Meu Bichinho

Hábitat reduzido multiplica aparição de onças em Goiás

Diomício Gomes
Onça Apoena, no Instituto Nex, unidade de conservação do felino localizada na zona rural de Corumbá de Goiás, a 110 km de Goiânia

Símbolo da biodiversidade brasileira, a onça pintada tem sido a estrela de diversos vídeos que circulam pela internet. Recentemente, o biológico goiano Leandro Silveira viralizou depois de postar imagens passeando com três felinos na zona rural de Mineiros, no Sudoeste de Goiás. “Toda minha vida é dedicada à pesquisa e conservação da espécie, que está constantemente ameaçada. Ainda há muito o que mudar para combater a matança”, destaca o profissional.

Goiás é um dos estados brasileiros que mais possuem onças nas áreas de preservação ambiental do Cerrado e nos chamados “corredores ecológicos”, como o Rio Araguaia. A constante presença dos animais em vídeos que são publicados na internet se justifica, primeiro, pelo fácil acesso aos equipamentos digitais e à internet e, segundo Silveira, por conta da diminuição da caça e aumento da conscientização, pesquisa e monitoramento dos animais.

“Quando esses animais começam a aparecer é porque, de certa forma, podemos dizer que as populações estão se recuperando, estão reproduzindo, mas não estão tendo um lugar para poder ficar. Isso acaba fazendo com que apareça mais onças nas cidades”, explica o biólogo, fundador do Instituto Onça Pintada, que atua no trabalho de conservação da espécie em Mineiros, próximo ao Parque Nacional das Emas. Atualmente, o goiano está no Amapá em projeto de mapeamento na Estação Ecológica de Maracá-Jipioca.

Com o aumento da população de onças, e, ao mesmo tempo em que os índices de desmatamento do Cerrado crescem mês a mês, muitos animais migram para as zonas urbanas. “O lugar que as onças estão reproduzindo hoje já existe há muito tempo. Só que o bicho que nasceu ali vai procurar uma nova área, mas no meio do caminho tem uma cidade, uma vila, agricultura, pecuária. Não é que ela está perdendo hábitat, ela já perdeu. Agora, quando a população começa a aumentar, ela não tem para onde ir”, reflete o pesquisador.

Algumas ações colaboram para o monitoramento e pesquisa dos felinos nas áreas ambientais de Goiás. Na região da Serra dos Pireneus, que abarca os municípios de Pirenópolis, Corumbá, Cocalzinho e Vila Propício, o médico e entusiasta da conscientização ambiental Leandro Carvalho Vitorino desenvolveu um projeto de armadilhas fotográficas para monitorar a vida da onça pintada e colher informações para instituições de pesquisa e defesa.

“Nossa intenção é entender o tamanho do território de cada onça, a frequência que se reproduzem e o tempo que o animal leva para tomar outro espaço da natureza”, reitera Carvalho. Desde 2017 que o goiano começou a fazer o projeto, um dos pioneiros do Brasil na instalação e customização de estúdios de selva. “Em julho, eu e meu colega Lucas Gaehwiler vamos pegar algumas imagens para fazer uma exposição em Pirenópolis com o intuito de promover formas de conscientização. Também estamos finalizando um documentário sobre as onças pintadas na Serra dos Pireneus”, destaca.

Divulgação

As constantes aparições de onças em vídeos que viralizam na internet e o aumento das populações dos felinos se devem ao fato de que as pesquisas, trabalhos e projetos ambientais estão sendo mais divulgados e mostrados às pessoas. É essa a explicação de Cristina Gianni, presidente do Instituto Nex, que atua na conservação da espécie na zona rural de Corumbá de Goiás, a 113 km de Goiânia.

“Você não protege aquilo que não conhece. Abrimos o instituto há 23 anos e ninguém postava nada de onça, ninguém trabalhava com onça como a gente começou a trabalhar. Então nós divulgamos muito, sempre abrimos para a imprensa e ao público”, reflete Cristina. Para a pesquisadora, ao mesmo tempo em que cresce a consciência, aumenta também a perda de hábitat. “Como as onças vão conseguir sobreviver? Elas se aproximam das zonas urbanas em busca de outros animais e do lixo”, completa.

Uma das estrelas entre as onças que os profissionais do Instituto Nex cuidam é a Matí, que serviu de modelo para as imagens da novela Pantanal (TV Globo), exibida em 2023. “Nós recebemos onças em condição de risco, que não têm como voltar para a natureza. Atualmente há 24 animais sob nossos cuidados e que, por meio deles, podemos entender sobre esse animal símbolo da diversidade ambiental”, diz Cristina.

Caça

A onça é um animal topo da cadeia alimentar e serve de termômetro para os pesquisadores na hora de realizar um diagnóstico de como aquele determinado hábitat está em relação à preservação de todas as outras espécies. A professora da Universidade Federal de Goiás (UFG) Luciana Batalha de Miranda Araújo, doutora em Animais Silvestres, explica que, quando existe um desequilíbrio no bioma, surge uma reação em cadeia que vai da zona rural às cidades, mudando as formas da natureza.

“Infelizmente, a gente ainda continua tendo bastante interação negativa entre a população e as onças. Ainda tem bastante caça no Centro-Oeste, uma região onde a prática começou como subsistência há vários anos, mas, mesmo com a modernização e tecnificação da produção de alimentos, ainda é tradicional”, lamenta a pesquisadora da Escola de Veterinária e Zootecnia da UFG.

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