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Relator deixa pagamentos de precatórios da educação fora do teto de gastos para tentar aprovar PEC

Fernando Bezerra

O relator da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios e líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), apresentou uma nova versão do texto nesta terça-feira (30) e, numa derrota da equipe econômica, sugeriu que os pagamentos de precatórios ligados ao Fundef (fundo da área de educação) não sejam contabilizados dentro do teto de gastos --regra que impõe um limite para as despesas.

As alterações acontecem em um momento de grande pressão das maiores bancadas sobre o relator, que colocavam mesmo em risco a aprovação do texto na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), em caso de resistência a promover as alterações.

O governo tem cedido em diversos pontos da PEC dos Precatórios no Senado para tentar aprovar o texto ainda nesta semana. A proposta viabiliza o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400.

A retirada dos precatórios do Fundef do teto dos gastos era uma demanda em particular do PSD, segunda maior bancada do Senado, com 12 senadores. Um dos mais ferrenhos defensores da medida era o senador Otto Alencar (PSD-BA).

Precatórios são dívidas da União que já foram reconhecidas pela Justiça (não cabe mais recurso). Para 2022, há cerca de R$ 16 bilhões em de dívidas de repasses do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) para Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas. A PEC parcela essa conta em três anos.

O texto da PEC deve ser votado na tarde desta terça pela CCJ. É necessário apenas maioria simples para que a proposta recebesse o aval da comissão, mas o governo quer garantir margem segura para a votação da PEC no plenário, onde precisa do apoio de 49 dos 81 senadores, em dois turnos de votação.

Mais cedo, na manhã desta terça, Bezerra já havia promovido alterações em seu texto, para atender demandas das principais bancadas do Senado, em particular do MDB e do PSD.

A PEC dos Precatórios é hoje a principal pauta de interesse do presidente Jair Bolsonaro no Congresso. Ela autoriza o governo a gastar mais e viabiliza promessas do governo na área social, como o aumento no Auxílio Brasil, que buscam dar impulso a Bolsonaro na campanha à reeleição em 2022.

Para ampliar em cerca de R$ 106 bilhões as despesas do próximo ano, a PEC tem dois principais pilares.

Uma medida permite um drible no teto de gastos, fazendo um novo cálculo retroativo desse limite. A outra medida cria um valor máximo para o pagamento de precatórios, que são dívidas da União reconhecidas pela Justiça.

Apesar do valor vultoso a ser acrescentado nas despesas de 2022, o espaço orçamentário não é suficiente para bancar todas as promessas de Bolsonaro, como auxílio financeiro a caminhoneiros e reajuste salarial a servidores públicos federais.

A primeira versão do relatório de Bezerra foi apresentada na semana passada, mas houve um pedido de vistas de diversos partidos, para que a proposta apenas fosse votada nesta terça. Os partidos com bancadas mais numerosas chegaram inclusive a ameaçar impor uma derrota ao governo, se não houvesse mudança.

"Não estamos concordando com a forma que está sendo construído esse auxílio", disse o senador José Aníbal (PSDB-SP), que integra o grupo articulador de uma proposta alternativa à PEC do governo. A ideia, que tem apoio de outros partidos, como o Podemos, não agrada a equipe do ministro Paulo Guedes (Economia), pois tira as despesas com precatórios do teto de gastos.

Ao longo dos últimos dias de negociação, Bezerra havia dito que estava confiante com a aprovação na CCJ, mas já previa uma votação apertada. O líder do governo no Senado chegou a prever nesta terça inclusive um placar mais pessimista do que vinha afirmando na semana passada, com 14 ou 15 votos a favor - chegou a falar em 17 na semana passada.

Bezerra quer pedir ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para que a PEC vá a votação no plenário do Senado ainda nesta terça-feira (30)

A nova versão apresentada pelo relator nesta terça visa atender a pedidos de senadores e de governadores. O objetivo é reduzir as críticas à PEC, que precisa de amplo apoio no plenário.

Uma das mudanças flexibiliza as regras para estados que renegociaram dívidas com a União e acabaram descumprindo o acordo de não romper o teto de gastos estadual.

"Não é assunto da PEC dos Precatórios, mas é uma demanda que foi solicitada pelos senadores", afirmou Bezerra.

A emenda permite que esses estados possam restituir a União ainda pelo prazo mais longo (benefício da renegociação da dívida) desde que adotem medidas de controle de gastos, como impedir aumento salarial a servidores, barrar a realização de concursos e vedar a criação de novas despesas obrigatórias.

O relator afirma que não haverá prejuízo financeiro para a União. "Seu impacto é neutro para a União, porque os recursos lhes serão devolvidos com encargos de adimplência", afirma o senador.

No novo relatório, o texto foi alterado para que novos aumentos a serem concedidos no valor do Auxílio Brasil e no número de famílias atendidas pelo programa só sejam liberados após o Executivo apresentar uma medida compensatória (criação de novos impostos ou corte de despesas).

Na semana passada, o líder do governo incluiu uma brecha para que o Auxílio Brasil se torne um programa social permanente, como defendem líderes do Senado, e livra o governo de encontrar uma medida que compense o aumento de gastos nessa área.

Na avaliação de economistas e técnicos do Congresso, isso representa um drible na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), que exige a compensação quando o governo tiver um novo gasto permanente.

Inicialmente, o governo previa elevar o benefício do Auxílio Brasil dos atuais R$ 224 para R$ 400 mensais apenas entre dezembro de 2021 a dezembro de 2022. Como a medida teria caráter temporário, não seria necessário encontrar uma medida compensatória.

O Senado, porém, pressionou para que o programa no valor de R$ 400 seja permanente. Por isso, o governo teve que buscar uma solução para viabilizar a medida no próximo mês sem precisar aprovar um projeto de aumento de imposto ou de corte de despesas.

"Com isso [mudança no texto nesta terça], novos aumentos futuros dos valores dos benefícios do Programa Auxílio Brasil precisariam indicar como fonte de custeio a redução permanente de despesa ou o aumento permanente de receita", afirmou o relator.

Outra mudança feita por Bezerra foi deixar claro que o limite previsto na PEC é para o pagamento de precatórios. No texto anterior, estava escrito que o limite seria para a expedição de precatório, mas esse ato (que gera a dívida a ser quitada pela União) é do Judiciário. Portanto, haveria uma trava à atuação do Judiciário, e não ao valor a ser pago no ano.

Bezerra também incluiu um prazo de 90 dias para o início de vigência dos termos previstos na PEC, para a regulamentação de aspectos operacionais do acerto de contas entre União e os credores privados.

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