Presos sob suspeita de atacar as instituições em Brasília e não aceitar o resultado das urnas, quatro dos goianos que estão no complexo da Papuda, na capital federal, já disputaram as eleições no estado. De acordo com listas divulgadas pela Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape-DF), atualizadas no dia 30 de janeiro, há 39 goianos presos pelos ataques do dia 8 de janeiro na capital federal, sendo 29 homens e 10 mulheres. Outros 15 foram liberados com uso de tornozeleira eletrônica.
Os quatro já tentaram ser vereadores, em Goiânia, Goianápolis, Inhumas (ambas da Região Metropolitana) e Jandaia (Oeste Goiano), e um deles também se candidatou a vice-prefeito em Goianápolis. A reportagem já havia mostrado outros dois casos de ex-candidatos que participaram dos ataques às sedes dos três Poderes, no dia 8 de janeiro, segundo postagens feitas por eles próprios nas redes, mas não foram presos.
Da turma que está detida, Fabrício Nelio Feitoza, de 47 anos, pleiteou cadeira de vereador por Goiânia, em 2020, pelo DC, partido que lançou Gustavo Gayer candidato a prefeito da capital. Gayer hoje é deputado federal pelo PL. Feitoza, que foi presidente da Cooperativa de Motoristas Particulares do Estado de Goiás e fez campanha como representante dos condutores de serviços de aplicativos, teve 370 votos e ficou em 301º lugar na briga pelas 35 cadeiras.
Duarte Irias Franco Queiroz, 39, também foi candidato em 2020, a vice-prefeito de Goianápolis (a 40 quilômetros da capital), pelo Pros, na chapa de Marcio Carretel (PDT). A chapa ficou em sexto lugar, com apenas 87 votos. Duarte também havia sido candidato a vereador da cidade em 2008, pelo PRB.
Pelas redes sociais, ele postou vídeo de Brasília no dia 1º de janeiro afirmando que “a luta não terminou”. “Estamos firmes na resistência civil. Estamos aqui até o último soldado voltar para casa”, diz Duarte. Antes disso, em dezembro, ele mostrou imagens do acampamento dos bolsonaristas em Goiânia. Duarte também compartilhava mensagens religiosas e repostagens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O ex-candidato é servidor do município de Goianápolis, na função de operador de motoniveladora da Secretaria de Obras, Serviços Urbanos e Rurais. No Portal da Transparência do município, a informação é que ele é alvo de processo administrativo por abandono de serviço. Por isso, está afastado desde 1º de dezembro. O salário dele é de R$ 2,9 mil, calculado pela média dos valores pagos no ano passado.
Romeu Alves da Silva, 49, tentou cadeira na Câmara de Inhumas (a 48 quilômetros de Goiânia) em 2008 e 2016, as duas vezes pelo PTdoB. Na mais recente, teve 61 votos. Foi assessor parlamentar na Casa e conselheiro da Criança e Adolescente, segundo informações do perfil dele nas redes sociais.
Romeu compartilhou imagens dos detidos no ginásio da Polícia Federal em Brasília. “Estão todos aqui de cabeça erguida”, diz, para então acusar “provas criminosas” contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.
Wilson Fernando Gomes, 52, policial militar reformado, tentou ser vereador de Jandaia em quatro eleições (2004 a 2016), como Soldado Gomes - duas vezes pelo PSDB e as últimas duas pelo PDT.
Na campanha de 2012, ele foi denunciado pelo Ministério Público Eleitoral por um suposto esquema de abuso de poder econômico. Segundo o MPE, o então candidato a prefeito do PDT ofereceu carros e dinheiro em troca de apoio de vereadoriáveis. Gomes entrou na lista de quatro candidatos que teriam aceitado a oferta.
Segundo o Portal da Transparência do Estado de Goiás, Gomes recebe R$ 7 mil de salário como PM reformado. Na redes sociais, o perfil dele tem uma bandeira do Brasil em que se lê “Censura e Regresso”.
