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UFG recebe equipamento avançado para tratar pulmões

Wildes Barbosa
A professora Eliana Martins, na companhia de sua aluna de doutorado Bianca Fontanezzi, com o Ignite: chegada comemorada

Professora titular da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Goiás (UFG) e há 30 anos pesquisando nanotecnologia voltada para ciências farmacêuticas, a doutora Eliana Martins Lima comemora a chegada de um novo equipamento para o laboratório que idealizou e coordena, o Centro de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação em Fármacos, Medicamentos e Cosméticos (FarmaTec). O NanoAssemblr® Ignite™, fabricado no Canadá, e por enquanto o único no Brasil, já está em uso em pesquisas prioritariamente voltadas para o tratamento de doenças crônicas pulmonares, a terceira maior causa de mortes em todo o mundo.

O Ignite, como já vem sendo chamado entre os pesquisadores, foi a tecnologia fundamental para o desenvolvimento de duas das principais vacinas contra Covid-19, a da Pfizer e da Moderna, que utilizam RNA mensageiro, a “receita genética” que leva o organismo a produzir anticorpos de defesa ao coronavírus. Eliana Martins lembra que, ao contrário do que foi amplamente discutido, as pesquisas com RNA não são recentes. Elas iniciaram há cerca de 60 anos e o que aconteceu na pandemia foi o uso da nanotecnologia, acelerando o processo de criação, em escala industrial, dos imunizantes.

Nas ciências farmacêuticas, explica Eliana Martins, a nanotecnologia significa manipular materiais de tamanho ínfimo, que só podem ser vistos com microscópios eletrônicos. Para efeito de comparação, um nanômetro é um bilhão de vezes menor do que um metro. “Nessa manipulação, permitimos novas funcionalidades. Se um fármaco com poder terapêutico for administrado no organismo, de maneira convencional, ele pode fugir do alvo e provocar efeitos adversos. Se colocado em nanopartículas, irá para o ponto central, melhorando a terapia e reduzindo a toxicidade.”

Esse princípio foi amplamente divulgado a partir de 1995 quando a Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos Estados Unidos, aprovou a primeira droga contra o câncer com base na nanotecnologia para uso clínico. Atualmente existem outras 40 com esse tipo de tecnologia. No Farmatec, instalado no Parque Tecnológico Samambaia (PTS), da UFG, o grupo de pesquisadores liderado pela professora Eliana Martins busca a nanotecnologia com a expectativa de fazer a diferença no combate às doenças do pulmão. E o equipamento recém-chegado proporciona maior segurança na reprodução das formulações.

O Ignite foi adquirido em fevereiro do ano passado, três anos após ter sido lançado pela empresa canadense Precision NanoSystems (PNI), que é líder global em pesquisa, desenvolvimento e fabricação de terapias celulares e genéticas baseadas em nanomedicina. Única representante de Goiás no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Nanotecnologia Farmacêutica, vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), ela conseguiu comprar o equipamento de US$ 130 mil, com recursos gerenciados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

A canadense PNI, que nasceu como start up em ambiente universitário, criou o Ignite a partir das pesquisas com RNA mensageiro. “O RNA mensageiro é uma molécula extremamente sensível, que pode ser destruída com facilidade. Se a injetarmos no músculo de uma pessoa pode não ter efeito nenhum porque será destruída por enzimas que existem em nossos tecidos, nossos fluidos”, explica a pesquisadora. A nanotecnologia protege essa molécula usando os lipídios, compatíveis, do ponto biológico, àqueles que se formam em nossas membranas celulares, segundo Eliana Martins.

Em média, entre a descoberta e a comercialização de um novo medicamento, são necessários cerca de 12 anos. E uma das grandes dificuldades enfrentadas pela indústria é desenvolver volumes significativos de formulações. A nanotecnologia tem revolucionado esse cenário. O novo equipamento da Farmatec, que é direcionado para laboratórios de pesquisas, é capaz de processar uma única formulação de microfluídica por vez, produzindo até 20 mililitros (ml) de nanopartículas em menos de dois minutos.

“Produtos com aplicação farmacêutica, como uma vacina ou medicamento, precisam ter uma mesma identidade”, lembra Eliana Martins, ressaltando que o Ignite, que realiza o processo de microfluídica sob pressão, assegura produtos sempre uniformes e homogêneos. O equipamento, embora instalado na UFG, poderá ser utilizado por todos os 30 pesquisadores do (INCT) de Nanotecnologia Farmacêutica, de vários estados brasileiros.

Doenças que afetam pulmões são o foco dos pesquisadores 

“Hoje temos o melhor laboratório de desenvolvimento de nanotecnologia aplicada a medicamentos do país e é um dos melhores do mundo”, diz com orgulho a pesquisadora. O grupo liderado por Eliana Martins tem se dedicado ao desenvolvimento de medicamentos usando nanotecnologia para administração inalatória, para tratar doenças infecciosas e processos inflamatórios pulmonares. “Nosso foco é o tratamento localizado não apenas do processo inflamatório, mas também na sua origem, para que o paciente não precise mais fazer uso de medicamentos sistêmicos, via oral.”      

Estão na mira patologias como câncer pulmonar, doença pulmonar obstrutiva crônica, bronquite, asma, enfisema, fibrose cística, pneumonia, tuberculose, sequelas da Covid e várias outras de origem viral e bacteriana. “Precisamos encontrar formas de reverter processos degenerativos e inflamatórios. No início da pandemia da Covid-19, muitas pessoas vieram a óbito em razão do processo inflamatório. Toda inflamação aumenta a quantidade de líquido na região atingida e, nos pulmões, quando tem acúmulo de líquido, impede as trocas gasosas. É como se a pessoa morresse afogada.” 

Eliana Martins, que já foi pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação da UFG, lembra que o Farmatec tem mais de 200 publicações científicas. “Estamos rompendo a barreira do conhecimento e formando pessoas. Nosso desafio é fazer com que o quimioterápico chegue na região profunda dos pulmões. Doenças pulmonares crônicas estão entre as três principais causas de morte no mundo e muitas delas não têm um tratamento que induz a cura.” 

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