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Seis escolas cívico-militares de Goiás vão passar para a PM

Wildes Barbosa
Escola Estadual Cívico Militar Profª Lourdete de Fátima de Paiva Sutir enfrentou resistência quando houve a transição para o modelo atual, que será descontinuado em Goiás

As seis Escolas Estaduais Cívico-Militares (EECims) de Goiás irão virar Colégios Estaduais da Polícia Militar de Goiás (CEPMGs) a partir de 2023.O governo de transição do presidente eleito, Lula (PT), já anunciou que pretende acabar com a iniciativa promovida por Jair Bolsonaro (PL). 

A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) de Goiás argumenta que a mudança se justifica pelo desejo da comunidade e pelo fato de o governo estadual já arcar com a maioria das despesas das unidades de ensino. 

“O governo estadual já supre praticamente todas as necessidades dessas escolas. Elas recebem verbas assim como todas as outras unidades da rede estadual. Agora, ainda existe esta incerteza sobre a continuidade do programa. Como tivemos uma boa aceitação do modelo, decidimos transformá-las em CEPMGs”, explica o coronel Mauro Vilela, superintendente de Segurança Escolar e Colégio Militar da Seduc. 

O programa nacional das EECims foi lançado em setembro de 2019, como uma das principais bandeiras de Bolsonaro para a Educação. A promessa era de que o governo federal faria investimentos como a aquisição de fardas e melhorias na infraestrutura. Entretanto, Vila aponta que uma série de acontecimentos impediu o andamento pleno do projeto em Goiás. 

“Em 2019, fizemos uma série de reuniões sobre o assunto. Em 2020, veio a pandemia da Covid-19 e tudo parou. Depois, tivemos três mudanças do ministro da Educação. Com isto, as conversas foram se perdendo ao longo do tempo, apesar de termos retomado isso recentemente. Mesmo assim, o governo estadual tomou a frente e adquiriu, por exemplo, as fardas da EECim de todos os alunos de Santo Antônio do Descoberto”, esclarece Vilela.

O superintendente afirma que alguns investimentos prometidos pelo governo federal, como a construção de quadras, não foram feitos. “Entregaram outras coisas como unidades de ar condicionado, kits escolares, murais, dentre outros. Nós entramos com a maior parte, principalmente por meio do Equipar e do Reformar (programas do governo estadual para fazer melhorias estruturais nas escolas)”, diz. 

EECims
Para se tornar uma EECim, a escola deveria cumprir alguns critérios. Era necessário estar localizada na capital ou região metropolitana, ser uma unidade em situação de vulnerabilidade, ter nota baixa no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), ter ensino fundamental II e/ou ensino médio, ter a aprovação da comunidade para a implantação do modelo e atender, preferencialmente, entre 500 e mil alunos.
 
Em Goiás, as seis unidades de EECims estão localizadas em áreas vulneráveis do Entorno do Distrito Federal. Uma sétima escola seria aberta em Cidade Ocidental, mas o processo foi paralisado justamente por conta dos entraves no andamento do projeto federal. A EECim Céu Azul, em Valparaíso de Goiás, foi a escola piloto da iniciativa no estado. O local foi onde o coordenador de turno Júlio César Barroso de Sousa, de 41 anos, foi morto com dois tiros por um estudante de 17 anos da unidade em abril de 2019. 

Aceitação 
Vilela conta que apesar de uma certa resistência inicial em alguns locais, as escolas tiveram uma boa aceitação das comunidades. “Como essas unidades estão inseridas em locais com uma mancha criminal alta, as mudanças na dinâmica desses bairros foram grandes. Nós fazemos um trabalho chamado de cinturão de segurança, com o patrulhamento constante em toda área próxima da escola. Com isso, a criminalidade diminui.”

O EECims Céu Azul responde para a regional de Educação de Novo Gama. A coordenadora da regional, Carla Moreno, explica que quando a escola foi implantada, alguns estudantes resistiram. “A situação era complexa. Tínhamos alunos que escondiam drogas no muro da escola. Com a vinda da escola cívico-militar, alguns optaram por sair como, por exemplo, traficantes que estavam matriculados na unidade.”

A coordenadora da regional de Educação de Planaltina, Dinalva Ferreira, revela que, em 2021, quando o antigo Colégio Estadual Complexo 10 se tornou a EECim Professora Lourdete de Fátima Sutir, também houve uma resistência inicial da comunidade, até mesmo de professores. “Não é todo que se adequa às regras e, por isso, ficaram receosos. Levou um tempo.”

Entretanto, as duas coordenadoras concordaram que a situação mudou e as escolas apresentaram melhorias do ponto de vista do ensino e pedagógico. “Aqui, quando eles notaram que a nova organização resgatou os valores do bairro e da escola, todos ficaram encantados”, conta Dinalva. “Para esta escola, a mudança veio no momento certo. Precisávamos disso. Acredito que com a transformação em CEPMGs esses benefícios serão consolidados.”

O principal diferencial das EECims em relação aos colégios militares é a gestão. De acordo com o programa do governo federal, as EECims são aquelas em que militares da reserva participam da gestão e da organização da escola, embora a direção continue a cargo de civis. Entretanto, em Goiás, isso não chegou a acontecer. “Nós conversamos com o Ministério da Educação (MEC) e eles permitiram que, desde o início, a direção fosse feita por militares”, destaca Vilela. 

Por isso, o superintendente acredita que, na prática, não existirão grandes mudanças quando as EECims se tornarem CEPMGs. “A farda é diferente. Entretanto, os alunos não terão de comprar nada, pois a partir de 2023 nós iremos fornecê-la para todos os estudantes de colégios militares. Uma disciplina também sofrerá alteração. Nas EECims temos o Projeto Cidadão. Já no CEPMGs a disciplina é Cidadania e Civismo.”

