Comissão criada pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) para apurar a conduta de um professor do curso de Química acusado de assedio sexual contra uma estudante de 24 anos encontrou o que chamou de “fortes indícios” contra o servidor. A informação consta em sindicância preliminar que levou à abertura de um procedimento administrativo disciplinar (PAD) e ao afastamento de Antônio Carlos Severo Menezes, de 59 anos, por 180 dias a contar de 4 de agosto deste ano.
A denúncia foi formalizada pela estudante em junho e envolve fatos que teriam ocorrido no câmpus de Anápolis, entre março e maio deste ano, quando ela passou a fazer aulas extracurriculares no laboratório de Química tendo Antônio Carlos como seu orientador. Nas semanas seguintes o caso ganhou repercussão na imprensa após um grupo formado por ex-alunas e uma docente se mobilizar para apresentar novas denúncias de assédio contra o professor e pedir seu afastamento.
A reportagem teve acesso a documentos do PAD que foram incluídos pela defesa do professor em um processo no qual tentou na Justiça remarcar um depoimento dado à comissão em setembro e aumentar o número de testemunhas de defesa. Após uma negativa inicial por parte do Judiciário, a defesa desistiu do processo judicial antes da análise do mérito. Já a tramitação do procedimento na UEG é sigiloso.
Entre os documentos, consta a portaria 891/2023, de 3 de agosto, que institui o PAD após afirma que os autos do procedimento investigativo preliminar apontam entre os atos praticados pelo acusado: “as ações de passar a mão em seu cabelo, fazer elogios tendenciosos e constrangedores, tentar passar a mão no corpo da vítima, de forma maliciosa e sem sua autorização”.
Também é dito neste mesmo documento que ele tentava “abraçá-la valendo-se da desculpa de que assim o pretendia fazer para acalmá-la, por saber que a discente possui diagnóstico de ansiedade generalizada e, nessa condição, encontrava-se fragilizada emocionalmente” e a abordava “em diversas ocasiões com perguntas e conversas impróprias sobre sexo”. Consta que antes do PAD a estudante teria sido ouvida pelo menos três vezes pela comissão de sindicância.
A comissão ainda afirma, no documento que abre o PAD, que o professor aproveitou de sua condição de orientador “autoridade intelectual naquele ambiente acadêmico” e “servidor com grande influência no Câmpus, conforme ele próprio se autodenominava”, e da situação de vulnerabilidade socioeconômica da discente, para constrangê-la “com atitudes típicas de assédio sexual e moral”.
Além disso, ao notar alguma forma de interrupção das investidas, segundo o documento, o investigado ameaçava retirar a bolsa permanência da estudante “por meio de simples envio de e-mail à secretaria do câmpus”.
“Proporção gigante”
No dia seguinte à publicação do documento, a reitoria expediu outra portaria, a 892/2023, determinando o afastamento do professor de suas funções, afirmando que as “irregularidades atribuídas ao referido docente” causaram repercussão negativa “de proporção gigantesca” no ambiente acadêmico e que isso compromete a continuidade da atividade de ensino no câmpus em que o servidor é lotado.
A reitoria aponta que a divulgação do caso pela imprensa levou a denúncia a “grandes proporções”, levando a UEG a experimentar “clima de tensão entre o acusado e alunos inconformados com as notícias veiculadas pela imprensa, reveladoras de outras denúncias contra o mesmo docente” e que há “clamor social pelo afastamento do mencionado docente”.
Ainda neste despacho, a reitoria justifica o afastamento sob o argumento de “ser óbvio” o fato de que a situação do câmpus poderá ficar insustentável. “O cenário ora posto tem afetado sobremaneira o ambiente institucional, comprometendo seriamente as relações sociais, acadêmicas e profissionais no âmbito do câmpus, visto que existe uma real preocupação por parte de discentes, técnicos e professores, que se encontram temerários com relação ao comportamento do investigado, haja vista que este apresenta tom de ameaça, o que pode comprometer a entrega qualitativa da prestação educacional por parte da universidade.”
Por meio de nota, a UEG afirmou que o PAD corre em sigilo e que tem previsão de durar o mesmo tempo de afastamento do professor, isto é, seis meses. Durante este tempo, mesmo sem exercer suas funções, Antônio Carlos segue recebendo sua remuneração conforme determina a legislação. Ainda segundo a UEG, outros “casos de ilícitos” envolvendo o professor estão sendo averiguados.
Caso seja comprovado o assédio, a UEG informa que as punições podem variar de uma suspensão de 61 a 90 dias até a demissão, além da inabilitação para ocupar cargos públicos por um determinado período. Neste caso, o processo também é encaminhado para o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO).
A Polícia Civil também apura a denúncia feita pela estudante e ex-alunas. A UEG pode encaminhar o resultado do PAD, caso seja requisitado. A reportagem não conseguiu localizar e falar com a delegada Isabela Joy, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Anápolis, que cuida das investigações.
Após a estudante de 24 anos procurar a UEG e a Deam para denunciar o professor, um grupo de ex-alunas dos cursos de Química e Farmácia da UEG fizeram o mesmo, inclusive por meio de um abaixo-assinado. Em julho, quando a imprensa noticiou o surgimento das denúncias, havia 18 mulheres afirmando serem vítimas do docente. Todos os relatos eram semelhantes, com casos de assédio sexual e moral ocorrendo dentro de sala de aula, laboratórios de pesquisa, em corredores, e em outras áreas da universidade.
A reportagem entrou em contato com a defesa do professor pelo WhatsApp e esta informou não haver autorização do mesmo para entrevistas.