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Setor Marista em Goiânia ganhou mais de 1,1 mil imóveis só em um ano

Wesley Costa
Vista aérea do Setor Marista: novo Plano Diretor indica redução no potencial de expansão do bairro já no próximo ano. Especialistas preveem crescimento nos bairros vizinhos

Em um ano, o Setor Marista, bairro nobre da Região Sul de Goiânia, teve um aumento de 819 residências e de outros 361 imóveis comerciais, se tornando o que mais cresceu em urbanização na cidade de acordo com o cadastro imobiliário da Secretaria Municipal de Finanças (Sefin). Os números mostram uma tendência de valorização do bairro e indicam que a mudança nas leis urbanísticas, com a aprovação do novo Plano Diretor (PD) no ano passado, criou uma “corrida” para a aprovação de projetos e construções no bairro.

Isso porque o Setor Marista foi alvo de protesto de alguns de seus moradores durante a tramitação da lei que modificou o PD, entre os anos de 2020 e 2021, com o objetivo de impedir o adensamento no local. O argumento utilizado, na época, era de que o bairro foi criado com características residenciais, ruas curtas e áreas verdes, de modo que a ocupação dos lotes e casas para erguer grandes empreendimentos levaria à perda da característica. A possibilidade de que os prédios fossem proibidos fez com que as construções aumentassem no período, além do fato do bairro já estar entre os mais requisitados da cidade.

Vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), a arquiteta e urbanista Janaína de Holanda reforça que o Marista já tinha uma pressão por ocupação desde o Plano Diretor anterior, aprovado em 2007, que serviu como garantia para o adensamento do bairro. “Os números podem refletir nisso sim, porque ainda há muitos terrenos no Marista. E os lotes lá são grandes, porque eram de casarões, que ocupavam mais de um lote, então uma casa ali já pode virar um prédio. Tudo isso contribuiu para esse crescimento”, avalia a urbanista. De 2022 para 2023, o bairro foi o segundo que mais deixou de ter lotes não edificados, com 138 áreas que passaram a ter construções.

Segundo o PD anterior, o bairro, que possui um total de 126 quadras, tinha 94 delas classificadas como adensáveis, ou seja, que permitiam a inserção das maiores construções possíveis na cidade. Com o novo Plano Diretor, e sem que a reivindicação dos moradores fosse adiante, outras 15 quadras tiveram ao menos parte inseridas entre aquelas com a possibilidade de receber grandes empreendimentos. Janaína lembra ainda que a corrida dos empreendedores para a aprovação de projetos e início das construções já é tradicional com a proximidade das mudanças nas leis urbanísticas. Válido lembrar que é o PD quem define as áreas na cidade em que os tipos e os tamanhos das construções são definidos.

Atualmente, o Marista possui 10.331 imóveis residenciais, sendo o sexto da capital em número absoluto no cadastro imobiliário. O primeiro colocado ainda é o Setor Bueno, com 43.581 residências, seguido pelo Setor Oeste (24.117) e o Jardim Goiás (18.310). Quanto aos imóveis comerciais, o Marista é quinto com mais inscrições, somando 4.468 imóveis. Neste quesito, o maior número também é do Bueno, que possui 6.974 inscrições nesta categoria, e a segunda colocação é do Setor Central (5.937).

O superintendente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário em Goiás (Ademi-GO), Felipe Mellazo, entende que o crescimento do Setor Marista, de acordo com os dados do cadastro imobiliário da cidade, é uma conjunção de dois fatores. O primeiro, de fato, é a mudança no PD, pois para ele há uma redução no potencial de expansão do setor com as novas regras aprovadas, o que fará com que se tenha um crescimento de menor potencial no Marista já no próximo ano. “A partir do ano que vem vamos ver uma redução no Marista já e passar a ter um crescimento nos bairros vizinhos.”

O outro fator para Mellazo é o potencial já conhecido do setor, considerado um dos bairros mais nobres da cidade, com localização privilegiada e a presença das áreas verdes, como o Parque Areião. No entanto, ele acredita que no próximo ano os bairros que mais terão crescimento serão o Jardim América, Serrinha e Pedro Ludovico. Janaína concorda que haverá essa mudança. “Esses resultados são da corrida da mudança do Plano Diretor, ainda não entraram os projetos já com a nova lei. A tendência é ir para o Jardim América, que possui estoque alto de lotes, e a mancha da expansão vai espalhando, mas colada nos bairros já conhecidos”, explica.

Para a urbanista, o crescimento tem o ponto positivo na visão do mercado pelo lucro privado com as construções, mas que o impacto coletivo na infraestrutura deve ser levado em conta, sobretudo quando pensado no planejamento urbano. “As ruas no Marista estão todas esburacadas, porque elas foram projetadas para um trânsito local e agora tem um prédio lá, ou seja, com mais moradores do que foi projetado. Esse custo é coletivo, é o esgoto, a drenagem, o asfalto e não está sendo pensado quando ocorre esse crescimento.” Ela diz que os instrumentos urbanísticos, como a outorga onerosa, devem ser usados para os investimentos em infraestrutura. A outorga é uma taxa paga pelo empreendedor para a prefeitura para ter o direito de construir mais que o permitido inicialmente, dentro dos limites constantes em lei.