Defesas
Soldado Gomes foi reformado em 2001 por ser considerado “incapaz definitivamente para o Serviço Policial Militar”, por questões psiquiátricas. A defesa dele em outra ação, na área cível, diz estranhar que ele esteja preso, mas não soube informar os advogados dele que atuam no caso dos ataques em Brasília. A reportagem tentou contato por meio de todos os telefones disponíveis nos registros de candidatura, mas não conseguiu localizar familiares nem assessores de Gomes.
A reportagem também buscou o posicionamento da defesa dos outros três ex-candidatos, por meio dos números informados à Justiça Eleitoral, por contatos de advogados ou por telefones de familiares, mas não conseguiu respostas.
Duarte tem um advogado de Goiânia como representante no inquérito de atos terroristas em Brasília, segundo informações do processo. A reportagem entrou em contato com o escritório dele, cuja atendente informou que daria retorno, o que não ocorreu.
O advogado de Fabrício Feitoza é do Tocantins, mas o número de telefone fixo informado não atendeu. A defesa do ex-candidato em outra ação disse não saber do representante na área criminal. A reportagem conseguiu o telefone da mulher de Fabrício, mas ela também não atendeu.
A reportagem não conseguiu contato do advogado de Romeu Alves. O telefone informado no registro de candidatura foi informado como inexistente.
Participantes
A reportagem havia mostrado que João Paulo Cavalcante, que foi candidato a deputado estadual em Goiás em 2018 pelo antigo PSL e a vereador de Goiânia pelo DC em 2020, gravou vídeos durante os ataques do dia 8 em Brasília afirmando que “o Brasil faz história”. Nas imagens, os vândalos sobem a rampa do Congresso.
Cavalcante teve 2.807 votos para deputado e 1.523 para vereador. Fundador de um dos grupos de WhatsApp em que bolsonaristas divulgam informações falsas e teorias conspiratórias sobre a democracia brasileira, ele disse à reportagem que defendia protestos pacíficos e que não imaginava que haveria vandalismo.
Mário Celso Abrantes Curado, que disputou a eleição para vereador pelo antigo PFL (depois DEM e agora UB) em Corumbá de Goiás (Entorno do Distrito Federal) em 2004, foi afastado do cargo de oficial de Justiça da comarca da cidade por conta da participação nos atos em Brasília. A decisão ocorreu no dia 13 de janeiro pelo juiz Marcos Boechat Lopes Filho, que determinou também a criação de uma comissão de sindicância para apurar o caso. O servidor apareceu em um vídeo dentro de um ônibus, a caminho de Brasília, com defesa dos atos antidemocráticos.
Ações anteriores
Além de Gomes, um outro nome da lista já foi alvo de ação movida pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO). Trata-se de Lucélia Maria Ferreira da Silveira, de Catalão (Sudeste Goiano), que trabalhava para um vereador e foi acusada, junto com ele, de empregar servidora fantasma na Câmara e reter parte do salário dela.
Lucélia era administradora da Igreja Pentecostal Rosa de Saron em Catalão, mas o estabelecimento aparece como inativo no site da Receita. Ela também aparece no Portal da Transparência do município como servidora inativa. No telefone que aparece como contato da igreja, um escritório de contabilidade informou não ter conhecimento a respeito dela e da igreja. A reportagem também não conseguiu contato em uma outra empresa de que Lucélia é dona.
Nove nomes da lista de presos de Goiás receberam auxílio emergencial do governo federal, segundo dados do Portal da Transparência.
Embora o GDF informe que os presos são de Goiás, a reportagem encontrou dados que apontam que pelo menos oito moram em Brasília. A Seape não informou se consideram o local de nascimento dos presos ou se há possíveis erros nas listas divulgadas no site.
