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Número de árvores retiradas em Goiânia já é o dobro de 2022

Wildes Barbosa
Gameleira começou a ser retirada pela Comurg há um mês, no Setor Leste Vila Nova, após pedido do proprietário do imóvel

Até o final de outubro deste ano, 5.268 árvores em Goiânia foram extirpadas por pedidos de moradores, realização de obras ou em programas de substituição de espécies em via pública. O número já é mais que o dobro do que o ocorrido em todo o ano passado, quando foram retiradas 2.559 árvores do espaço público da capital, e 14,35% a mais do que o efetuado em 2021, quando a Prefeitura relatou 4.607 árvores a menos na cidade. Especialistas apontam que a redução na arborização urbana afeta o microclima, com aumento da sensação térmica, dificulta o abastecimento do lençol freático e ainda reduz o sombreamento.

Os números apontados não contam com as árvores retiradas de forma irregular, ou seja, de ação própria de populares, sem a avaliação técnica dos agentes ambientais, que só autorizam o corte mediante condenação fitossanitária, com previsão de substituição da espécie, ou para realização de obras públicas ou privadas, neste caso com previsão de licença ambiental.

Neste mês, a população do Setor Bueno verificou a retirada de pelo menos cinco árvores da calçada da Rua T-13. Na mesma época, uma gameleira que estava plantada na Avenida Anápolis com a Rua Americano do Brasil, na Vila Pedroso, teve de ser retirada pela Prefeitura após uma suspeita de envenenamento. Uma árvore da mesma espécie começou a ser retirada pela Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) há um mês, no Setor Leste Vila Nova, após pedido do proprietário do imóvel.

Por outro lado, a Agência Municipal de Meio Ambiente relata que, até o final deste ano, haverá um total de 382.792 mudas plantadas nos últimos três anos. Deste total, 202 mil mudas estão plantadas pelo projeto ArborizaGyn, que atua em áreas degradadas em espaços públicos municipais, sobretudo em unidades de conservação na periferia da cidade. O geógrafo e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), o doutor em Climatologia Diego Tarley Ferreira Nascimento explica que isso torna a compensação ambiental ineficiente.

Segundo o geógrafo, tem sido notória a retirada das árvores em Goiânia, sobretudo em malhas viárias para a realização de obras ou mesmo por solicitação de moradores. “É uma gestão voltada ao desmatamento e a compensação não tem sido de forma estratégica e compensatória”, diz ele. O professor lembra que há na capital um processo de arborização, chamado ArborizaGyn, com a intenção de chegar ao plantio de 1 milhão de mudas. “De maneira bem prática, esse processo é de recuperação de áreas degradadas. Não atua frente a outros serviços ecossistêmicos, com destaque a contribuição do clima urbano. Se for ver onde essas mudas estão sendo plantadas, são principalmente em regiões periféricas. Estão sendo retiradas de locais mais quentes da cidade, como a Região Central e a recomposição é em regiões bem distantes”, esclarece Ferreira.

Esse projeto, segundo o geógrafo, não é uma compensação ambiental de forma estratégica e eficiente para a redução da temperatura e umidade relativa do ar. “Tem contribuído na recuperação de áreas degradadas, mas não para a melhoria do clima”, diz. No ano passado, por exemplo, a ação da Prefeitura ocorreu nos parques Macambira, Cascavel e Três Marias. Neste ano, o evento será no próximo dia 22 com previsão de plantio de outras 90 mil mudas no Residencial Jardins do Cerrado 2. Ferreira explica que as árvores prestam vários serviços ecossistêmicos, como a contribuição ao clima da cidade.

Neste caso, ele relata que isso ocorre porque as árvores e a cobertura vegetal como um todo realiza a absorção da radiação solar para o desenvolvimento das suas atividades metabólicas. Além disso, as árvores também ajudam no clima por conta do sombreamento. “Além disso, contribui fornecendo umidade para a atmosfera, a partir da transpiração, e isso acaba contribuindo com a redução da temperatura. As árvores também contribuem reduzindo a poluição, auxiliando a infiltração da água no solo e protegem o solo de processos erosivos. São apenas alguns dos vários serviços ecossistêmicos. São os efeitos positivos, mas também tem a questão estética”, argumenta.

Programas

O superintendente de Gestão Ambiental e Licenciamento da Amma, Ormando José Pires Júnior, afirma que a pasta atua em três frentes para a realização da mitigação dos danos de retirada das árvores na capital. O ArborizaGyn é um dos projetos, que demanda uma maior quantidade de mudas e ocorre em áreas públicas. Outro projeto é o Disque-Árvore, em que a população recebe uma muda e auxílio da agência para a plantação em seu lote privado ou calçada. Deste, desde 2021 a Amma informa que foram plantadas na cidade 6 mil espécimes nativas do Cerrado até dezembro do ano passado e, neste ano, até setembro foram pedidas mais 1.113 mudas por moradores da capital.