Setor Bueno é o 2º que mais recebeu imóveis 

Desde o Plano Diretor de Goiânia aprovado em 2007, muitas quadras da região do alto do Setor Bueno, como é conhecida a área entre a Avenida T-9 e o Setor Serrinha, estão classificadas como áreas de desaceleração de crescimento. O entendimento, para os planejadores da Prefeitura, é que são locais aptos para receber grandes empreendimentos, mas que eles não devem ser incentivados. Nesses lotes, os empreendedores devem pagar uma taxa maior para o Paço Municipal para conseguir atingir o máximo potencial construtivo. Com a atualização do Plano em 2022, mais quadras do Bueno foram classificadas nesta categoria de desaceleração.

Assim mesmo, de acordo com os dados do Cadastro Imobiliário da Secretaria Municipal de Finanças (Sefin), do último ano, o Setor Bueno segue entre os bairros que mais recebem novos imóveis. Ele foi o segundo que mais cresceu em número de imóveis residenciais, atrás apenas do Setor Marista, e recebeu 146 novas moradias. O mesmo ocorre com relação aos imóveis comerciais, pois o bairro recebeu mais 313 imóveis nesta categoria entre o cadastro de 2022 e o deste ano, enquanto o Marista teve um acréscimo de 361. 

Para a vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Janaína de Holanda, os números mostram que a política de desaceleração adotada pela Prefeitura, no Plano Diretor, não está sendo suficiente. “Ela é apenas uma taxação, só faz pagar mais caro, e mostra que não resolve. No Bueno, temos cada vez menos terrenos propícios à incorporação, então não é o instrumento que tem produzido um crescimento menor que o do Marista e sim a oferta de terrenos que é menor”, garante.

Já para o superintendente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário em Goiás (Ademi-GO), Felipe Mellazo, o fato do Bueno ter recebido 146 novos imóveis mostra que a desaceleração funcionou com relação à verticalização do bairro, mas que isso não foi visto com as construções de uso misto, ou seja, com a presença de imóveis comerciais. “É natural que queiram fazer comércios onde tem mais moradores, é uma garantia”, diz. 

Mellazo complementa que com relação ao Jardim Goiás, que teve uma redução de imóveis residenciais e alta no número de lotes sem edificações e nos imóveis comerciais, isso ocorre pela redução nas áreas nobres do bairro. Janaína entende que uma situação está totalmente relacionada com a outra, pois a política de desaceleração não diferencia os imóveis comerciais dos residenciais, tendo relação apenas com a área construída e unidades vendidas. 

Dados do cadastro deveriam ser usados no planejamento urbano

Os dados do Cadastro Imobiliário da Secretaria Municipal de Finanças (Sefin) são desvinculados do planejamento urbano, de responsabilidade da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Habitação (Seplanh). Há até mesmo contestação entre os técnicos da pasta sobre a integridade das informações com relação à real situação da cidade, visto que muitos moradores não realizam a atualização do cadastro com a mudança do uso do imóvel, mesmo com a construção em um lote antes baldio, visando ter uma cobrança mais baixa no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Para a arquiteta e urbanista Janaína de Holanda, o cadastro imobiliário deveria “ser uma das mais importantes fontes de informações para o planejamento urbano”. “Mas há reclamação de que não é atualizado, que não condiz com a realidade, mas deveria servir para isso. É uma ferramenta para isso. É um sinal de que a Prefeitura aprova as leis, mas monitora muito pouco, não pode ter essa dificuldade”, diz.

Neste caso, sem o uso do cadastro, não há o acompanhamento periódico de quantos imóveis há no município, sejam residenciais, comerciais ou lotes sem edificações, dados que só existem oficialmente no cadastro da Sefin.

“A Prefeitura deveria melhorar o diálogo entre as secretarias, que seja focado em melhorar a cidade e o planejamento urbano. É possível fazer isso e manter o cadastro mais atualizado e usar essas informações”, acredita. O superintendente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário em Goiás (Ademi-GO), Felipe Mellazo, afirma que o cadastro também não é um instrumento utilizado pelo mercado imobiliário, que realiza a própria pesquisa sobre a tendência de crescimento da cidade. Segundo ele, isso ocorre porque os dados do cadastro refletem um tempo passado, enquanto que a intenção do mercado é verificar as unidades construídas e vendidas, ou seja, com dados do próprio mercado. A reportagem tentou contado com a Seplanh sobre o uso do cadastro imobiliário enquanto política de planejamento urbano e sobre a situação atual dos bairros, com a confirmação do crescimento urbano no Setor Marista, mas não recebeu qualquer resposta até o fechamento desta reportagem.

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