A seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO) vai apurar a atuação de um escritório de advocacia de Goiânia que está fazendo a defesa de um comerciante de 56 anos suspeito de agredir a namorada e ao mesmo tempo representando a vítima, mas neste caso fazendo com que ela atue a favor do namorado, retirando a queixa na Polícia Civil e tentando revogar a medida protetiva determinada pela Justiça.
Uma empresária de 28 anos cortou o pulso esquerdo no dia 3 de dezembro e foi levada para um hospital onde denunciou o namorado por agressão. Ela contou que se feriu como forma de escapar da casa em que vivia com o comerciante e que sabia que caso o companheiro não a levasse para o hospital poderia morrer. Segundo a vítima, o suspeito a agredia e a ameaçava, impedindo-a de ter contato com familiares. No dia do fato, ela teria levado tapas no rosto e sido ofendida de forma violenta.
No dia 6, já sob orientação do escritório de advocacia, a empresária esteve na delegacia para retirar a queixa contra o namorado. E nesta segunda-feira (9), a advogada do comerciante aparece em uma procuração como representante também da vítima em um pedido protocolado na Justiça para o arquivamento do processo e a revogação da medida protetiva.
O comerciante chegou a ser preso no dia 3, quando tentava deixar o hospital junto com a namorada, mas foi solto horas depois. Já após a intervenção da advogada, a vítima diz que sofre com transtornos psicológicos e que teve um surto no dia. Ainda segundo ela, o namorado é autorizado a impedir que nestas ocasiões ela contate familiares, principalmente a mãe, que mora em outro Estado e sofre de problemas cardíacos.
A partir de notícia veiculada pelo jornal O Popular, na noite de terça-feira (10), mostrando o caso, a OAB-GO vai instaurar um procedimento ético-disciplinar contra as advogadas que aparecem na procuração assinada pela vítima. Segundo o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB nacional e advogado criminalista, Roberto Serra, a ordem irá procurar informações no processo para verificar a informação noticiada pelo jornal.
Segundo a OAB-GO, o advogado de uma pessoa investigada por crime não pode representar, ao mesmo tempo, a vítima desse delito. “Tal conduta caracterizaria, em tese, violação do sigilo profissional e patrocínio infiel.” Em nota, são citados três pontos que podem ter sido violados por tal atitude.
Um deles é o inciso VII do artigo 34 do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) (lei federal 8.906/94), que proíbe com pena de censura conduta do advogado que viola, sem justa causa, sigilo profissional. Outro é o artigo 154 do Código Penal, que trata da revelação sem justa causa de segredo o qual se tem ciência em razão da profissão, podendo “produzir dano a outrem”.
Ainda segundo a nota, caso seja comprovada no processo a infração, também foi atingido o artigo 20 do Código de Ética e Disciplina da OAB, que proíbe a conduta daquele que defende interesses que possam conflitar e também pune com “censura” o possível infrator.
O Daqui não conseguiu contato com a advogada que aparece nas duas procurações, a do suspeito e a da vítima. Foram mandadas mensagens pelo celular e pelo e-mail da defesa. A TV Anhanguera informou em seu telejornal noturno que a advogada afirmou não ter nenhuma irregularidade no fato, mas que preferia não se pronunciar a respeito no momento.
O comerciante foi indiciado por agressão, o que impede que o processo seja arquivado mesmo que a vítima retire a queixa.