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Veículos abandonados, desafio para gestão das cidades

Diomício Gomes
Veículo Monza sem condição de uso na Av. Antônio M. Borges, no Setor Pedro Ludovico

ELDER DIAS

Veículos abandonados ocupando vias públicas – ruas, praças, calçadas – representam, de alguma forma, o resultado do modo de vida de uma sociedade. Nessa situação, há de carros que poderiam ser usados por mais algum tempo até esqueletos pelos quais nem dá para saber suas marcas e seus modelos. Mais do que um sinal de como anda a economia – quem sabe, muito boa ao ponto de se descartar automóveis para comprar um novo ou tão ruim que é menor prejuízo deixá-los ao léu do que pagar taxas e impostos –, eles se tornam um imbróglio para várias outras áreas da gestão: saúde pública, meio ambiente, mobilidade e segurança pública.

No fim de outubro do ano passado, a poucos metros de uma delegacia em Aparecida de Goiânia, no Jardim Tiradentes, dois homens foram encontrados mortos dentro de um carro sem condições de uso que estava sobre a calçada, depois de ter sido apreendido pela polícia. Eram pessoas em situação de rua que usavam o veículo para dormir.

Poucos meses depois, em janeiro, era lançada uma campanha idealizada pelo Departamento Estadual de Trânsito de Goiás (Detran-GO), sob a gestão do delegado e ex-deputado Waldir Soares. Chamada de Patrulha Detran, a ação removeu, em seu primeiro mês, 129 sucatas e veículos deteriorados ou acidentados em situação de abandono pelas vias públicas da capital e de cidades do interior de Goiás.

“Claro que, para a criação (da Patrulha Detran) nos preocupou esse caso ocorrido praticamente na porta da delegacia de Aparecida, mas recolher esses veículos também é questão de saúde pública, já que eles são locais de acúmulo de água no período chuvoso, tornando-se criadouros e potencializando o risco de várias doenças, como a dengue, e também de infestação por insetos e ratos”, diz Waldir Soares.

O presidente do Detran lembra também de questões relativas à mobilidade e ao meio ambiente. “Esses veículos geralmente ficam em locais em que atrapalham o trânsito de condutores, ciclistas e pedestres. Além disso, acumulam sujeira e muitos deles despejam resíduos no solo”, explica, acrescentando que o órgão que dirige acabou por assumir a “paternidade” de uma função que, em sua visão, seria das administrações municipais.

Na questão ambiental, há também o incômodo da poluição visual que é causada pela presença desses veículos abandonados. Mas, de fato, o número deles em Goiânia diminuiu bastante em relação ao que existia até o fim de 2023 – antes do início da campanha – conforme verificou a reportagem do POPULAR nesta semana. Entretanto, ainda foi possível flagrar unidades em visível situação de deterioração em vários pontos da cidade, como nos bairros Pedro Ludovico, Jardim Europa e Santa Rita – onde, em uma via, está a carcaça da carroceria de um grande caminhão.

Destinação

O desafio do poder público, porém, é mais amplo do que apenas retirar o problema do alcance dos olhos da população. Em um País que optou por ter rodovias como seu principal modal e cujas cidades de médio e grande porte ainda dá prioridade aos veículos automotores em seu planejamento urbano, não se sabe, em dados oficiais, quanto se produz de sucata automotiva por ano. Há uma estimativa, das entidades do setor, de que a indústria automotiva no Brasil trabalhe com algo em torno de 1,5 milhão de toneladas de sucata por ano – tanto de veículos ao fim da vida útil como aqueles que são abandonados e desmontados para reciclagem.

No Detran, todos os veículos do pátio não requisitados pelos proprietários acabam indo a leilão, ou como recuperáveis ou como sucatas. “No caso dos recolhidos pela Patrulha Detran, mais de 90% são leiloados como sucata”, informa Waldir Soares. Os veículos com chassis baixados são, nesse caso, desmontados pelos compradores, geralmente donos de lojas de autopeças e oficinas mecânicas, e o que resta depois de todo o processo acaba – ou deveria acabar – como potencial matéria-prima. “O Detran oferece o serviço de busca desse material nesses locais”, diz Waldir. No final do ciclo, o que sobra pode ser destinado a siderúrgicas, por exemplo, para servir ao recomeço de toda a cadeia de produção.

A questão é que o Brasil é um dos países com menor índice de fechamento total desse ciclo. Os últimos dados conhecidos, de 2019, estimavam que apenas 1,5% da frota brasileira passava pelo processo de reciclagem. Isso é irrisório ao que ocorre em países como Japão, Estados Unidos e Europa, onde até 95% dos veículos fora de circulação são reciclados.

A ideia do presidente do Detran é agilizar o processo de recolhimento das carcaças espalhadas pelas cidades e, ao mesmo tempo, facilitar o trabalho de reciclagem. Para tanto, já está previsto, provavelmente para novembro, a licitação para a locação de uma prensa para ajudar a logística com veículos, sucatas e peças que forem alvos do projeto Patrulha Detran. No momento, segundo o órgão, a fase é de levantamento das máquinas que podem se adequar melhor ao trabalho.

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