A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) de Goiás já contratou cerca de 50 psicólogos para fazerem o atendimento dos alunos da rede. A contratação faz parte das medidas anunciadas diante do pânico causado pelas ameaças a escolas em abril deste ano. A pasta promete finalizar a contratação de um total de 83 psicólogos e 40 assistentes sociais até o final de julho. Os profissionais vão fazer atendimentos itinerantes nas escolas a partir de agosto deste ano.
Segundo a Seduc, a partir do primeiro dia de aula do segundo semestre, que será no dia 1º de agosto, os estudantes da rede terão acesso ao serviço. Os profissionais farão o atendimento itinerante de forma diária, com a produção de relatórios mensais. A pasta destaca que o atendimento não será clínico, mas que os profissionais também estarão à disposição de forma online caso algum estudante ou profissional necessite.
Reportagem do DAQUI publicada em maio de 2023 já havia apontado que a assistência psicológica começaria em agosto deste ano. Na ocasião, um mês após o anúncio das medidas diante das ameaças, apenas o uso de detectores de metais havia sido implementado nas unidades de ensino da rede estadual de Goiás.
A doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Urbano pela Universidade de São Paulo (USP), Paola Carloni, explica que as diferentes áreas da psicologia desenvolvem funções distintas. “O psicólogo na escola não faz clínica. Ele faz psicologia escolar. Quanto a ser itinerante, não tem problema. Se houver demanda clínica, o estudante precisa ser encaminhado. Daí, precisa ter uma espécie de acordo entre a escola e a rede pública de Saúde para acolher esses encaminhamentos”, esclarece.
Formação
De acordo com a Seduc, todos os profissionais que serão contratados irão passar por uma formação, que se trata de um treinamento da metodologia do material pedagógico que será utilizado e implementado nas escolas. Aqueles que já foram contratados, já passaram por um curso presencial e ao longo deste mês irão cursar uma outra etapa de forma online.
Paola aponta que a existência de uma formação é fundamental, especialmente no que se refere ao combate às violências escolares. “É comum que o estudante (de psicologia) se empenhe em uma área de formação e, nesse sentido, não estuda tanto as outras áreas. A psicologia escolar não é uma disciplina obrigatória em todos os cursos de psicologia. Por isso, tem que ter uma formação não só sobre a forma que eles (representantes da Seduc) querem que o psicólogo atue, mas fundamentalmente sobre o que faz um psicólogo escolar”, destaca.
Outras medidas
No dia 11 de abril, a Seduc publicou a portaria 1.867, que permitiu a revista dos alunos. Já no dia 19, foi aprovada a lei 21.881/23, que instituiu a Política Estadual de Prevenção e Combate à Violência Escolar. Os textos preveem uma série de medidas como, por exemplo, o reforço do patrulhamento escolar, a instalação de detectores de metais e câmeras de segurança, prestação de serviços de psicologia e assistência social a alunos e professores, responsabilização das redes sociais que permitam publicações com discurso violento e, também, dos pais e responsáveis de menores de idade que incitem ataques a escolas.
Logo após o pânico causado pelo temor de ataques, o patrulhamento escolar foi reforçado. Entretanto, em reportagem publicada em maio, servidores da rede apontaram que o serviço sofreu arrefecimento nas semanas seguintes ao período crítico. A Seduc já possuía programas de prevenção ao bullying e de discursos de ódio previamente às medidas.
A Seduc encaminhou R$ 1,8 milhão aos Conselhos Escolares para a compra de detectores de metais em todas as 999 unidades de ensino da rede estadual. A orientação foi de adquirir um equipamento a cada 150 alunos. A revista é feita pelos próprios coordenadores de turno. De acordo com a pasta, o primeiro semestre do ano letivo foi finalizado com o funcionamento pleno dos detectores de metais e das câmeras de videomonitoramento interno das unidades, que já existiam em parte das escolas estaduais.
Goiás registrou 1,3 mil ocorrências de ameaça
Goiás registrou 1,3 mil ocorrências de ameaça no ambiente escolar nos primeiros seis meses de 2023, uma média de sete denúncias por dia. Ao todo, 217 pessoas foram ouvidas em inquéritos policiais. De acordo com a Secretaria de Estado de Educação (Seduc), o período de férias tem sido usado para aprimorar a gestão de risco nas unidades de ensino. Os dados são das forças de segurança do Estado e foram fornecidos ao Portal Nacional da Educação.
No dia 13 de abril deste ano, um garoto, de 13 anos, esfaqueou três colegas de sala, em Santa Tereza de Goiás, no Sudoeste do Estado. O ato ocorreu dias depois de um homem, de 25 anos, invadir uma creche em Blumenau, Santa Catarina, matar quatro crianças e ferir outras cinco poucos dias antes. Após os incidentes, as forças policiais de Goiás intensificaram ações contra atos violentos.
No dia 19 de abril, em entrevista à CBN Goiânia, o titular da Secretaria de Estado de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO), o coronel Renato Brum, contou que em uma semana 55 adolescentes foram apreendidos por incitar ou ameaçar ataques em escolas por meio das redes sociais em Goiás. Reportagem do DAQUI publicada no dia 20 de abril mostrou que 18 adolescentes foram apreendidos e internados provisoriamente por ameaça de atentado em Goiás.
A pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Criminalidade e Violência (Necrivi) da Universidade Federal de Goiás (UFG), Cinthya Zortéa, explica que os dados jogam luz sobre o histórico de violência no País, que na interpretação da especialista foi agravado com o fim da pandemia da Covid-19. “No período apontado é preciso considerar o isolamento social compulsório, o uso indiscriminado da internet por jovens, em acesso a ambientes disseminadores de violência, bem como a polarização política e social. Os números são alarmantes. A intervenção por operações de segurança revelou ações emergenciais e trouxe ao debate a necessidade de formulação de políticas públicas perenes de enfrentamento ao problema”, esclarece.
Cinthya considera que as medidas adotadas foram necessárias naquele momento, mas considera que a articulação do enfrentamento do problema de violência nas escolas perpassa por uma conjugação de esforços, objetivando a implementação de espaços seguros e humanizados. “Os aparelhos detectores de metal e as câmeras são suportes importantíssimos, mas não coíbem as causas multifatoriais atinentes às questões dos conflitos humanos, dos problemas de desrespeito nas relações entre professor e aluno, das violências sofridas em casa. É preciso prevenção e uma série de ações sistêmicas e transversais, no bojo da educação, saúde, segurança e assistência social”, finaliza.