Há ainda dados que apontam três moradores do Tocantins, dois de Mato Grosso e um de Minas Gerais. A reportagem encontrou informações de sete moradores de Goiânia, um em Trindade, um de Quirinópolis e um de Águas Lindas de Goiás. Na relação, a reportagem identificou pelo menos quatro dos presos que possuem empresa - dois em Goiânia, um em Trindade e um em Quirinópolis.
Prisões
No dia 20 de janeiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) informou que o ministro Alexandre de Moraes havia concluído a análise de 1.406 custodiados, decidindo pela conversão da prisão em flagrante em preventiva de 942 pessoas. Outras 464 obtiveram liberdade provisória, com uso de tornozeleira eletrônica. Todos os nomes foram divulgados pelo Supremo e pela Seape e estão disponíveis nos sites oficiais.
As mulheres presas estão na Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF) e os homens no Centro de Detenção Provisória II (CDPII), no Complexo da Papuda.
Depois da análise do dia 20, houve outras prisões de envolvidos nos ataques, em sucessivas fases da Operação Lesa Pátria, determinadas por Moraes. A última atualização do site da Seape é do dia 30 de janeiro, às 11 horas.
Goianos presos
Detidos por suposta participação em atos terroristas em Brasília, segundo listas divulgada pelo GDF
- Presos preventivamente
Homens
ADRIANO MARINHO STEFANI
CARLOS ANTONIO SILVA
DALVIDES AIRES DOS SANTOS
DIVÂNIO NATAL GONÇALVES
DUARTE IRIAS FRANCO QUEIROZ
EDER APARECIDO JACINTO
EDIMAR MACEDO E SILVA
ERLANDO PINHEIRO FARIAS
FABRICIO NELIO FEITOSA
GIBRAIL PEREIRA DE SOUZA
HELIO DE SOUZA MATOS
JESSE LANE PEREIRA LEITE
JOÃO BATISTA BORGES CORRÊA
JOÃO SIRQUEIRA ARAÚJO
JOSÉ MARTINS DE MOURA JÚNIOR
JOSE RAIMUNDO MUNIZ SILVA
JULIO CEZAR BATISTA MENDES
LAURO HENRIQUE SOUZA XAVIER
LUIS CARLOS DA SILVA
MARCOS LUIZ DE SOUZA
MARCOS ROBERTO BARRETO
NELSON FERREIRA DA COSTA
PAULO CESAR RODRIGUES DE MELO
ROBINSON LUIZ FILEMON PINTO JUNIOR
ROMEU ALVES DA SILVA
RONALDO RIBEIRO DO VALE
THIAGO TELES DE TOLEDO
WELYSON DEYLER AMARAL DOS SANTOS
WILSON FERNANDO GOMES
Mulheres
ADRIANA CAMARGO DA SILVA LEMES
EDNA APARECIDA DE ARAUJO FRADE
ELISANGELA MARIA DE JESUS MOURA
GEISSIMARA ALVES DE DEUS
LUCELIA MARIA FERREIRA DA SILVEIRA
MARIA APARECIDA LIMA ALENCAR
MARIA GOMES DA SILVA
ROSANA MACIEL GOMES
SARAH GABRIELA OLIVEIRA MESQUITA
ZILDA ANTONIO DE JESUS
- Liberados com uso de tornozeleira eletrônica
ARTHUR ANDRE SILVA MARTINS
DONIZETE PAULINO DA PAZ
FERNANDO BATISTA LEMES
IGOR DIVINO DUARTE MENEZES
JOSÉ CARLOS MARTINS
KARINE DE PAULA SILVA MARTINS
LUIS CARLOS DE SOUSA FERREIRA
MARCILENE GAMA NUNES
MIGUEL CARLOS VENANCIO
PAULO ALVIS DOS SANTOS
REGINA APARECIDA SILVA
ROSÁRIO LUCAS PEREIRA
ROZILEIS DOS SANTOS CUNHA
SALETE COSTA APARICIO
VERANIR ROSA RODRIGUES
Fonte: Site da Secretaria de Administração Penitenciária do Governo do Distrito Federal (atualizada em 30/01/2023)