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MP propõe indenização de R$ 100 mil no caso de garoto que morreu em toboágua, em Caldas Novas

Wildes Barbosa
Na foto tirada um dia após o acidente, brinquedo em manutenção no parque: David Lucas caiu do tobogã azul, de uma altura de 13,8 metros
Divulgação
David Lucas de Miranda, de 8 anos, que morreu em um parque aquático no dia 13 de fevereiro após cair de um toboágua, em Caldas Novas

O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) propôs um acordo de não persecução penal aos dois indiciados pela morte de David Lucas de Miranda. A criança de oito anos de idade caiu de uma altura de 13,8 metros após subir em um toboágua em manutenção em um parque aquático de Caldas Novas no dia 13 de fevereiro de 2022, um domingo à tarde.

Pela proposta, o então gerente do parque, Cristiano Vilela Reis, de 42 anos, e o engenheiro civil Flávio Tomaz de Aquino Musse, de 61, deixariam de ser denunciados caso aceitem pagar R$ 100 mil de indenização aos pais de David e cumprir 300 horas de serviços comunitários em um período de até um ano.

As defesas de ambos pediram até o dia 19 de junho para se manifestarem. Porém até a conclusão desta reportagem, no começo da noite desta segunda-feira (26), não foi protocolada nenhuma resposta no sistema eletrônico do Judiciário.

O promotor Cristhiano Menezes da Silva Caires, da 2ª Promotoria de Justiça, informou que se não houvesse resposta até esta semana, iria entrar com a denúncia por homicídio culposo, quando não há intenção de matar. O indiciamento pela Polícia Civil ocorreu no dia 16 de março do ano passado. “Fiz uma proposta de acordo, se eles não aceitarem aí vou denunciar os dois”, afirmou o promotor.

Os acordos de não persecução penal foram inseridos no ordenamento jurídico brasileiro a partir de janeiro de 2020, após a aprovação da lei federal 13.964/2019, o Pacote Anticrime. Trata-se de uma medida válida apenas para casos em que a pena mínima prevista em lei seja inferior a quatro anos e que não tenha ocorrido violência ou grave ameaça à vítima.

Para o acordo ser confirmado, a pessoa indiciada deve confessar a prática da infração penal e o MP-GO concorda em abrir mão da denúncia e evitar assim uma condenação. Para o promotor estes condicionantes se encaixam no caso de homicídio culposo pelo qual Cristiano e Flávio foram indiciados.

Sem alerta

David morreu após subir em um brinquedo interditado sem proteção para impedir o acesso a ele. As rampas do toboágua haviam sido retiradas, e o garoto conseguiu subir pela escada que ficava no interior da estrutura, que imitava um vulcão. Ele passou pela única entrada possível, que não estava devidamente lacrada.

O toboágua tinha quatro rampas, todas desmontadas. David passou pela azul. A obra havia sido iniciada em 1º de fevereiro, e o local estava cercado por tapumes de madeira, mas havia uma brecha para entrada e saída de veículos delimitada apenas por uma fita plástica zebrada. A piscina onde ele caiu tinha 97 cm de profundidade.

David foi socorrido no local pelos guarda-vidas e por uma enfermeira do empreendimento, além de socorristas do Samu e dos bombeiros, mas não resistiu aos ferimentos e morreu ainda no Hospital Municipal de Caldas. Além de traumatismo craniano, a criança sofreu lesões pelo corpo e afogamento.

A criança estava com os pais e irmãos. Eles são de Conselheiro Lafaiete (MG) e estavam pela quarta vez no parque. Em entrevista na época, a mãe, Jaqueline Rosa, disse que haviam chegado 20 minutos antes e que David pediu para ir ao banheiro. Como ele já conhecia o local e sabia nadar, o pai deixou.

“Inobservância técnia”

O indiciamento de Flávio se deu, segundo relatório entregue pelo delegado Rodrigo Pereira, por ser o engenheiro responsável pela obra no brinquedo e ter permitido a brecha sem tapume no local, mesmo havendo nota regulamentadora obrigando. Já Cristiano também teria agido por omissão ao permitir que a obra avançasse com o parque em funcionamento, mas sem os devidos alertas de forma mais clara e direta.

Além disso, as investigações apontaram que no começo das obras havia um tapume que impedia o acesso à plataforma a partir da base da escada. Porém, quando foram colocados os tapumes externos, Cristiano teria pedido para retirar este na base.

“Flávio e Cristiano concorreram na omissão de não determinarem a construção de barreiras físicas que fossem capazes de impedir que a vítima conseguisse descer do toboágua desativado. Havia vários pontos em que estes anteparos poderiam ter sido colocados para evitar a queda da criança, dentre os quais podem ser citados o início da rampa de acesso ao vulcão, a base da escada para a plataforma, a própria plataforma, a abertura dos toboáguas”, escreveu o delegado em seu relatório.

No caso de Flávio, há qualificadora no indiciamento por inobservância de regra técnica de profissão, o que aumentaria possível pena em até um terço.

“Perda irreparável”

O advogado Leonardo Soares, que representa os pais de Davi Lucas, afirmou ao Daqui que nenhum valor supriria a perda e a dor causada aos familiares, mas entende que o acordo de não persecução penal é um mecanismo previsto na legislação e que neste caso o Ministério Público achou válido utilizá-lo, fixando um valor mínimo de reparação com a pena de prestação de serviços.

Leonardo também disse respeitar a postura do órgão no processo criminal e a decisão da Justiça, se o acordo for consolidado em termos razoáveis, ressaltando que a devida reparação cível vem sendo buscada por meio de ação própria e em segredo de justiça em Conselheiro Lafaiete.

ODaqui entrou em contato com um dos advogados dos indiciados, mas ele apenas explicou o que é um acordo de não persecução e não deu mais retorno. O advogado do outro não foi localizado.

Em depoimento à Polícia Civil na época, ao qual o Daqui teve acesso, Cristiano disse que havia cartazes informando sobre a manutenção do brinquedo, mas nenhum alerta para que pessoas não autorizadas não entrassem no local. Ele também disse que a ausência do tapume era para a passagem de veículos que transportavam peças do brinquedo. O gerente comentou que a responsabilidade pela obra é do engenheiro e negou ter pedido a retirada do tapume na escada.

Já Flávio afirmou em sua oitiva que foi surpreendido com a notícia da queda da criança porque acreditava que a área estava devidamente isolada e que havia segurança por parte do parque no local. Ele também disse que não partiu dele a ideia de não ter o tapume na base da escada, mas concordou que ali não seria tão urgente. Segundo o engenheiro, o pedido para deixar a faixa zebrada foi feito por uma pessoa que cuidava da obra e que morreu dias antes e que não percebeu a alteração.

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