Com a transformação das seis EECims em CEPMGs, o número de colégios com este perfil em Goiás saltará de 64 para 70. Vilela relata que a parte técnica e documental da mudança está sendo acelerada para conseguir ser concluída até janeiro, antes do início do próximo ano escolar. “O Comando de Ensino vai absorver essas unidades. Já publicamos um edital e os militares que quiserem trabalhar nestas escolas têm até a próxima segunda-feira (12) para demonstrar interesse. Posteriormente, todos irão passar por entrevista, junta médica e teste de aptidão.”

 

Desempenho de unidades no Ideb de unidades varia

As notas do Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico (Ideb) das seis Escolas Estaduais Cívico-Militares (EECims) de Goiás foram variadas quando comparados os anos de 2019 e 2021. Enquanto três delas tiveram um desempenho pior, outras três, que não foram avaliadas três anos atrás por falta de quórum de estudantes, registraram notas em 2021. 

As escolas que tiveram uma piora no desempenho foram: EECim Maria D’Abadia Meireles Shinohara, em Luziânia, EECim Professor José Monteiro Lima, em Padre Bernardo, e EECim Professora Lourdete de Fátima Sutir, em Planaltina. Nas escolas de Luziânia e Padre Bernardo, a 3ª série não foi avaliada por falta de quórum dos estudantes das unidades. 

O superintendente de Segurança Escolar e Colégio Militar da Secretaria de Estado de Educação (Seduc) de Goiás, coronel Mauro Vilela, explica que no caso da EECim de Luziânia, o período de adaptação que a escola estava enfrentando teve impacto na nota do Ideb. 

No caso das EECims de Padre Bernardo e Planaltina, ainda não foi possível ver os resultados positivos da mudança para uma escola cívico-militar, já que ela ocorreu no início do segundo semestre de 2021. “Não deu tempo. Existe um período de adaptação. A prova do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) foi realizada no fim do ano”, argumenta.

Já as EECims de Águas Lindas, José Elias de Azevedo, em Santo Antônio do Descoberto, e Céu Azul, Valparaíso de Goiás, registraram notas no Ideb depois de não terem sido avaliadas em 2019 por falta de quórum de estudantes. Entre as 3ª séries, a menor nota foi da EECim Céu Azul, que tirou 3,9 e abaixo da média nacional de 4,2. Em relação ao 9º ano, as três unidades tiraram nota 4,6, que também é menor do que a média nacional de 5,1. 

Entretanto, Vilela esclarece que o fato dessas escolas terem conseguido formar um quórum para a prova, já é um avanço em relação ao cenário anterior. A coordenadora da regional de Educação de Novo Gama, que é responsável pelo EECim Céu Azul, concorda. “Isso significa que os meninos estão frequentando mais a escola. Vemos isso na prática. Lá, em 2019, eu tinha em torno de 800 matriculados. Atualmente, são 1,2 mil”, aponta Carla Moreno.

Mesmo com uma nota mais baixa no Ideb, a coordenadora da regional de Educação de Planaltina, Dinalva Ferreira, avalia que a mudança de uma escola regular para uma escola cívico-militar foi boa do ponto de vista pedagógico. “Eu já fui gestora desta unidade e quase todos os meses perdíamos um estudante morto lá na porta. A escola estava esvaziada. Hoje, a escola está cheia.”

 

Estudantes apontam melhorias

Estudantes da Escolas Estaduais Cívico-Militares (EECim) Professora Lourdete de Fátima Sutir, em Planaltina, consideram que a mudança de uma escola regular para uma escola cívico-militar foi positiva. “Antes não tinha nenhuma organização de forma correta. Até havia regras, mas elas não eram cumpridas corretamente. A mudança foi gigante”, relata a estudante da 1ª série do ensino médio, Larissa de Jesus, de 16 anos, que estuda na unidade há cinco anos. 

Larissa conta que quando a escola era uma unidade regular de ensino, toda semana ocorria algum problema entre alunos da instituição. “Melhorou bastante. Existem normas que estão sendo cumpridas. Não tem mais aqueles transtornos diários. Nosso bairro também melhorou bastante depois da chegada da escola aqui. Os roubos, assaltos e mortes diminuíram.”

No que diz respeito a qualidade da educação, a estudante também percebeu melhorias. “Nosso lanche e os banheiros estão melhores. Também sempre temos palestras com os policiais”, lembra. 

O estudante da 1ª série do ensino médio Fagner Silva, de 17 anos, chegou à escola há um ano e se sente seguro na unidade. “Tem hora certa para entrar. Quando o aluno está doente, só o pai e a mãe podem autorizar a saída. O pai sabe onde o filho está.” 

Ambos acreditam que a mudança de uma EECim para um Colégio Estadual da Polícia Militar de Goiás (CEPMG), em 2023, trará benefícios. “A disciplina será bem maior, mas vai ser por uma boa causa. Espero que a cada dia que passe, fique cada vez melhor”, pontua Luana. “Eu espero que a escola ganhe mais estrutura, espaços para termos nossos momentos de tranquilidade e ambientes mais confortáveis”, diz Fagner. 

O gestor da instituição, coronel Josué Cardoso, afirma que atualmente a unidade conta com 560 alunos e que o intuito da gestão é ser interativa e dinâmica. “Fizemos um treinamento com os professores e tentamos sempre trazer a comunidade para dentro da escola e formar um diálogo com ela. Além disso, também sempre contamos com o apoio dos órgãos públicos como o Conselho Tutelar e o Ministério Público.”

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