O terceiro projeto da Amma é o Rearboriza, que funciona de modo mais impositivo, em que a própria Prefeitura analisa e realiza a plantação de mudas ao longo das calçadas de determinada via. Este, que tem maior eficácia na arborização de locais mais quentes e prejudicados pela falta de árvores, ocorreu apenas duas vezes, sendo a primeira na Rua 94 do Setor Sul e a segunda neste ano, na Rua Quintino Bocaiúva, no Setor Campinas, em que foram plantadas 152 mudas ao longo da via. “Este demanda uma mão-de-obra mais trabalhosa, porque o técnico tem que ir ao local, andar toda a rua e analisar qual a espécie adequada, é mais demorada”, explica Pires.

Ele afirma que ainda não há previsão de uma próxima etapa do Rearboriza, mas que o foco será avenidas dos setores Campinas ou Central. “A gente percebeu que não é bom anunciar antes o local porque os moradores reclamam. As pessoas não querem ter uma árvore na porta de casa, mas denuncia quando o vizinho tira a árvore da porta da casa dele, por exemplo. Mas no lote dele mesmo, não tem”, diz o superintendente da Amma. Segundo ele, os números repassados pelo órgão são os oficiais, ou seja, conta as árvores retiradas de maneira legal. “Fora isso é uma ação clandestina, havendo o flagrante os fiscais fazem a apreensão de todo o material. Há casos também de envenenamento das árvores, eventualmente a gente acaba flagrando essas ações também”, afirma.

Segundo ele, isso ocorre de modo que a população tenta forçar a retirada da árvore, com a condenação fitossanitária da espécie, ao envenená-la, como ocorreu no caso da gameleira da Vila Pedroso. Ormando Pires concorda que a arborização urbana tem relação com a sensação térmica na cidade, especialmente durante eventos como a onda de calor. “A árvore é um filtro solar, regula a poluição, reforça o solo na questão hídrica. Mas é óbvio que a cidade foi feita para pessoas, e cabe a Amma mitigar isso. Não há proibição de retirada das árvores, mas tem que fazer a compensação.”

Para Ferreira, os efeitos da retirada das árvores são negativos pela redução da cobertura vegetal, elevação da temperatura, redução da umidade relativa do ar e menor contribuição na redução da poluição. “A compensação em local próximo acaba contribuindo, compensa, mas sendo em locais próximos. Mas a Prefeitura retira em locais mais quentes e a recomposição é em áreas mais periféricas”, diz. O superintendente da Amma já entende que a compensação ambiental é bem realizada na capital. “Para cada árvore arrancada tem de plantar cinco, mas lógico que não vai caber naquele mesmo lote e plantar na cidade é eficiente pelo macroclima. Para as áreas mais centrais existem os parques, que servem para manter a arborização, aquele ambiente como um todo. Essa sensação de menos árvores é porque nunca tivermos um calor tão alto.”

Plano Diretor de Arborização está na Câmara desde 2020

O projeto de lei que institui o Plano Diretor de Arborização (PDAU) está em tramitação na Câmara Municipal de Goiânia desde 2020, quando foi enviado ainda na gestão Iris Rezende (MDB) e pela segunda vez na Casa. Em setembro daquele ano, ele chegou a ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas não foi remetido à primeira votação em plenário, quando recebeu uma emenda da vereadora Gabriela Rodart (PTB) e teve de voltar à apreciação na comissão. A proposta foi incluir os jamelões e as gameleiras, junto das mongubas, para promover o programa de substituição gradativa das espécies em vias públicas. A análise na CCJ foi feita no dia 10 de maio deste ano e o plano de arborização municipal, que detém informações sobre as árvores e as diretrizes deste tema, foi a plenário cinco dias depois, com aprovação e encaminhamento à Comissão Mista, onde permanece. 

O vereador Leandro Sena (sem partido), chegou a fazer um relatório em outubro, mas houve pedidos de vistas aprovado. Novas emendas ao projeto foram inclusas e o último relatório foi emitido no dia 7 deste mês, mas ainda sem encaminhamento de apreciação na comissão. Entre as mudanças que constam no projeto está até mesmo a permissão para instalação de helipontos de uso coletivo nos parques municipais, sob a justificativa que as instalações já existem em locais de São Paulo e serviriam para o pouso destas aeronaves em casos de urgências, como do Corpo de Bombeiros e das forças policiais. 

Outra mudança é a liberação ao poder público de retirar as árvores para a realização de obras públicas, sejam elas quais forem, sem a necessidade de uma aprovação da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), conforme ocorre hoje, mas mantendo a compensação ambiental. Essa já é a segunda vez que o PDAU passa pela Casa. Em 2016, quando o prefeito era Paulo Garcia (PT), outra proposta do plano foi encaminhada, com base em um estudo técnico feito em 2007 que estimou a quantidade de 900 mil árvores na capital a partir de levantamento feito na região Central. Porém, no ano seguinte, com a troca de administração, o projeto foi pedido para ser analisado. A opção da administração Iris, à época, foi levar à Câmara um documento muito semelhante à Instrução Normativa 37, da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), de 2017, que instituiu o PDAU de forma administrativa, sem o valor de lei e sem novos estudos técnicos sobre a arborização urbana, levando em conta ainda os índices de 2007.

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