado mensagem para o celular de Pedro Henrique com a seguinte mensagem “Onde você está, safadinho? Venha aqui”. O promotor Anyfantis disse que no dia seguinte, Pedro Henrique voltou para o Tocantins e foi até Cosme, segundo ele, para mostrar que o serviço havia sido feito e que deveria ser pago rapidamente. 

Medo da família Castelli  

Os promotores levaram para o debate o fato de que a juíza do Tocantins, Érika Barbosa Cavalcante, teria pedido proteção policial após a decisão na ação que motivou a sucumbência dos honorários de Marcus Aprígio e Frank Carvalhaes. Esse argumento foi usado para reforçar a tese de que a família Castelli era bastante poderosa na região e que intimidava, até mesmo, o Poder Judiciário.  

Outro ponto mostrado pelos promotores foi o fato de Luciano Maffra, testemunha no primeiro dia de júri, teria vendido a ‘Fazenda dos Netos’ e se mudado para fora do Brasil por medo de ser morto. O agricultor contou que havia recebido duas ameaças de morte pela família Castelli. Em um print mostrado pela reportagem, há uma conversa entre Marcos Aprígio e o amigo, Maffra, em que Aprígio diz ter medo de executar a dívida contra os Castelli (no valor de R$ 4,6 milhões referente aos honorários sucumbenciais) por medo de morrer.

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